Economia
PUBLICIDADE

O governador Tarcísio de Freitas apresentou nesta terça-feira detalhes do projeto de lei para a privatização da Sabesp. A operação será feita por follow-on, ou seja, oferta subsequente de ações na Bolsa de Valores — um novo lote de papeis que não existia. A ideia é que o estado de São Paulo deixe de ter o controle majoritário da companhia para ter uma participação acionária entre 15% a 30%. Hoje, o governo é dono de 50,3% das ações.

O projeto foi encaminhado nesta terça-feira para a Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), em regime de urgência. A expectativa do governador Tarcísio de Freitas é que o texto seja aprovado ainda este ano.

Segundo ele, a privatização vai ampliar a capacidade de investimento da Sabesp, de R$ 56 bilhões, previstos até 2033, para R$ 66 bilhões, até 2029. Ele ressaltou que o modelo prevê a redução tarifária e não representa uma "venda total" da empresa:

— Parte do recurso que iria para o Tesouro vai para a companhia, o que garante tarifa mais baixo. Ao longo do tempo, isso vai ser feito com os próprios recursos que vêm da empresa. Nós vamos garantir, por meio dos dividendos, que as pessoas recebam modicidade tarifária e que não haja exposição tarifária — afirmou o governador, que não tem uma previsão de quanto será a redução dos preços.

A gestão traz o modelo de golden share como um dos principais pontos do projeto. Com essa espécie de ação de classe especial, o governo estadual mantém o poder de veto em decisões estratégicas do conselho de administração da companhia, mesmo não sendo mais o controlador. O estado também terá limite maior de votos no conselho, o que garante mais peso em decisões na empresa.

Outro destaque do projeto, como adiantou O GLOBO, é a criação do Fundo de Apoio à Universalização do Saneamento no Estado de São Paulo (Fausp), destinado a prover recursos para ações de saneamento básico, inclusive voltadas ao equilíbrio tarifário. O governo prevê a criação de um Conselho de Orientação para governança do fundo.

O texto mantém a previsão de universalização dos serviços de saneamento até 2029 e cita redução tarifária “com foco na população vulnerável”. A empresa prevê chegar a 10 milhões de pessoas que hoje não são atendidas por um dos serviços da Sabesp, 1 milhão a mais do que no plano original da companhia.

Dividendos serão usados para reduzir tarifa

A ideia é que o estado destine para o fundo, no mínimo, 30% do valor líquido obtido com a desestatização. Também serão direcionados ao fundo os valores da distribuição de dividendos ou de juros sobre o capital próprio, que sejam distribuídos pela Sabesp. Os repasses serão anuais.

“Também serão destinados ao fundo os valores auferidos pelo estado a título de dividendos ou juros sobre o capital próprio distribuídos pela Sabesp, que deverão ser aplicados, anualmente, em medidas que proporcionem modicidade tarifária nos setores de abastecimento de água e esgotamento sanitário do estado de São Paulo”, diz o texto apresentado pelo governo.

Os recursos do Fausp ainda poderão ser utilizados em casos de emergência ou calamidade pública, em razão de eventos climáticos extremos, para apoio a ações de saneamento e de saúde pública para atendimento à população afetada.

Em julho, Tarcísio já tinha anunciado que sua gestão escolhera como modelo de privatização uma oferta adicional de ações (follow-on) que permita que um único acionista privado tenha maior participação na empresa, tornando-se um acionista de referência, ou seja, com participação acionária relevante. Na prática, a iniciativa privada teria significativo poder decisório sobre a gestão da empresa.

A redução da tarifa no curto e longo prazo, um dos focos de preocupação de deputados, será garantida, segundo o governo, com o “uso de recursos do estado gerados na transação (venda das ações), dividendos próprios, além de melhorias na regulação e incentivo a ganhos de eficiência com gestão privada”.

Além de apresentar o texto aos deputados, nesta terça-feira, o governador também tem se reunido com prefeitos paulistas para tratar da privatização. Segundo Tarcísio, já houve encontros com 320 dos 375 prefeitos de cidades atendidas pela Sabesp.

