Economia
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Com 30 anos de experiência no mercado de fusões e aquisições, Daniel Wainstein vê o Brasil num momento único para atrair o investidor estrangeiro, que voltou a olhar para o país após o período turbulento das eleições de 2022 e atraído pelo potencial ESG da nossa economia, sobretudo nos projetos de transição energética.

Depois de um início de ano “avassalador” para o crédito das empresas brasileiras, pressionadas pela alta dos juros e por eventos como a crise da Americanas, Wainstein notou uma guinada no mercado a partir de abril.

Sócio e fundador da Seneca Evercore, consultoria que é líder entre as assessorias independentes em fusões e aquisições no país, Wainstein foi antes diretor no Brasil do Greenhill e do Goldman Sachs. O executivo considera fundamental o governo viabilizar os investimentos em infraestrutura necessários para o país crescer.

Mas vê com ressalvas algumas das premissas do PAC, como priorizar obras inacabadas ou usar como critério para a escolha dos projetos as sugestões de congressistas.

Como o investidor estrangeiro está vendo o atual momento da economia brasileira?

Existe um mercado chamado credit default swap (CDS) que é como se fosse um seguro no qual o investidor compra para poder, caso o Brasil venha a dar um calote, que ele receba o valor que ele aplicou. Esse mercado estava precificando, no fim de outubro, ou seja, na véspera das eleições, o risco de calote do Brasil em 5,8%.

Este número hoje está em 2,8%. Então, você conhece aquela música do jazz, What a difference a day makes (“que diferença um dia faz”, em tradução livre)? Realmente o Brasil, em alguns meses, teve uma reclassificação de mercado, sem nenhum juízo de valor. O país está sendo muito buscado por investidores.

A gente sentiu uma mudança em nossas transações drásticas para melhor desde abril. Tivemos um primeiro semestre extremamente baixo em termos de atividade de M&A (fusões e aquisições), porque no segundo semestre de 2022 basicamente todos os processos pararam e ninguém lançou novas operações.

Inclusive, a gente recomendava nossos clientes, se não precisasse, não lançasse, porque existia muita incerteza, um risco muito alto percebido pelos investidores, salvo aqueles que querem investir em situações de estresse. Então no primeiro semestre tivermos um volume total de transações de US$ 7,6 bilhões, comparado a, por exemplo, no primeiro semestre de 2021, de US$ 27 bilhões. Foi um volume parecido com o primeiro semestre de 2020, no ápice da pandemia.

O risco medido pelo CDS é muito observado pelo investidor financeiro, que é o primeiro a voltar. E como está o apetite do investidor estratégico, que aposta em projetos e olha o médio e longo prazo?

O CDS não é referência só para o investidor financeiro, é a percepção de risco que o Brasil tem lá fora e anda junto com a percepção de risco estratégico. O investidor estratégico não quer comprar no melhor momento, ele quer é comprar alguma coisa que ele sente que no longo prazo vai estar bem. E essa sensação começou a voltar.

O Brasil estava sendo visto como um pária em vários aspectos para investidores estratégicos. A empresas hoje, mundialmente, se preocupam muito com a agenda do meio ambiente.

E o Brasil estava sendo realmente um líder na despreocupação pelo meio ambiente e na retórica para tal. Hoje a gente está com a agenda totalmente inversa. O número que tem sido aceito mundialmente é que o nosso desmatamento diminuiu em 33 % no primeiro semestre comparado com o primeiro semestre de 2022.

O segundo aspecto é que existia um temor muito grande em relação à sustentabilidade da nossa democracia.

E o investidor, principalmente o estratégico, não quer entrar num país na véspera de uma situação onde possa haver uma reviravolta no cenário político, por menor que fosse o risco disso (da erosão da democracia). Depois, quando passou a eleição, nós tivemos o efeito grande de empresas brasileiras que se endividaram a 2,5% (que era o patamar de juros no início de 2021), passaram pela pandemia anos difíceis, o faturamento caiu, o lucro caiu, só que o custo da dívida aumentou em cinco vezes (a taxa básica Selic chegou a 13,75%).

