Economia
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Por Victoria Abel — Brasília

Três anos após início da pandemia, as mulheres ainda sentem mais o impacto no mercado de trabalho. O número de adultas fora da força de trabalho no fim de 2022 foi o dobro do de homens, cuja participação já voltou ao patamar pré-pandemia. Elas ainda estão atrás dos números anteriores a 2020 porque foram as mais atingidas pelo desemprego e têm maior dificuldade de voltar a trabalhar.

O desafio é maior para mães de crianças de até 5 anos, revela uma pesquisa da Sociedade de Economia da Família e do Gênero (Gefam), com base em dados da Pnad Contínua, do IBGE.

O estudo mostra como os efeitos econômicos da Covid-19 foram sentidos de forma desigual entre os gêneros. A pandemia interrompeu uma tendência de maior inserção feminina na vida profissional, e a recuperação foi mais rápida para os homens.

No fim de 2022, 26,1 milhões de adultas estavam excluídas do mercado, enquanto o número de homens à margem era de 12,7 milhões, menos da metade do contingente feminino.

Mulheres/Mercado de trabalho — Foto: Criação O Globo
Mulheres/Mercado de trabalho — Foto: Criação O Globo

A População Economicamente Ativa (PEA) — pessoas com ou em busca de alguma ocupação formal ou informal — de homens em 2019 era de 55,5 milhões. Com a pandemia, baixou para 51,7 milhões em 2020, uma queda de quase 7%. No ano passado, superou o patamar pré-pandemia e atingiu 55,8 milhões.

Entre as mulheres, a queda foi de 12%, de quase 45 milhões em 2019 para 39,5 milhões em 2020. O indicador ainda não voltou ao nível anterior à pandemia. Ficou em 44,6 milhões no ano passado, aponta o estudo.

A população considerada fora da força de trabalho é aquela que não está ocupada e sequer busca emprego. O principal motivo alegado por mulheres para desistirem de procurar trabalho é a carga de afazeres domésticos. Em 2022, quase 44% das que se afastaram do mercado de trabalho disseram que precisaram ficar em casa. Entre os homens, esse índice foi de apenas 10%.

O cenário é ainda pior para mães solo com filhos pequenos, muitas vezes as únicas responsáveis pela renda de subsistência de suas famílias. A participação desse grupo no mundo profissional vinha aumentando desde 2015, mas voltou a cair. Era de 62% antes da pandemia.

No segundo trimestre de 2020, no início das medidas de isolamento, apenas 53% delas conseguiam trabalhar. No fim do ano passado, esse índice ainda não havia se recuperado. Era de cerca de 60%.

Marianne Carvalho era bartender em um hotel na Praia do Forte, na Bahia, mas foi demitida logo no início da pandemia. Em agosto de 2020, mudou-se para o bairro da Vila Sônia, em São Paulo. Não conseguiu mais reingressar definitivamente no mercado de trabalho. Com um filho asmático de 6 anos para cuidar, ela conta que buscou uma vaga por quase dois anos, mas acabou desistindo no ano passado:

Mulheres/mercado de trabalho — Foto: Criação O Globo
Mulheres/mercado de trabalho — Foto: Criação O Globo

— A primeira pergunta que eles fazem quando vão te contratar é se você tem filho pequeno. A maioria das mulheres hoje não consegue voltar (a trabalhar) por causa disso, porque desclassificam a gente logo por causa das crianças.

Sobrecarga materna

Mãe solo, Marianne diz que às vezes, consegue dividir os cuidados com a criança com sua mãe, avó do menino, e faz alguns bicos. O pai do filho manda alguma ajuda. Mas ela quer voltar a ter a própria renda. A dificuldade aumentou no ano passado, quando Marianne teve um acidente vascular cerebral (AVC) e um infarto.

— Tenho cursos de confeitaria, assistente administrativo e capacitação em RH. Quero voltar a procurar trabalho depois que os médicos me liberarem — planeja.

