Para onde vão as doações bilionárias de Musk? Para beneficiar seus próprios negócios

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""Estou doando US$ 20 milhões para escolas do condado de Cameron e US$ 10 milhões para a cidade de Brownsville para revitalização do centro da cidade", disse Musk no Twitter.

Musk, a segunda pessoa mais rica do mundo, segundo a Forbes, preside a SpaceX, a Tesla e outras empresas que estão buscando os novos limites da tecnologia, ao mesmo tempo que controla a rede social X (o antigo Twitter), em que promove suas visões políticas e sociais muitas vezes polarizadoras.

Ao mesmo tempo, ele dirige uma instituição de caridade com bilhões de dólares, recursos que poderiam causar um impacto global. Mas, ao contrário de Bill Gates, que empregou a sua fortuna num esforço para melhorar as condições de saúde na África, ou da família Walton, do Walmart, que estimulou mudanças no sistema educativo americano, a filantropia de Musk tem sido aleatória e em grande parte egoísta — tornando-o elegível para enormes incentivos fiscais e ajudando seus próprios negócios.

Desde 2020, ele vem construindo sua instituição de caridade com doações de ações dedutíveis de impostos no valor de mais de US$ 7 bilhões, tornando-a uma das maiores do país.

A fundação não conseguiu, nos últimos anos, entretanto, doar o mínimo exigido pela lei para justificar a redução fiscal, expondo-a ao risco de ter de pagar ao governo uma quantia substancial.

Musk não contratou qualquer funcionário para sua fundação, mostram as declarações fiscais. Seus bilhões são administrados por um conselho composto por ele e dois voluntários, um dos quais relata dedicar pouco tempo à fundação — cerca de seis minutos por semana, em média.

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Em 2022, o último ano para o qual existem registos disponíveis, foram doados US$ 160 milhões, o que representa menos US$ 234 milhões do que a lei exigia – o quarto maior déficit de qualquer fundação no país.

Musk não tem obrigação de ter uma instituição de caridade e deixou claro que acredita que as suas empresas com fins lucrativos mudarão o mundo para melhor, muito mais do que qualquer empreendimento filantrópico poderia fazê-lo.

Mas depois de criar uma organização sem fins lucrativos e de fazer doações dedutíveis de impostos, foi obrigado por lei a garantir que a sua fundação servisse o público e não operasse em "benefício privado" do seu líder.

Uma análise do New York Times descobriu que, das doações da Fundação Musk em 2021 e 2022 – os últimos anos para os quais existem dados completos disponíveis – cerca de metade tinha alguma ligação com Musk, um dos seus funcionários ou uma das suas empresas.

Entre as doações feitas pela Fundação Musk, havia US$ 55 milhões para ajudar um grande cliente da SpaceX a cumprir uma promessa de caridade. Houve os milhões que foram para o condado de Cameron, no Texas, depois que o foguete explodiu.

E houve doações para duas escolas intimamente ligadas aos seus negócios: uma isolada dentro de um complexo da SpaceX, a outra localizada ao lado de uma nova subdivisão para os funcionários de Musk.

— O que é realmente impressionante em Musk é a disjunção entre a sua personalidade pública descomunal e a sua presença filantrópica mínima — disse Benjamin Soskis, que estuda filantropia no Urban Institute.

Enquanto outros bilionários almejaram um amplo impacto na sociedade, Soskis disse que a fundação de Musk carece de "qualquer direção ou foco real, fora de seus empreendimentos comerciais".

Musk não respondeu aos pedidos de comentários.

Musk e seu irmão mais novo, Kimbal, fundaram a Musk Foundation em 2001. O site da Fundação Musk incluía inicialmente animações engenhosas, com imagens de antenas parabólicas e crianças em salas de aula, ao mesmo tempo que incentivava as pessoas a se candidatar a bolsas.

