A Argentina vive uma nova corrida cambial, a menos de duas semanas das eleições presidenciais, em 22 de outubro. Ontem a cotação do dólar paralelo, chamado de blue, superou mil pesos, um novo recorde histórico. Nas ruas da capital, a moeda americana chegou a ser negociada a 1.025 pesos, segundo o jornal La Nación, e encerrou o dia em 1.010 pesos.
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A cotação pode mudar de cueva para cueva, como são chamados pontos informais de troca de moedas. Em grupos de WhatsApp usados para compra e venda de dólares, a cotação do blue também superou os mil pesos.
Desde as primárias, em agosto, quando foram escolhidos os candidatos, o dólar blue já acumula desvalorização de 40%. A tendência, segundo analistas, é que esse movimento se mantenha até o pleito.
A turbulência financeira levou a tensão política ao máximo. O ministro da Economia e candidato do governo à Presidência, Sergio Massa, culpa o rival da extrema-direita, Javier Milei, pela corrida cambial — que em 2 de outubro estava em 800 pesos.
Crise econômica avassala Argentina; veja imagens
![Um homem compra frutas e verduras no Mercado Central de Buenos Aires. Em meio a crise, o país criou nova cédula de 2000 pesos argentinos. — Foto: Luis ROBAYO / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/ft35TVxgUDPgVhsTMCptwEDg6HQ=/0x0:7197x4798/648x248/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/s/t/CFZoovSbWv3G2CmyzGGw/103002429-a-man-buys-fruits-and-vegetables-at-the-central-market-in-buenos-aires-on-may-12-2023-arge.jpg)
![Um homem compra frutas e verduras no Mercado Central de Buenos Aires. Em meio a crise, o país criou nova cédula de 2000 pesos argentinos. — Foto: Luis ROBAYO / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/ws_HrXBDs5IACBzzye7bDIzuRns=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/s/t/CFZoovSbWv3G2CmyzGGw/103002429-a-man-buys-fruits-and-vegetables-at-the-central-market-in-buenos-aires-on-may-12-2023-arge.jpg)
Um homem compra frutas e verduras no Mercado Central de Buenos Aires. Em meio a crise, o país criou nova cédula de 2000 pesos argentinos. — Foto: Luis ROBAYO / AFP
![Um homem procura comida dentro de uma lata de lixo onde frutas e vegetais descartados são depositados no Mercado Central de Buenos Aires. — Foto: Luis ROBAYO / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/4dmF7FOAn-uexSzHs59GqiaCoOs=/0x0:7614x5076/323x182/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/B/d/Xx2gRiSCifKkqtRY1x5Q/103008262-topshot-a-man-searches-food-inside-a-trash-can-where-discarded-fruits-and-vegetables-are.jpg)
![Um homem procura comida dentro de uma lata de lixo onde frutas e vegetais descartados são depositados no Mercado Central de Buenos Aires. — Foto: Luis ROBAYO / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/onGKfw_Ob6B9Bgcx7Yjp2cEIJXA=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/B/d/Xx2gRiSCifKkqtRY1x5Q/103008262-topshot-a-man-searches-food-inside-a-trash-can-where-discarded-fruits-and-vegetables-are.jpg)
Um homem procura comida dentro de uma lata de lixo onde frutas e vegetais descartados são depositados no Mercado Central de Buenos Aires. — Foto: Luis ROBAYO / AFP
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![Mulheres compram queijo em uma banca do Mercado Central de Buenos Aires. Argentina tem uma das maiores taxas de inflação do mundo. — Foto: Luis ROBAYO / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/e7BnCCmK3ABTXp4qsvNopzJwbHY=/0x0:6919x4613/323x182/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/E/f/FJ0jnbTNOGfBzaopjvLA/103002437-women-buy-cheese-in-a-stall-at-the-central-market-in-buenos-aires-on-may-12-2023-argentina.jpg)
![Mulheres compram queijo em uma banca do Mercado Central de Buenos Aires. Argentina tem uma das maiores taxas de inflação do mundo. — Foto: Luis ROBAYO / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/fUyHIMPeFona5huR-gBa9FfMcqI=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/E/f/FJ0jnbTNOGfBzaopjvLA/103002437-women-buy-cheese-in-a-stall-at-the-central-market-in-buenos-aires-on-may-12-2023-argentina.jpg)
