Integrada por mais de 70 equipes, uma operação nacional resgatou 532 pessoas em condição de trabalho análogo a escravidão durante o mês de agosto. No Rio de Janeiro, foi encontrada, em situação de trabalho escravo doméstico, uma idosa de 90 anos que é a pessoa mais velha já resgatada no Brasil.
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Em uma colheita de alho em Rio Paranaíba (MG), 97 trabalhadores foram resgatados. Dentre eles, seis adolescentes, dos quais uma grávida. Não havia banheiros suficientes ou local para os empregados esquentarem sua comida. Os trabalhadores não tinham carteira de trabalho assinada nem receberam Equipamentos de Proteção Individual (EPIs).
Foram mais de 200 inspeções em 22 estados, além do Distrito Federal. As equipes encontraram 26 crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil, dos quais seis também estavam sob condições semelhantes à escravidão. Dos 532 resgatados, ao menos 74 foram vítimas de tráfico de pessoas.
Seis instituições participaram do mutirão: Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Ministério Público do Trabalho (MPT), Ministério Público Federal (MPF), Defensoria Pública da União (DPU), Polícia Federal (PF) e Polícia Rodoviária Federal (PRF).
Já foram pagos aproximadamente R$ 3 milhões de verbas rescisórias e R$ 2 milhões de indenizações por danos morais. Esse montante, no entanto, irá crescer, já que alguns casos foram levados à Justiça.
Estados com maior número de resgatados:
- Minas Gerais: 204
- Goiás: 126
- São Paulo: 54
- Piauí: 42
- Maranhão: 42
Atividades econômicas com maior número de resgatados:
- Cultivo de café: 98
- Cultura de alho: 97
- Cultivo de cebola e batata: 84
- Carnaúba: 54
- Produção de ovos: 23
Procuradora do Trabalho, Guadalupe Turos esteve na equipe que encontrou a idosa de 90 anos, resgatada em uma casa no bairro do Grajaú, na Zona Norte do Rio de Janeiro.
Ela não tinha a carteira de trabalho assinada, recebia um salário mínimo, não tirava férias e não recebia 13º salário ou pagamento por hora extra. A situação se agravou porque, de dezembro de 2022 para cá, essa senhora passou a ser impedida de visitar sua irmã, moradora de um bairro vizinho.
Há 16 anos, já aposentada, a idosa trabalhava como empregada doméstica na casa em que foi encontrada. Ela era acompanhante e cuidadora de uma idosa de 101 anos.
— Nós entendemos o último ano como jornada exaustiva. Ela costumava ir para casa, descansava. Agora, estava dormindo em um sofá, num quartinho próximo à senhora de 101 anos, trabalhando de segunda a segunda, 24 horas à disposição. Ela estava com uma ferida na perna, com problemas de saúde — conta Guadalupe.
A procuradora lembra que, muito embora essa senhora já fosse aposentada pela previdência social, a partir do momento em que ela começa a trabalhar como doméstica, os direitos trabalhistas têm que ser observados.
— É uma relação permeada pelo afeto e, por conta disso, a sociedade muitas vezes não entende que é um trabalho remunerado e que precisa de direitos assegurados, pagos. Não basta dizer que é quase como uma família. Muitas vezes os empregadores domésticos abusam da vulnerabilidade dessas pessoas — explica Guadalupe.