Em 2005, no entanto, tudo isso foi apagado e substituído por um texto simples em preto afirmando que a fundação estava interessada em "educação científica, saúde pediátrica e energia limpa".

Não havia nenhuma informação de contato — e ainda não há.

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Em setembro de 2014, a revista Forbes estimou que o patrimônio líquido de Musk era superior a US$ 10 biilhões, impulsionado pelo valor das suas participações em ações da Tesla. Mas ele deu pouco para sua própria instituição de caridade. Naquele ano, mostram as declarações fiscais, sua fundação tinha US$ 40.121 no banco.

Isso combina com a posição pública de Musk sobre a filantropia. Suas empresas com fins lucrativos, disse ele, eram sua maneira de mudar o mundo.

"A Tesla fez mais para ajudar o meio ambiente do que todas as outras empresas juntas, disse Musk no ano passado na conferência DealBook do The New York Times. "Como líder da empresa, fiz mais pelo meio ambiente do que qualquer ser humano no planeta."

Musk, em vez disso, usou sua pequena fundação para ajudar grupos ligados a ele pessoalmente, incluindo uma instituição de caridade alimentar dirigida por seu irmão e um "Templo da Totalidade" que foi incendiado no festival Burning Man de 2013, um evento anual do qual ele participa com frequência. .

Ele também fundou sua própria escola sem fins lucrativos chamada Ad Astra – palavra em latim para "para as estrelas" – para explorar novas maneiras de ensinar matemática e ciências.

Mas essa escola também serviria a um propósito pessoal para Musk. Em seu primeiro ano de operação fora de sua casa no bairro de Bel-Air, em Los Angeles, cinco dos 14 alunos do Ad Astra eram seus próprios filhos.

"Bondade e vontade de aprender (e pais que trabalharam na SpaceX) foram os únicos critérios de admissão", escreveu Joshua Dahn, o primeiro diretor da escola.

Mais tarde, a Ad Astra mudou-se para a sede da SpaceX em Hawthorne, Califórnia, e cresceu para mais de 50 alunos.

Cerca de metade eram parentes de funcionários da SpaceX, disse Dahn por e-mail. O contrato de Dahn dizia até que a propriedade intelectual que ele desenvolveu na escola seria parcialmente propriedade pessoal de Musk, de acordo com uma cópia obtida pelo Times.

Dois ex-executivos da SpaceX, que falaram sob condição de anonimato por medo de represálias, lembraram que o Ad Astra às vezes era discutido como um privilégio para os filhos dos executivos, embora fosse entendido como quase impossível para os filhos de pessoas "das bases".

A Fundação Musk doou US$ 10 milhões para a OpenAI – o inovador desenvolvedor de inteligência artificial, onde ele fez parte do conselho de administração. A OpenAI era uma organização sem fins lucrativos na época da doação, embora já tenha criado várias empresas com fins lucrativos.

Musk disse em um processo recente contra a organização e seus fundadores que ele pessoalmente doou US$ 34 milhões adicionais antes de interromper suas doações em 2020. Musk disse anteriormente que havia doado cerca de US$ 100 milhões para a OpenAI.

Mas as doações de Musk muitas vezes pareciam guiadas pelo Twitter, onde ele fazia promessas espalhafatosas em resposta aos desafios de celebridades da Internet: ele doou US$ 1 milhão para plantar árvores após solicitação do YouTuber Mr. Beast e US$ 1 milhão para ajudar pequenas empresas durante a pandemia de COVID-19 após um empurrão de Dave Portnoy, o fundador da Barstool Sports.

A fundação também não contratou pessoal remunerado para atingir um novo padrão de tamanho. A única mudança registrada foi pequena: Matilda Simon, uma das funcionárias do family office de Musk, que também atua como um dos três membros voluntários do conselho da fundação, aumentou sua carga de trabalho de 0 hora para 0,1 hora, ou seis minutos por semana, segundo às declarações fiscais.

