Economia
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Por Cássia Almeida — Rio


Por que a reforma tributária é tão importante? — Foto: Criação O GLOBO
Por que a reforma tributária é tão importante? — Foto: Criação O GLOBO

O Brasil precisa aumentar a receita com impostos, que vem caindo em relação ao PIB, se pretende ter saldo positivo nas contas do governo e diminuir a dívida pública. E as mudanças na tributação devem ser feitas para corrigir distorções e cobrar mais de quem ganha mais, defendeu Fabio Giambiagi, na sua oitava coluna sobre os temas que devem ser tratados a partir de 2023.

Há dois projetos de reforma amadurecidos no Congresso e mais as propostas do atual governo para o Imposto de Renda que estão parados no Congresso. Giambiagi lista como necessário atacar a pejotização, subir a alíquota do Imposto de Renda, fechar brechas sobre dinheiro no exterior e reduzir isenções.

Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal, Clair Hickmann, diretora do Instituto de Justiça Fiscal, e Rodrigo Orair, ex-diretor do Instituto Fiscal Independente, apresentam suas visões.

Bernard Appy: É possível fazer sem aumentar carga

Bernardo Appy é economista e diretor do Centro de Cidadania Fiscal. Foi secretário de Política Econômica — Foto: Criação O GLOBO
Bernardo Appy é economista e diretor do Centro de Cidadania Fiscal. Foi secretário de Política Econômica — Foto: Criação O GLOBO

A questão da reforma tributária tem duas dimensões. Um dos objetivos é corrigir as distorções que prejudicam a economia. Nesse caso, a mais importante é a de consumo de bens e serviços. Há duas PECs (proposta de emenda constitucional): a 110, no Senado, e a 45, na Câmara. É uma agenda fundamental para aumentar o potencial de crescimento no horizonte de dez a 20 anos.

No Brasil, a complexidade e fragmentação do sistema tributário do consumo de bens e serviços (PIS-Cofins, IPI, ICMS e ISS) tem efeito negativo sobre o potencial de crescimento. São regras extremamente complexas, com uma quantidade imensa de isenções e alíquotas. Pela própria complexidade, aumenta o custo para as empresas e gera contencioso.

Estudo do economista Bráulio Borges mostra que uma reforma aumentaria em 20% o nosso PIB em 15 anos.

A outra dimensão é a da justiça social, da progressividade (quem ganha mais, paga mais) do sistema. Giambiagi tem razão. Hoje há distorções que permitem que uma parcela de alta renda seja pouco tributada, pessoas fogem para aplicações, fundos exclusivos ou off shore, pejotização, no qual a prestação de serviço paga menos impostos do que um empegado de uma empresa.

São problemas sérios que precisam ser corrigidos. As duas agendas são fundamentais.

Sobre aumentar a carga tributária, tenho dúvidas. Se tiver controle da expansão de gastos, mesmo que não seja teto de gastos (aumento de despesa limitado pela inflação), e a economia crescer mais depois que fizer a reforma, numa trajetória de sustentabilidade, não será necessário aumentar a carga tributária.

É possível aumentar na tributação da renda, em 0,5% e 1% do PIB, para reduzir em outras áreas, como a tributação da folha de pagamento sobre o primeiro salário mínimo, que terá efeito positivo sobre crescimento econômico, estimularia a formalização e beneficiaria os trabalhadores de renda mais baixa.

O que falta é empenho do governo federal para aprovar a reforma, sem o governo federal utilizando seu capital político, fica difícil aprovar.

Bernard Appy é economista e diretor do Centro de Cidadania Fiscal. Foi secretário de Política Econômica

Clair Hickmann: Tributar mais renda e menos consumo

Clair Hickmann é diretora do Instituto de Justiça Fiscal e foi auditora fiscal da Receita Federal  — Foto: Criação O GLOBO
Clair Hickmann é diretora do Instituto de Justiça Fiscal e foi auditora fiscal da Receita Federal — Foto: Criação O GLOBO

Na visão do Instituto de Justiça Fiscal, o mais importante é o compromisso com a progressividade do sistema tributário, taxando mais quem tem mais. Precisamos tributar mais renda e patrimônio e menos o consumo, que afeta mais a camada de menor renda. É fundamental combater a desigualdade e tributação é uma das formas que deve ser usada também.

