Economia
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Por — São Paulo

O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, apresentou, na manhã desta segunda-feira, uma proposta para limitar a 12 parcelas as compras sem juros no cartão de crédito. A medida ainda está em estudo, e o próprio BC fará simulações para apresentar ao setor o impacto que essa medida poderia ter na redução dos juros do rotativo do cartão de crédito.

Mas, afinal, por que o parcelamento sem juros influencia na taxa do rotativo? Como funciona o mercado de cartão de crédito no Brasil? E por que o BC está propondo mudanças?

Entenda, abaixo, o que está em jogo.

Projeto no Congresso

O Congresso aprovou neste mês um projeto que limita o juro do rotativo do cartão de crédito. O valor máximo que poderá ser cobrado pelos bancos será o dobro da dívida inicial — ou seja 100%.

O projeto avançou diante de uma forte alta do endividamento e, também, dos juros elevados cobrados no rotativo do cartão. Mas o texto aprovado pelo Congresso prevê que esse limite só entrará em vigor caso o setor não apresente, até o fim do ano, uma outra proposta para regular o setor.

Um grupo de trabalho formado por bancos, bandeiras de cartão, empresas de maquininhas de débito e crédito, representantes do varejo e Banco Central do Brasil está discutindo uma alternativa a esse teto para apresentá-la ao Conselho Monetário Nacional (CMN).

Integrantes do grupo defendem também criar novas regras para o parcelamento sem juros no cartão, já que parte dos participantes deste mercado avalia que há um subsídio cruzado - ou seja, os juros só seriam tão altos no rotativo porque há financiamento sem cobranças adicionais nas vendas parceladas.

1) Como funciona o rotativo do cartão de crédito?

Quando o cliente não paga o total da fatura do cartão na data do vencimento, ele entra automaticamente no rotativo, uma forma de crédito pré-aprovada. Os especialistas em finanças recomendam que o rotativo seja usado apenas em situações emergenciais.

Mas muita gente acaba usando esse crédito seguidamente. Assim, os valores devidos “rodam” para o próximo mês, com juros sobre juros, o que eleva muito a dívida, virando uma bola de neve.

2) Qual é o juro cobrado de quem entra no rotativo atualmente?

Segundo o Banco Central, o juro médio do rotativo chegou a 445,7% ao ano em agosto passado — no mesmo mês de 2022, era bem menor, de 399,6% ao ano. Trata-se do crédito mais caro do mercado e, por isso, estão sendo discutidas alternativas para baixar essa taxa.

3) Mas chega-se a pagar 445,6% num ano se ficar por 12 meses no rotativo?

Os bancos dizem que não. Desde 2017, as instituições financeiras são obrigadas a migrar os clientes que ficam por mais de 30 dias no rotativo para uma linha de crédito parcelada com juros mais baixos. E, segundo os bancos, o brasileiro passa em média apenas 18 dias pendurado no rotativo do cartão. Além disso, as instituições financeiras alegam que no Brasil uma parcela enorme das compras é feita sem juros: 75% do total, fatia muito maior que em outros países.

4) Quanto os brasileiros devem no rotativo?

Segundo o Banco Central, os brasileiros tinham R$ 75,4 bilhões em dívidas no cartão em agosto. O número é quase o dobro de dois anos antes, em agosto de 2021, quando eram R$ 40,42 bilhões. O crescimento dessa dívida acendeu a luz amarela no governo.

5) Por que os juros no rotativo são tão altos?

Não há resposta objetiva para isso. Uma das teses é que os juros elevados do rotativo acabam subsidiando a prática, comum no Brasil, de vendas parceladas sem juros. Assim, como os bancos não ganhariam nas vendas regulares em prestação sem taxas, estariam cobrando juros mais elevados para os clientes que se tornam inadimplentes e entram no rotativo. Mas não há consenso sobre o chamado subsídio cruzado.

Outro motivo apontado para que as taxas do cartão sejam tão altas é que esta é a linha com maior inadimplência, cerca de 50%, e sem garantias (não há como tomar o bem de quem deixa de pagar). E o cálculo é feito com juros compostos (ou seja, juros sobre juros) o que encarece ainda mais seu custo. Mas certamente, se forem impostos limites ao rotativo, haverá um rearranjo do parcelamento sem juros como forma de minimizar o impacto sobre o resultado do conjunto de produtos ofertados.