Os outros dois voluntários da fundação – Musk e Jared Birchall, que, como chefe do family office de Musk, ajuda a administrar sua riqueza – relataram que cada um trabalhava uma hora por semana. Simon e Birchall não responderam a um pedido de comentário.

Em 2021, a Fundação Musk ficou US$ 41 milhões abaixo da doação mínima exigida, mostram as declarações fiscais.

"Ainda não é uma organização profissional", disse Brian Galle, professor que estuda direito sem fins lucrativos na Universidade de Georgetown, referindo-se às doações mínimas da fundação.

A Fundação Musk não divulgou detalhes sobre o que doou em 2023 ou se compensou o déficit do ano anterior.

A partir do final de 2020, Musk começou a transferir suas operações comerciais da Califórnia para o Texas, e suas instituições de caridade o seguiram.

A Escola Ad Astra mudou-se para um local próximo ao local de lançamento da empresa, no sul do Texas. A princípio, parecia aberta ao público, segundo versão arquivada de seu site do ano passado.

Mas esse site desapareceu. E o campus Ad Astra foi colocado atrás dos portões de segurança de um complexo de propriedade da SpaceX. No campus hoje não há sinal de escola, apenas um segurança em uma caminhonete e placas que dizem "Propriedade Privada. Não ultrapasse."

Musk também doou US$ 100 milhões de sua fundação para uma instituição de caridade iniciante no Texas chamada The Foundation, que afirma querer abrir escolas e, eventualmente, uma universidade.

A doação retirou dinheiro da Fundação Musk, ajudando-a a chegar mais perto de atingir a doação mínima de 5%. Mas não tirou o dinheiro da órbita de Musk: a nova instituição de caridade é gerida por Birchall, o chefe do seu escritório familiar, e dois líderes da empresa de contabilidade de Musk.

Os registros de terras mostram que a nova instituição de caridade usou uma empresa de fachada para comprar um terreno perto de Bastrop, Texas. O terreno fica a dois minutos de um loteamento de 110 casas que uma das empresas de Musk, uma startup de construção de túneis chamada The Boring Co., está construindo para seus próprios trabalhadores.

Anúncios de emprego online indicam que eles estão planejando abrir uma nova escola Ad Astra neste verão. Os líderes da nova instituição de caridade recusaram-se a responder às perguntas do Times.

No sul do Texas, Musk também usou sua fundação para reconstruir a reputação da SpaceX após a explosão do foguete em 2021.

Poucos dias antes da explosão, Musk tinha ido ao gabinete do principal funcionário eleito no condado de Cameron, Eddie Treviño Jr., um democrata, para reclamar. Musk sentiu que o condado, sede do complexo de lançamento Boca Chica da Space-X, estava demorando muito para aprovar licenças e outros pedidos.

Treviño contou que respondeu que a SpaceX precisava fazer mais para ajudar a comunidade empobrecida.

“Eu não disse especificamente ‘Dê-nos X’”, referindo-se a uma quantia específica de dinheiro, disse Treviño. “Mas eu disse: ‘Ajude-me a criar esta comunidade’”.

Mas depois da explosão, as doações solicitadas por Treviño começaram a fluir. Mas o dinheiro não veio da SpaceX. Em vez disso, veio da Fundação Musk.

A fundação pagou pelo menos US$ 18 milhões às escolas locais, que usaram para comprar tudo, desde laptops para salas de aula a planetários pop-up e ferramentas para ensinar soldagem a adultos.

"Alguns desses alunos adultos estão agora trabalhando na SpaceX", disse Nereida Nellie Cantu, a principal autoridade do distrito escolar de Brownsville.

Sem qualquer pessoal para lidar com as doações do sul do Texas, Musk nomeou Igor Kurganov – um amigo e ex-jogador profissional de pôquer que nunca foi listado como funcionário da fundação – como contato. Kurganov, que deixou a Fundação Musk em 2022, não respondeu aos pedidos de comentários.