O governo avalia uma série de medidas para aumentar a arrecadação federal e cumprir as metas previstas no arcabouço fiscal apresentado na quinta-feira pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. A pasta prevê medidas com impacto de até 150 bilhões em 12 meses.
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Entre as ações que estão em estudo está mudar a tributação dos chamados fundos exclusivos, fechados para alta renda. Com a proposta, o imposto passaria a ser cobrado a cada seis meses e não somente no momento do resgate, como é hoje. É o chamado “come-cotas” já aplicado em outros fundos. Cálculos iniciais apontam a possibilidade de uma arrecadação anual de R$ 10 bilhões.
Essa medida já foi tentada em outras ocasiões e sempre teve resistências no Congresso. Em 2017, por exemplo, uma medida provisória chegou a ser editada para tratar do assunto, mas o texto não foi votado no Senado e perdeu validade.
Cálculo do IRPJ e da CSLL
Outra ação que está sendo planejada é mais complexa, mas tem possibilidade de arrecadar dezenas de bilhões, de acordo com integrantes da equipe econômica. A medida trata da inclusão de benefícios fiscais relacionados ao ICMS — como imunidade e redução da alíquota — da base de cálculo do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
O tema está em discussão no Judiciário, mas há a possibilidade de um assunto ser endereçado por medida provisória (MP). Com uma base maior para esses impostos, o governo acaba arrecadando mais.
Apostas on-line
Em outra frente, já antecipada por Haddad, o governo deve passar a tributar apostas on-line, com expectativa de arrecadação anual de até R$ 6 bilhões. Essas empresas passarão a ser taxadas e, além disso, haverá a cobrança de uma outorga inicial para que as empresas possam operar no Brasil.
O mundo em imagens nesta sexta-feira
O governo quer taxas as apostas esportivas on-line, principalmente sobre resultados de futebol, também chamadas de sports betting. A medida não incluiria jogos de videogame ou esportes eletrônicos, chamados de e-sports.
Também deve haver mudança de regras para aumentar a tributação de empresas exportadoras que usam mecanismos para pagar menos impostos. Esse movimento ocorre por meio do uso de offshore (empresa sediada em paraíso fiscal). Uma empresa brasileira, por exemplo, pode controlar uma offshore e exportar mercadorias para ela com preços mais baixos.
A empresa controlada, a offshore, funciona como uma espécie de distribuidora, vendendo a mercadoria para outras companhias e recebendo os lucros com isenção de imposto, pois está sediada em paraíso fiscal. No Brasil, porém, a exportadora declara prejuízo e acaba pagando menos impostos. No fim, a mercadoria acaba muitas vezes saindo direto para o consumidor final, sendo a offshore apenas um truque contábil.
Todas as medidas precisam passar pelo Congresso Nacional.
Haddad também quer reduzir parte dos benefícios tributários federais, que somam R$ 456 bilhões neste ano, de acordo com dados da Receita. Nessa conta, porém, estão uma série de benefícios populares, como o Simples Nacional e Zona Franca, além das deduções do Imposto de Renda da Pessoa Física — benefícios que não devem ser atingidos. O governo busca outros benefícios onde seria possível fazer cortes sem grandes resistências políticas.
Como mostrou O GLOBO, o novo arcabouço fiscal do país vai depender de um expressivo aumento da arrecadação para que o governo atinja suas metas. Definida por Haddad como um plano de voo, a proposta prevê redução do déficit este ano, contas no zero a zero no próximo e superávits a partir de 2025.
O modelo pressupõe que as despesas sempre crescerão acima da inflação, embora existam limites mínimos e máximos. Dessa forma, a receita do governo precisará necessariamente subir. Para isso, o governo conta com outras frentes: a reforma tributária e a apresentação na próxima semana de um pacote para arrecadar de R$ 100 bilhões a R$ 150 bilhões, até o fim do ano, de setores pouco taxados ou que não são regulados, além do crescimento da economia.
Redução do déficit
O aumento de arrecadação neste ano tem potencial de reduzir o déficit, previsto hoje em R$ 107 bilhões. A meta do governo é chegar a um déficit de 0,5% do PIB neste ano (ou algo como R$ 50 bilhões de rombo).
Ontem, ao anunciar o arcabouço fiscal, Haddad comentou questionamentos de economistas que, ao tomarem conhecimento dos primeiros detalhes, avaliaram que ela exige aumento da carga tributária. O ministro descartou a criação de tributos, como a CPMF, ou aumento de alíquotas existentes para o contribuinte. Em 2022, a carga total atingiu o equivalente a 33,71% do PIB.
Segundo Haddad, há grandes sistemas que estão à margem do Fisco, citando a taxação das big techs, em discussão em vários países, e a tributação de apostas eletrônicas. Ele também mencionou que há setores demasiadamente favorecidos por incentivos que não foram revistos ou não tiveram controle de resultados.
— Vamos fechar os ralos do patrimonialismo brasileiro e acabar com uma série de abusos que foram cometidos contra o Estado brasileiro — disse. — Se quem não paga imposto passar a pagar, todos nós vamos pagar menos juros. É isso que vai acontecer.