Mulheres compram queijo em uma banca do Mercado Central de Buenos Aires. Argentina tem uma das maiores taxas de inflação do mundo. — Foto: Luis ROBAYO / AFP
![Uma mulher vende frutas e verduras no Mercado Central de Buenos Aires. Peso argentino sofre constante desvalorização em relação ao dólar americano. — Foto: Luis ROBAYO / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/6Zr0pfdq9GEPTIu3VUGYXqEmQkA=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/A/q/jKj6apRAC4C7eONEsFHg/103002443-a-woman-sells-vegetables-and-fruits-at-the-central-market-in-buenos-aires-on-may-12-2023-a.jpg)
Uma mulher vende frutas e verduras no Mercado Central de Buenos Aires. Peso argentino sofre constante desvalorização em relação ao dólar americano. — Foto: Luis ROBAYO / AFP
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![A típica erva-mate argentina também sofreu com a alta de preços devido a crise econômica. — Foto: Luis ROBAYO / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/xF7lerKQnEY3c0rGs-RCpMQywOY=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/a/Y/I1cvRRRHuiXEOT0rQRVQ/103003146-different-brands-of-yerba-mate-are-seen-with-signs-indicating-their-prices-in-argentine-pe.jpg)
A típica erva-mate argentina também sofreu com a alta de preços devido a crise econômica. — Foto: Luis ROBAYO / AFP
![Com a crise econômica, um quilo de queijo chega a valer mais de 2000 pesos. — Foto: Luis ROBAYO / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/4p3MjTYKDynhm0xX_6lpgrQnN5Q=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/e/C/hpuBs1TdSn1CZV1ECfyw/103003170-different-types-of-cheeses-are-seen-with-a-sign-indicating-their-price-in-argentine-pesos.jpg)
Com a crise econômica, um quilo de queijo chega a valer mais de 2000 pesos. — Foto: Luis ROBAYO / AFP
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![Vista aérea das avenidas General Paz e Perito Moreno em Buenos Aires, capital da Argentina. — Foto: Luis ROBAYO / AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/YYwTqpDYpp7U2t8GbtX6mWCeewY=/1600x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/3/A/Tp8FrUR5KCTRsIb2Csdg/103002475-aerial-view-of-the-general-paz-and-perito-moreno-avenues-at-dawn-in-buenos-aires-on-may-12.jpg)
Vista aérea das avenidas General Paz e Perito Moreno em Buenos Aires, capital da Argentina. — Foto: Luis ROBAYO / AFP
Na última segunda-feira, Milei disse a jornalistas que o peso era “um excremento”, atitude considerada irresponsável pelo candidato peronista. Milei, do partido A Liberdade Avança, também afirmou que os argentinos não devem renovar suas aplicações de renda fixa em pesos.
Massa não apenas responsabilizou o rival pela disparada do dólar, como disse, em evento na Câmara da Construção Argentina, que vai “prender os que atacam as poupanças das pessoas”:
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— Posso ganhar ou perder a eleição, isso é secundário. Mas tenham a certeza de que até 10 de dezembro (quando assume o novo presidente) vou me ocupar dos espertinhos. Aviso para que depois não digam que atacamos o mercado ou as liberdades. Até que não os veja presos, não vou parar.
Diante das acusações, Milei negou qualquer responsabilidade pela corrida cambial:
— Se querem encontrar os responsáveis, olhem-se no espelho.
Além de Milei, o candidato de seu partido ao governo da cidade de Buenos Aires, Ramiro Marra, afirmou esta semana que os argentinos não devem poupar em pesos. Após a disparada do dólar, Marra disse que “tudo isso é culpa da irresponsabilidade dos políticos que não sabem governar”.
![Cotação do dólar paralelo (dólar blue) superou mil pesos, um novo recorde histórico — Foto: La Nación](https://s2-oglobo.glbimg.com/r1NJvqNQ_TyLwHRgs_kU2DZwEQ0=/0x0:3998x2667/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/i/R/gJTiUgS6yTAYa9lUQr5w/402485123.jpg)
À tarde, Patricia Bullrich, candidata presidencial do Juntos pela Mudança, questionou duramente seus principais rivais eleitorais, Sergio Massa e Javier Milei, em meio ao choque econômico causado pela corrida ao dólar azul. "Estamos à beira do precipício", advertiu em entrevista improvisada no meio de uma turnê de campanha na Região Metropolitana de Buenos Aires.