Mercado tem expectativa positiva

Segundo um interlocutor próximo de Tarcísio, o follow-on se dará para captar grandes investidores, com o objetivo de atrair capital para os investimentos necessários em saneamento. Ou seja, não será uma diluição de ações, e sim a venda de novos papéis para dois ou três grandes investidores.

O mercado tem visto com bons olhos a expectativa de privatização e aposta no potencial de valorização das ações da companhia. Em relatório publicado nesta semana, analistas da XP projetam preço-alvo da ação em R$ 80 até 2024, com recomendação de compra. No ano, o papel acumula alta de 14%, negociado a R$ 61,27, segundo cotação desta terça-feira.

Phil Soares, chefe de análise de ações da Órama avalia que, apesar dos juros altos, o mercado tem mantido o interesse elevado para operações de follow-on de empresas com grande liquidez e geração de caixa, o que deve se repetir no caso da Sabesp. A projeção da corretora é de que as ações da companhia têm espaço para chegar a R$ 100 no próximo ano.

— Nossa concepção é que Sabesp está valendo a pena com ou sem privatização. Já é uma companhia relativamente bem tocada. Mas o que a gente vê com outros agentes no mercado, inclusive, é um consenso de que há espaço para melhora — diz Soares.

Aumento da capacidade de investimento

O professor do Instituto de Economia da Unicamp, Marco Antonio Rocha, que é crítico à privatização da Sabesp, questiona as motivações do governo e avalia que o processo tem fundo político, e não técnico. Ele lembra que a capacidade de investimento da companhia já é alta, em torno de R$ 5 bilhões por ano, com lucratividade e tem avançado em metas de saneamento.

— A Sabesp é uma empresa bem conceituada e até modelo dentro do setor de saneamento. Também já tem uma participação privada relevante e está inserida em um modelo de gestão que a obriga a ter uma perspectiva privada. E não é uma empresa que o governo coloca dinheiro, pelo contrário —diz ele.

Ex-presidente da Sabesp, o economista Gesner Oliveira, da GO Associados, defende que a privatização é positiva para aumentar a capacidade de investimento da companhia e tirar amarras da empresa.

— O plano de investimento é bom, mas precisa de muito mais. Despoluir a Baía do Rio Tietê, por exemplo, exige uma capacidade muito maior do que o estado é capaz de trazer.

Desafio na Alesp

A privatização da Sabesp será o maior desafio de Tarcísio na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp). Isso porque o projeto conta com a objeção do PT, segunda maior bancada da Casa, e suscita dúvidas até entre aliados do governador.

Deputados da oposição ouvidos pelo GLOBO acreditam que, mesmo com dificuldades, Tarcísio teria condições de aprovar a proposta. Por isso, partidos como o próprio PT e o PSOL devem buscar vias judiciais para barrar a venda da empresa.

Uma das discussões diz respeito ao modelo da proposta: Tarcísio vai enviar um Projeto de Lei (PL), mas a oposição argumenta que a desestatização deveria vir em formato de Proposta de Emenda à Constituição (PEC). A diferença prática se dá no número de votos necessários para aprovação. A primeira necessita de 48 deputados favoráveis (a chamada “maioria absoluta”). Já a segunda, 57 (“maioria qualificada” ou três quintos do parlamento).

O deputado Carlos Giannazi, do PSOL, protocolou nesta terça-feira uma PEC que obriga a Assembleia Legislativa a convocar um plebiscito durante a tramitação de propostas que tratam das modalidades de privatização, extinção ou alienação de ações que garantam o controle majoritário pelo estado.

"Ao incluir a previsão de plebiscito, transfere-se à população paulista o direito de manifestação e opinião sobre o destino do patrimônio público. Afinal, a participação popular é um princípio fundamental do Estado, através do qual há manifestação direta dos cidadãos em decisões cruciais para presente e para o futuro de São Paulo — e não as deixa apenas nas mãos dos agentes políticos", diz a proposta protocolada por Giannazi.

Outra estratégia, que já está em concurso, será fazer pressão popular contra Tarcísio, trazendo à tona possíveis desvantagens que a venda da empresa pode acarretar para a população.