Essa situação fez com que houvesse um nível de problema de liquidez de empresas brasileiras que eu nunca tinha visto trabalhando nesse mercado há quase 30 anos. Então assim, foi um congelamento total.

O senhor citou o mês de abril como o mês da virada. Qual foi o gatilho? As sinalizações do novo governo na política econômica também foram importantes?

Mesmo antes da redução da Selic, já começou a ter a visibilidade de que isso aconteceria, a inflação estava controlada.

A Reforma Tributária ter sido aprovado na Câmara é algo que a gente está realmente almejando fazer desde a redemocratização. Então não é pouco o feito.

Espero que isso venha a ser ratificado com poucas mudanças no Senado. A discussão do arcabouço fiscal, obviamente, é extremamente importante na perspectiva do investidor, dá conforto em relação às finanças públicas. E, por fim, o governo demonstrou uma moderação e a interlocução feita pelo próprio Haddad (Fernando Haddad, ministro da Fazenda) tem sido muito positiva.

Eu citaria também uma coisa que é importante e às vezes passa despercebido. A gente está vindo de um governo no qual as relações internacionais eram pautadas pela ideologia. O que a gente está vendo hoje é o Lula fazendo basicamente o que no mercado a gente chama de roadshow, vender o Brasil para atrair investidores.

Fez isso na China, esta semana se reuniu com um sultão lá dos Emirados Árabes, vai nos Estados Unidos dizendo que os chineses estão investindo aqui, está criando uma competição, salutar, para atrair investimento.

Estamos às vésperas do anúncio do novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento, que o governo Lula vai divulgar nesta sexta-feira, com investimentos públicos previstos em até R$ 60 bilhões). Como o senhor avalia essa proposta?

Obviamente o PAC depende do arcabouço fiscal. É preciso ter uma pacificação em relação ao que realmente terá disponível para o governo investir. No PAC, o que o governo está sinalizando, me surpreendeu falar que a prioridade é retomar obras paradas. Como economista, eu olho e falo o seguinte: não deveria ser decidido com base no que está parado, deveria ser decidido onde que eu coloque o real investido que vai multiplicar esse real em benefícios de crescimento econômico? O tal do multiplicador: qual o impacto que esse real pode ter na parte social, educação, saúde, etc?

Na infraestrutura, parou uma obra no governo Dilma que está 10 % completa, por exemplo. Será que essa obra ainda investir para poder completar os outros 90 % é a melhor decisão do que fazer uma outra? Pode estar 50 % (completa) e pode ser que essa análise mostre que essa obra não é a melhor utilização do capital disponível do governo.

O governo nesse momento tem que pensar como pensar em uma empresa capitalista, tem um volume de dinheiro para poder investir, onde meu dinheiro vai melhor render? Em economia a gente chama de suck cost, é o custo enterrado. O que foi feito no passado, ok, você tem que ver daqui para frente o que é que seu investimento vai resultar.

Mas talvez a lógica política seja fazer o que vai ficar pronto mais rapidamente.

Mas essa lógica infelizmente não é a melhor. A segunda questão é que ele colocou obras propostas pelo Congresso e só depois os projetos propostos pelos ministros. A gente sabe que a gente vive numa democracia e que o Poder Executivo precisa do apoio do Congresso, mas tem que haver um equilíbrio. A gente precisa realmente sentir que a decisão do governo em onde vai investir, seja qual for o valor que o arcabouço fiscal permita que ele invista, seja para investir para aumentar a produtividade.

A prioridade do Brasil, o crescimento brasileiro e não com base na velocidade que ele possa apresentar algumas obras ou atender apelos de política. Não estou sendo ingênuo dizendo que não vai ter um componente disso, mas é importante que a prioridade seja o crescimento.

