A forte seca na Argentina, que quebrou em mais da metade a safra de grãos e causou estrago na já combalida economia daquele país, teve um impacto inusitado: a soja passou a ser o primeiro produto exportado pelo Brasil para os vizinhos, deixando para trás a lista tradicional, com itens como veículos e autopeças. Com isso, os argentinos foram obrigados a queimar ainda mais as suas reservas cambiais, que passaram a ficar negativas.
De janeiro a junho deste ano, as compras de soja brasileira pela Argentina aumentaram 1.160% em relação ao primeiro semestre do ano passado. O grão passou a ter uma participação inédita de 16% do total vendido aos vizinhos, enquanto autopeças ficou com 10% e carros 9,1%.
Segundo Carlos Achetoni, presidente da Federação Agrária Argentina, a corrida à soja brasileira teve como foco atender à indústria de moagem para a produção de farelo e outros derivados. Para ele, o mais importante é garantir a entrega aos clientes internacionais.
— A soja vai para a indústria de transformação de produtos que têm muito boa inserção internacional — diz Achetoni.
Crise econômica avassala Argentina; veja imagens
![Um homem compra frutas e verduras no Mercado Central de Buenos Aires. Em meio a crise, o país criou nova cédula de 2000 pesos argentinos. — Foto: Luis ROBAYO / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/ft35TVxgUDPgVhsTMCptwEDg6HQ=/0x0:7197x4798/648x248/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/s/t/CFZoovSbWv3G2CmyzGGw/103002429-a-man-buys-fruits-and-vegetables-at-the-central-market-in-buenos-aires-on-may-12-2023-arge.jpg)
![Um homem compra frutas e verduras no Mercado Central de Buenos Aires. Em meio a crise, o país criou nova cédula de 2000 pesos argentinos. — Foto: Luis ROBAYO / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/ws_HrXBDs5IACBzzye7bDIzuRns=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/s/t/CFZoovSbWv3G2CmyzGGw/103002429-a-man-buys-fruits-and-vegetables-at-the-central-market-in-buenos-aires-on-may-12-2023-arge.jpg)
Um homem compra frutas e verduras no Mercado Central de Buenos Aires. Em meio a crise, o país criou nova cédula de 2000 pesos argentinos. — Foto: Luis ROBAYO / AFP
![Um homem procura comida dentro de uma lata de lixo onde frutas e vegetais descartados são depositados no Mercado Central de Buenos Aires. — Foto: Luis ROBAYO / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/4dmF7FOAn-uexSzHs59GqiaCoOs=/0x0:7614x5076/323x182/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/B/d/Xx2gRiSCifKkqtRY1x5Q/103008262-topshot-a-man-searches-food-inside-a-trash-can-where-discarded-fruits-and-vegetables-are.jpg)
![Um homem procura comida dentro de uma lata de lixo onde frutas e vegetais descartados são depositados no Mercado Central de Buenos Aires. — Foto: Luis ROBAYO / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/onGKfw_Ob6B9Bgcx7Yjp2cEIJXA=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/B/d/Xx2gRiSCifKkqtRY1x5Q/103008262-topshot-a-man-searches-food-inside-a-trash-can-where-discarded-fruits-and-vegetables-are.jpg)
Um homem procura comida dentro de uma lata de lixo onde frutas e vegetais descartados são depositados no Mercado Central de Buenos Aires. — Foto: Luis ROBAYO / AFP
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![Mulheres compram queijo em uma banca do Mercado Central de Buenos Aires. Argentina tem uma das maiores taxas de inflação do mundo. — Foto: Luis ROBAYO / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/e7BnCCmK3ABTXp4qsvNopzJwbHY=/0x0:6919x4613/323x182/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/E/f/FJ0jnbTNOGfBzaopjvLA/103002437-women-buy-cheese-in-a-stall-at-the-central-market-in-buenos-aires-on-may-12-2023-argentina.jpg)
![Mulheres compram queijo em uma banca do Mercado Central de Buenos Aires. Argentina tem uma das maiores taxas de inflação do mundo. — Foto: Luis ROBAYO / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/fUyHIMPeFona5huR-gBa9FfMcqI=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/E/f/FJ0jnbTNOGfBzaopjvLA/103002437-women-buy-cheese-in-a-stall-at-the-central-market-in-buenos-aires-on-may-12-2023-argentina.jpg)
Mulheres compram queijo em uma banca do Mercado Central de Buenos Aires. Argentina tem uma das maiores taxas de inflação do mundo. — Foto: Luis ROBAYO / AFP
![Uma mulher vende frutas e verduras no Mercado Central de Buenos Aires. Peso argentino sofre constante desvalorização em relação ao dólar americano. — Foto: Luis ROBAYO / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/6Zr0pfdq9GEPTIu3VUGYXqEmQkA=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/A/q/jKj6apRAC4C7eONEsFHg/103002443-a-woman-sells-vegetables-and-fruits-at-the-central-market-in-buenos-aires-on-may-12-2023-a.jpg)
Uma mulher vende frutas e verduras no Mercado Central de Buenos Aires. Peso argentino sofre constante desvalorização em relação ao dólar americano. — Foto: Luis ROBAYO / AFP