Parlamentares têm divulgado, por exemplo, que a própria oposição foi quem instaurou uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar possíveis irregularidades e práticas abusivas cometidas pela Enel, segunda empresa com mais queixas registradas no Procon-SP. A companhia ocupou o primeiro lugar em 2021 e 2020.

— Nós vamos trabalhar basicamente na frente jurídica, política (de convencimento dentro da assembleia) e de mobilização. O primeiro questionamento será exatamente esse: por que não se trata de uma PEC, já que a constituição do estado coloca que a titularidade do saneamento tem que ser exercida por empresa pública. Ou seja, só uma alteração na constituição permitiria essa mudança — disse o deputado Emídio de Souza, do PT.

Protestos contra privatizações

O plano do governador paulista de privatizar a companhia de saneamento básico e fazer a concessão de linhas metroferroviárias motivou uma greve de funcionários do metrô, da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) e da Sabesp no início do mês. A paralisação de nove linhas metroferroviárias foi usada por Tarcísio para justificar a necessidade de estudos para as desestatizações, dado que apenas as linhas privatizadas do Metrô e da CPTM mantiveram o funcionamento naquele dia.

— Dizem que são contra as privatizações. Mas quais são as linhas que estão funcionando hoje? Aquelas concedidas à iniciativa privada. Isso mostra que estamos na direção certa, que temos, sim, que estudar (as privatizações) — declarou o governador em coletiva de imprensa no dia da greve.

Representantes das três categorias cobraram de Tarcísio um plebiscito para consultar a população sobre a desestatização da Sabesp e o avanço das concessões de linhas do metrô e trem. O argumento das entidades era de que a entrega para a iniciativa privada significa um “desmonte dos serviços públicos”.

Tarcísio, por outro lado, sustentou que a privatização foi decidida nas urnas, com a sua vitória. Embora seja, de fato, uma promessa de campanha, a venda da Sabesp é rejeitada pela maioria (53%) dos paulistas, como mostrou pesquisa Datafolha realizada entre os dias 3 e 5 de abril de 2023. Somam 40% os que são favoráveis.

Webstories
Mais recente Próxima Super-ricos: Câmara adia novamente votação de taxação de fundos exclusivos e offshore
Mais do Globo

Herança dos povos que habitavam a costa do Brasil na época do descobrimento, peça deve ser exposta ao público pelo Museu Nacional em agosto

Ancião sagrado: manto Tupinambá, que foi devolvido ao Brasil pela Dinamarca, 'pediu' para ser trazido de volta; entenda

Três dos 66 passageiros dos dois veículos conseguiram escapar antes que eles caíssem no rio Trishuli

Mais de 60 estão desaparecidos após deslizamento de terra arrastar ônibus no Nepal; vídeos

Armas são invisíveis e silenciosas; relação entre países está cada vez mais tensa

Coreia do Sul vai usar lasers 'Star Wars' contra drones norte-coreanos

Homem e mulher são acusados de tentar enviar informações sigilosas para Moscou; eles podem enfrentar até 15 anos de prisão

Casal acusado de espionar para a Rússia é detido na Austrália

Time ficará uma rodada sem jogar e pode aproveitar período para se adaptar melhor às ideias de Mano Menezes

Criciúma x Fluminense: Intensidade na reta final aponta caminho para reação no campeonato; leia análise

Pesquisador da Universidade de Yale publicou vários livros comentando seus avanços e descobertas ao longo desses anos

Médico que ficou oito anos sem tomar banho revela efeitos no corpo; entenda

O incidente ocorreu nos Alpes italianos; a vítima, de 41 anos, estava de férias com sua família

Mulher cai 150 metros e morre após roupa prender em teleférico, na Itália

Meia alvinegro deixou o gramado logo após sentir a coxa em cobrança de penalidade

Eduardo, do Botafogo, não foi o primeiro: relembre outros jogadores que se lesionaram no momento do pênalti

Vencedores de concorrência digital de quase R$ 200 milhões na pasta eram conhecidos antecipadamente

Licitação da Secom faz reviver espectro da corrupção nas gestões petistas

As prisões são incomuns, mas não inexistentes

Presos por racismo