Embora o economista Carlos Melconian também estivesse programado para falar, no final ele apenas apoiou as declarações do candidata, juntamente com outros líderes da coalizão de oposição.
"Nós vimos isso acontecer. Tudo o que Massa está fazendo é aprofundar a crise. Ele especulou que isso aconteceria depois de 22 de outubro. Diante da irresponsabilidade de Massa, cujo único objetivo é ganhar um voto, um movimento está sendo gerado tão rapidamente que estamos à beira do precipício", afirmou.
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E acrescentou:
"Como força política, não queremos cair no precipício e é por isso que interrompemos a campanha e estamos aqui. Também alertamos as pessoas que, do outro lado, há Milei, que pede a dolarização porque quer realizar sua ideia mesmo que 46 milhões de argentinos percam seus salários", afirmou.
![Argentina enfrenta crise sem precedentes às vésperas da eleição do dia 22 — Foto: La Nación](https://s2-oglobo.glbimg.com/_xp_bnHmsGzQK6IuS2kSEf36dW4=/0x0:3998x2483/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/L/Q/gLv5pCSbKgFV1JABzJsA/402484967.jpg)
O Banco Central argentino afirmou ontem em comunicado que o país tem “um sistema financeiro líquido e solvente” e que os recursos dos argentinos estão protegidos.
Já várias associações de bancos que operam no país divulgaram nota conjunta na qual afirmam que “recomendar que não sejam renovadas aplicações de renda fixa não faz outra coisa que gerar preocupação num setor da população”. A nota diz ainda que “os candidatos devem mostrar responsabilidade” e evitar “fazer declarações infundadas”.
Em evento na noite de segunda, ao lado do embaixador da Argentina no Brasil, Daniel Scioli, Massa afirmou ficar preocupado quando vê “candidatos que são capazes de incendiar a casa onde vivem para conseguir mais votos”.
Pela manhã, na tentativa de conter a demanda por dólares, o Ministério da Economia publicou, junto com a Afip (o Fisco local), novas regras para uso de cartões de crédito e débito por argentinos no exterior. O governo argentino unificou três tipos de dólares usados para viagens internacionais (Catar, solidário e cartão) e elevou os tributos cobrados nos cartões.
As medidas, confirmou uma fonte do governo, não afetam estrangeiros que pagam com cartão de crédito ou débito na Argentina.
Salários antecipados
Nos bancos de Buenos Aires, há quem espere mais de uma hora para sacar até mesmo US$ 40. Os dólares guardados em casa são usados para pagar contas e poupar, à espera de que a cotação continue a subir.
Consultadas pelo GLOBO, algumas pessoas mencionaram as falas de Milei, mas outras culparam o próprio Massa.
Esta nova corrida é uma péssima notícia para Massa, que enfrenta o desafio de impedir uma vitória de Milei no primeiro turno, cenário que analistas locais não descartam. Ser ministro da Economia e candidato é uma combinação complexa, num país que atravessa uma crise econômica profunda, com inflação anual acima de 100% e taxa de pobreza de 41%.
Para analistas financeiros ouvidos pelo GLOBO, a corrida cambial de ontem já era anunciada, pois o mercado esperava uma escalada do dólar antes das eleições. Os argentinos, em meio à incerteza, buscam refúgio na moeda americana, como fazem há décadas.
— A grande maioria dos analistas financeiros do país recomenda, há semanas, ou meses, que seus clientes se refugiem no dólar antes da eleição — diz Ivan Sasovsky, analista da consultoria Expansion Holding. — Muitas pessoas estão adiando pagamentos para depois das eleições e, com esse dinheiro, compram dólar. O governo fez tudo errado. Injetou mais pesos no mercado, aumentou o déficit fiscal, e essa corrida era o resultado óbvio.
Algumas empresas estão antecipando até três meses de salário para se livrar de pesos. Esse dinheiro, diz Fernando Corvaro, professor do mestrado de Finanças da Universidade Di Tella, vai todo para o dólar. Ele acredita que a Argentina já caminha para uma hiperinflação:
— Temos uma emissão descontrolada de pesos, um déficit fiscal altíssimo, o Banco Central recomprando dívida e, para isso, aumentando a emissão da moeda. Neste cenário, o candidato favorito diz aos argentinos que não renovem aplicações de renda fixa e que o peso é um excremento.