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![A típica erva-mate argentina também sofreu com a alta de preços devido a crise econômica. — Foto: Luis ROBAYO / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/xF7lerKQnEY3c0rGs-RCpMQywOY=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/a/Y/I1cvRRRHuiXEOT0rQRVQ/103003146-different-brands-of-yerba-mate-are-seen-with-signs-indicating-their-prices-in-argentine-pe.jpg)
A típica erva-mate argentina também sofreu com a alta de preços devido a crise econômica. — Foto: Luis ROBAYO / AFP
![Com a crise econômica, um quilo de queijo chega a valer mais de 2000 pesos. — Foto: Luis ROBAYO / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/4p3MjTYKDynhm0xX_6lpgrQnN5Q=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/e/C/hpuBs1TdSn1CZV1ECfyw/103003170-different-types-of-cheeses-are-seen-with-a-sign-indicating-their-price-in-argentine-pesos.jpg)
Com a crise econômica, um quilo de queijo chega a valer mais de 2000 pesos. — Foto: Luis ROBAYO / AFP
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![Vista aérea das avenidas General Paz e Perito Moreno em Buenos Aires, capital da Argentina. — Foto: Luis ROBAYO / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/YYwTqpDYpp7U2t8GbtX6mWCeewY=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/3/A/Tp8FrUR5KCTRsIb2Csdg/103002475-aerial-view-of-the-general-paz-and-perito-moreno-avenues-at-dawn-in-buenos-aires-on-may-12.jpg)
Vista aérea das avenidas General Paz e Perito Moreno em Buenos Aires, capital da Argentina. — Foto: Luis ROBAYO / AFP
A Argentina é a maior exportadora global de soja processada, terceira maior exportadora de milho e um importante fornecedor mundial de carne bovina e trigo.
Décio Teixeira, presidente da Associação dos Exportadores de Soja do Rio Grande do Sul, destaca que o setor de moagem argentino é bastante competitivo e os produtos têm maior valor agregado, o que garante uma rentabilidade maior do que com a soja.
— Os argentinos querem tocar suas indústrias. A safra deles quebrou de 50 milhões para 26 milhões de toneladas. Eles compram soja do Brasil, da Bolívia e do Paraguai — afirma Teixeira, enfatizando que os argentinos dão prioridade à indústria de transformação.
Para o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil, José Augusto de Castro, como acontece com todos os países produtores de soja, a safra é vendida antes mesmo de ser plantada e colhida. A entrega do produto é no futuro.
— Com a quebra de safra, muita gente vendeu o produto e não tem para entregar. Há contratos internacionais que precisam ser honrados — diz Castro.
Exportações para Argentina aumentam 26,3%
No primeiro semestre deste ano, o Brasil vendeu US$ 1,5 bilhão de soja para a Argentina. As vendas de todos os produtos brasileiros para o país vizinho aumentaram 26,3%, totalizando US$ 9,452 bilhões. As exportações de autopeças tiveram uma alta de 31,3%, de automóveis 15,7% e tubos de ferro e aço, mais de 1.000%. Houve queda em papel cartão (13%) e óleos combustíveis (15%).
Na avaliação do presidente da AEB, faltarão dólares na Argentina para comprar outros produtos.
— Eles estão obrigados a importar soja para cumprir compromissos internacionais de vendas futuras. Sem dúvida que vão faltar dólares para comprar outros produtos. Já deve estar faltando — afirma José Augusto de Castro.
Até o fim do mês passado, as reservas cambiais argentinas estavam negativas em quase US$ 3 bilhões. Como a Argentina precisava pagar ao Fundo Monetário Internacional (FMI) uma parcela de US$ 2,7 bilhões, as reservas do país estão no vermelho em quase US$ 6 bilhões.
Negociação com FMI
Preocupado com a falta de divisas, o governo pede ao FMI que antecipe os três desembolsos previstos até o fim do ano para uma única parcela de US$ 10,6 bilhões. Isso impediria o que os argentinos chamam de "sangria de reservas".
Gustavo Cupertino, coordenador-geral de estatística e análise comercial da Secretária de Comércio de Relações Internacionais do Ministério da Agricultura, destaca que a Argentina colheu sua menor safra dos últimos 20 anos, após uma das piores secas em décadas. O país enfrenta, pelo terceiro ano consecutivo, o fenômeno La Niña.
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— Como o país tem uma boa capacidade de esmagamento de soja em grãos, e é um dos maiores exportadores de óleo de soja e farelo, houve necessidade de importação do grão brasileiro para suprir as necessidades internas causadas pela seca — afirma Cupertino.
Fenômeno que, ao contrário do El Niño, causa seca no Sul e chuvas no Nordeste, o La Niña também afeta o Brasil. O Rio Grande do Sul, por exemplo, é atingido pela terceira vez por uma seca interminável. Os produtores da região pedem ajuda financeira ao governo brasileiro.