Economia eficiente é a que tem menos desigualdade. Na nossa atual estrutura tributária, 45% da arrecadação tributária são provenientes de impostos sobre consumo. Nos países da OCDE, é de 33% na média. Os impostos sobre a renda representam 22% aqui e 34% na média da OCDE.

A reforma prioritária é a do Imposto de Renda Pessoa Física, depois a do patrimônio. A começar por taxar lucros e dividendos, incluindo todos os rendimentos na tabela progressiva. Não deve ter tributação exclusiva. Não faz sentido um trabalhador assalariado ter alíquota de 27,5%, 25% e a outra pessoa com renda igual a dele, mas proveniente do capital, pagar 15%.

Se acabar a isenção da distribuição de lucros e dividendos, resolvemos grande parte da pejotização, causa principal da isenção do IR na distribuição dos lucros e dividendos. Temos de criar alíquotas mais elevadas, aumentar o limite de isenção e corrigir a tabela.

Combater o planejamento tributário abusivo é outra frente, o uso de paraísos fiscais. Há muitas brechas que precisam ser fechadas. Os países da OCDE estão brigando com isso há muitos anos. A regra é que o residente brasileiro que aufere lucro no exterior precisa ser tributado aqui. O que acontece que só há cobrança quando o dinheiro é trazido para o Brasil. E eles não trazem nunca.

É necessária uma profunda avaliação das atuais renúncias fiscais, se estão cumprindo seus objetivos estabelecidos quando foram criadas. Se não, devem ser extintas. As renúncias fiscais não podem ser eternas. Este ano serão R$ 348 bilhões e o montante cresce a cada ano.

Em 2020, eram R$ 312,36 bilhões. As isenções não são ruins por princípio, é um instrumento poderoso, mas precisa ser transparente e não pode se perpetuar. Defendo que a cada dois anos, essa renúncia seja reavaliada.

Clair Hickmann é diretora do Instituto de Justiça Fiscal e foi auditora fiscal da Receita Federal

Rodrigo Orair: Resgatar a equidade do sistema no país

Rodrigo Orair  é economista e pesquisador licenciado do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea)   — Foto: Criação O GLOBO
Rodrigo Orair é economista e pesquisador licenciado do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) — Foto: Criação O GLOBO

Está acabando o mito que a carga tributária está sempre crescendo. Na verdade, cresceu até 2005. Teve saltos na história, como no fim dos anos 1960 e depois da Constituição, quando passou de 20% do PIB, chegando próximo de 34% em 2005. A carga está praticamente estabilizada e até caiu um pouco.

Houve uma mudança de paradigma. Por muito tempo, o pensamento dominante era que eficiência e equidade eram opostas, que o sistema tributário tinha que ser neutro, abster-se de questões distributivas. O que levou ao movimento de redução dos tributos sobre os mais ricos e do capital, dos graus de progressividade, com a concessão de deduções e benefícios.

Depois de pandemia, houve uma reflexão que esse movimento, que traria investimento e emprego e crescimento, não logrou esses objetivos. Contribuiu para aumento da desigualdade, beneficiando poucos e normalmente os mais ricos. Grandes economistas no plano internacional reviram alguns paradigmas, resgatando que equidade não é antieficiente.

Debatemos sobre reforma tributária desde a Constituinte. O IVA (Imposto de Valor Agregado que uniria todos os impostos sobre consumo) perdeu, não foi para frente. A grande reforma da tributação de bens e serviços, em 1995 e 1999, não foi para frente, assim como a de 2007. Meio que estamos paralisados nesse debate há 40 anos. E a reforma do Imposto de Renda fica em segundo plano.

Sou um grande defensor da reforma dos impostos sobre consumo. A alíquota média no Brasil vai de 20% a 27%. Nem Noruega ou Dinamarca tem isso. Só Hungria, com 25%. Nossa tributação tem diferenciação de alíquotas e benefícios que deturparam a tal ponto o sistema, que acaba penalizando os mais pobres. Em média, os 10% mais pobres pagam 27% da sua renda na forma desses impostos, e 10% mais ricos, 10% da renda. Mas o efeito distributivo da unificação das alíquotas é muito pequeno.

A tendência é resgatar equidade, principalmente depois da pandemia, para que não se puna ainda mais os mais vulneráveis, mas nos caracterizamos pela inércia, ficamos de costas para o mundo. Temos que resgatar essas dimensões.

Rodrigo Orair é economista e pesquisador licenciado do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea)

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