A taxa de desemprego apurada pelo IBGE, que mede somente a população que procura trabalho mas não encontra, também foi maior entre as mulheres na pandemia e vem demorando mais para cair que a dos homens. Em 2020, o índice alcançou 19% entre elas e 13% entre eles.

A recuperação do patamar pré-pandemia para os homens ocorreu já na metade de 2021, caindo para 10%. Para as mulheres, a melhora ocorreu apenas no início de 2022, ficando em 14%.

— A sobrecarga recai sobre a mãe. As escolas ficaram muito tempo fechadas no Brasil, e as mães solo têm uma rede de apoio menor. Além disso, uma parcela grande das mulheres trabalhava com serviços, eram empregadas domésticas, cabeleireiras. São serviços que foram fechados e demoraram mais para reabrir — analisa a economista Lorena Hakak, professora da UFABC e presidente do GeFam.

A estudante Nahara Ribeiro engravidou em meio à pandemia, enquanto terminava a faculdade de enfermagem em São Paulo. Nos meses seguintes, ela não conseguiu estágio na área porque os hospitais não aceitavam gestantes para trabalhar, já que eram parte do grupo de risco. Depois de adiar os planos de carreira por 2 anos para cuidar da filha, Nahara quer agora voltar a trabalhar.

Conseguiu colocar a filha de 1 ano e 7 meses na creche e também conta com a ajuda dos pais, mas, como não conseguiu terminar a graduação, o recomeço não é fácil.

— Minha filha ficou doente, eu tive que trancar a faculdade e focar minha atenção nela. Estava uma sobrecarga muito grande dividir meu tempo entre faculdade e maternidade. Agora vou voltar para a faculdade, estou procurando estágio de novo. Tenho minha mãe e meu pai, eles conseguem ajudar. O projeto é deixá-la (a filha) na creche no período da manhã e estagiar no mesmo período, se tudo der certo — conta.

Empreendedorismo

A microempresária Amanda Ribeiro trabalhou por 20 anos com turismo, um dos setores mais atingidos pela pandemia, e acabou demitida logo no início da emergência sanitária. Sem conseguir um novo emprego, ela precisou se arriscar montando seu próprio negócio para ter alguma renda. Abriu uma loja on-line de doces e salgados.

— Foi meio no susto mesmo, porque eu não tinha opção. Comecei a divulgar para amigos e família, e o negócio foi pegando. A princípio, era para ser só um plano B, mas acabou que cresceu. Criei uma página no Instagram, e ela virou uma empresa — conta a empreendedora de Belo Horizonte.

Hoje, Amanda vende alimentos como pães e tortas também para empresas, como pequenos mercados e empórios da capital mineira. Reconhece que não ter dependentes a ajudou a encontrar uma ocupação, ainda que trabalhando para si mesma. Teve mais tempo para se dedicar ao negócio e sofreu menor pressão familiar:

— O fato de eu não ter filhos foi um facilitador sim, não precisava sustentar e cuidar de uma família.

Desafio maior

Até na hora de empreender, o desafio é maior para as mulheres. Segundo dados do Sebrae, no terceiro trimestre de 2019, havia 10 milhões de mulheres e 18,9 milhões de homens à frente de pequenos negócios. No terceiro trimestre de 2020, já sob os efeitos da pandemia, a participação delas nesse universo caiu de 34,5% para 33,6%, indicando maior resiliência dos empreendimentos masculinos.

A recuperação deles foi mais rápida: voltaram ao patamar de 18,8 milhões no segundo trimestre de 2021. As empreendedoras só alcançaram 10,1 milhões no fim do mesmo ano.

Empreendedoras faturam 16% menos que homens à frente de pequenas empresas e dedicam 17% menos horas ao negócio que eles. Em contrapartida, o tempo gasto por elas em afazeres domésticos é o dobro do dos homens. Coordenadora do Sebrae Delas, Renata Malheiros, conta que é alto o número de mulheres que tentaram empreender no pós-pandemia e não conseguiram ir adiante:

— As saídas das crises são mais lentas para as mulheres. Os trabalhos de cuidado recaem de maneira desigual sobre elas. Precisamos falar de universalização de creches e divisão de afazeres domésticos.

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