6) Só existe no Brasil o parcelamento sem juros?

A prática de compras parceladas sem juros é mais comum no Brasil. Em outros países, o parcelamento costuma ocorrer em transações de maior valor — automóveis, eletrodomésticos e eletroeletrônicos muito caros – e mediante pagamento de juros, ainda que com taxas em patamares bem mais baixos do que no Brasil.

Recentemente, cresceu a prática em outros países, como EUA e Reino Unido, de um mecanismo conhecido como “buy now, pay later” (compre agora, pague depois, numa tradução livre), intermediado por fintechs.

7) Por que no Brasil essa modalidade é tão popular?

O varejo no Brasil usava, no passado, o carnê ou os cheques pré-datados. Neste caso, o risco era do lojista. Com o avanço da bancarização no país, o cartão de crédito passou a ser mais adotado. No parcelamento no cartão, caso o cliente não pague as parcelas, o risco é do banco ou da financeira.

As empresas que operam as máquinas de cartão de crédito, chamadas no jargão do mercado de adquirentes, argumentam que eliminar ou limitar o parcelamento sem juros colocaria em risco as operações e a viabilidade dos pequenos varejistas no Brasil.

Os bancos, por sua vez, alegam que as adquirentes ganham com essas operações ao oferecerem, para os lojistas, a antecipação dos recursos que teriam a receber no futuro das compras parceladas mediante o pagamento de taxas.

8) O parcelamento sem juros encarece o valor de produtos?

Algumas redes varejistas oferecem descontos para pagamento à vista, em lojas físicas e nas compras pela internet, prática que se tornou mais comum com a facilidade do pagamento via Pix. Mas nem sempre isso ocorre.

9) Que alternativas estão em discussão?

O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, chegou a propor o fim do rotativo no cartão de crédito, mas foi alvo de críticas porque isso fecharia uma linha de crédito pré-aprovado.

Após a aprovação, pelo Congresso, do projeto de lei que limita os juros no rotativo do cartão de crédito, o grupo de trabalho formado por bancos, bandeiras de cartão de crédito, adquirentes (as maquininhas de débito e crédito), representantes do varejo, além de instituições como Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) e do BC, tem até o fim do ano para propor alternativas a esse teto na taxa do rotativo aprovado pelos congressistas.

Entre as opções em discussão estão criar regras para conter o parcelamento sem juros, como a cobrança de uma tarifa extra do consumidor para desincentivar a compra descontrolada com cartão de crédito em parcelas a perder de vista, um dos fatores que levam à inadimplência (e, portanto, o ingresso no rotativo). Ou limitar o prazo máximo deste parcelamento.

10) Fixar um teto para os juros é uma boa alternativa?

Especialistas apontam o risco de cenário parecido com o que ocorreu com o consignado dos aposentados. Após o Conselho Nacional de Previdência ter reduzido o teto dos juros, vários bancos do país cancelaram essas linhas, e o governo foi obrigado a recuar.

A Associação Brasileira de Bancos (ABBC) diz que estabelecer um limite de juros nessa modalidade pode tornar mais complexa a entrada de novas instituições no sistema, o que diminuiria o acesso ao crédito, reduzindo a inclusão financeira no país.

11) O que defendem os bancos e o varejo?

Os bancos querem diminuir o prazo das compras parceladas sem juros. Segundo as instituições, essa modalidade embute taxas escondidas dos clientes. A Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) segue defendendo que os riscos dessa cadeia sejam diluídos.

A entidade entende que hoje são os bancos que suportam o custo da inadimplência. O varejo defende que, num país de renda média baixa como o Brasil, o parcelamento é a forma possível para a compra de produtos, sobretudo de maior valor agregado.

12) E o que dizem os representantes das empresas de cartão de crédito?

A Abecs, associação que representa a indústria de meios eletrônicos de pagamento, é contrária a qualquer proposta de tabelamento da taxa de juros do rotativo. Para a entidade, essa medida pode resultar em queda na oferta de crédito, com impacto no PIB do país.

A Abecs diz que não há uma solução única para a questão e defende um debate que “evite ao máximo gerar impactos para os participantes do setor, para a economia e para a sociedade em geral”.

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