Eu acho que Lula, em paralelo, está falando com outros países para atrair investimentos. E a PPP (parcerias público-privadas) é uma estrutura saudável, que ele também tem priorizado nas conversas. O PAC é ótimo. Mas é como qualquer remédio. Quando é demasiado, faz mal ao paciente. O que a gente sentiu no governo Dilma foi um excesso de gastos do governo em aspectos nos quais deveria haver um incentivo para a iniciativa privada participar.

E quando você faz isso em condições atrativas, digamos assim, para quem está recebendo investimento, e provê um crédito especial, como o BNDES tanto fez, você acaba afastando a iniciativa privada. Você basicamente assume um papel que não deveria ser do governo. O que a gente precisa, obviamente, são condições e pautas que incentivem que a iniciativa privada invista.

E que setores têm mais potencial para atrair os investidores no Brasil?

Claramente existe um interesse por energia alternativa, mundialmente. Faz parte da pauta ESG, você vê fundos soberanos querendo investir, fundos de private equity e outros especializados nisso inclusive. E, para que isso realmente consiga vingar (a transição energética), muitas vezes precisa de uma ajuda do governo, de alguma forma. Até porque gerar energia com essas energias alternativas, na grande maioria das vezes, é mais caro do que com combustível fóssil.

O que a gente precisa é o governo de alguma forma participar da solução para atrair o investimento, e nessa área (transição energética) o Brasil tem uma vocação natural enorme.

O país precisa também de investimentos em infraestrutura, estradas, ferrovias, aeroportos. Os investimentos haviam parado. O governo anterior investiu 0,5% do PIB. No governo Lula anterior, foi 1,5% do PIB. E agora a gente está falando em investir (com o novo PAC) 1% do PIB.

Um país vai ser sucateado se ele tiver o nível de investimento de 0,5% do PIB. Então a gente precisa realmente encontrar uma forma de investir corretamente nessas questões estruturantes, mas também com o valor que consiga fazer com que o Brasil tenha o arcabouço (fiscal), para poder sustentar esse crescimento de longo prazo.

O senhor mencionou energia alternativa como um setor que atrai investimentos. E que tipo de investidor está olhando para o Brasil? Há fundos que nunca tinham vindo para cá despertando para o país agora?

Sim. Estamos trabalhando em mais de 35 transações agora e eu diria que na grande maioria a gente tem recebido interesse forte internacional e muitos investidores que nunca investiram no país. Vindo da Ásia, Japão, Oriente Médio, Canadá, mesmo dos Estados Unidos. Muitos que obviamente já conhecem muito o Brasil, mas outros que ainda não.

O Brasil passou a ser parte da pauta e da agenda desses investidores. E no primeiro semestre de 2024 isso vai aparecer com ainda mais força, devemos ter mais de US$ 30 bilhões em transações de fusões e aquisições.

O senhor mencionou que em 30 anos de experiência neste mercado nunca viu uma crise no crédito corporativo como a que o Brasil viveu no início deste ano. Foi só a alta de juros ou teve também um efeito de Americanas e da recuperação judicial de outras empresas?

Nunca tinha visto uma crise nesse nível, mas também nunca tinha visto a Selic subir quase sete vezes. Então, a decisão do diretor financeiro (das empresas que depois tiveram dificuldades de liquidez) não foi erro, ele escolheu a estrutura de capital e nível de endividamento prevendo o crescimento da empresa e uma continuidade no custo de dívida.

O crescimento da empresa despencou com a pandemia e aí você teve um aumento no custo da dívida. Em 2008 (na crise financeira global), a gente viu um certo estresse no mercado financeiro, não no nível corporativo tanto. O Brasil, de certa forma, não foi tão impactado. Eu não senti o respingo que a gente sentiu, por exemplo, da forma avassaladora que a gente teve no primeiro semestre deste ano.

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