Economia
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Diante da perspectiva de impacto das enchentes do Rio Grande do Sul no preço dos alimentos e na inflação, o governo anunciou ontem que editará uma medida provisória para viabilizar a importação de até 1 milhão de toneladas de arroz para suprir as perdas provocadas pelas inundações.

O estado responde por 70% da produção nacional e, embora haja estimativas divergentes, as perdas são calculadas em 10% a 17% da safra, considerando o que não foi colhido e o que está armazenado. Segundo o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, o objetivo é evitar que haja especulação sobre o preço do produto, com aumento para o consumidor. A compra deverá ser feita pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).

— O Rio Grande do Sul detém 70% da produção de arroz do Brasil. Tivemos perdas de arroz que estava nos armazéns alagados. Além disso, a grande dificuldade é a logística, tirar o arroz do Rio Grande do Sul e levar para o centro de distribuição. Está sendo preparada MP (medida provisória) autorizando a Conab a fazer compras na ordem de 1 milhão de toneladas — disse Fávaro, após reunião sobre a tragédia, no Palácio do Planalto.

IPCA: efeito de até 0,2 ponto

Economistas estimam que o impacto no IPCA, o índice oficial de inflação, pode ser de 0,1 a 0,2 ponto percentual no ano, em razão do efeito de alta nos alimentos provocado pelas enchentes no estado.

A previsão neste ano era de uma safra de 7,4 milhões de toneladas de arroz, mas o cálculo foi feito antes das chuvas. O mercado brasileiro de arroz é relativamente ajustado, e a produção nacional se aproxima do consumo doméstico, que, anualmente, é de cerca de 10 milhões de toneladas.

Para reabastecer estoques em períodos de chuva excessiva ou de secas, que afetam o plantio, o Brasil importa cerca de 1 milhão de toneladas por ano, a maior parte do Paraguai, que entra por terra pelo Mato Grosso do Sul. Por isso, a tendência é que a maior parte da importação seja do país vizinho.

O ministro frisou que o produto importado não será vendido a atacadistas para não prejudicar agricultores. O arroz será direcionado a mercados de bairros periféricos das grandes cidades:

— Não é para concorrer, não vai comprar arroz e vender para os atacadistas. É para evitar desabastecimento.

Inicialmente, serão importadas 200 mil toneladas de arroz descascado e empacotado.

— Se formos rápidos na importação, evitamos o aumento (de preços) — disse Fávaro.

Enchentes no Rio Grande do Sul:

  • O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), declarou estado de calamidade pública devido aos municípios impactados pelo temporal no estado.
  • Após estabilidade nos últimos boletins, número de mortos por enchentes no Rio Grande do Sul volta a subir na manhã desta quinta-feira, chegando a 151, de acordo com o último balanço divulgado pela Defesa Civil do estado. 
  • O registro de desaparecidos, por outro lado, recuou para 104 nesta manhã, números que não sofreram alterações no balanço seguinte, divulgado às 12h.
  • Moradores de Caxias do Sul, na serra gaúcha, sentiram tremores de terra na madrugada desta segunda-feira (13).

O presidente da Conab, Edegar Pretto, afirmou que a empresa fará leilões de compra de arroz nos países do Mercosul. Além da importação de arroz, o Ministério da Agricultura recomendou que sejam suspensos, por 90 dias, pagamentos de empréstimos de produtores agrícolas do estado. O pleito foi apresentado pela federação de agricultura do RS.

Lula: 'A gente vai ter que importar'

Antes do anúncio, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já havia defendido, em entrevista a rádios, a importação do produto:

— Agora com a chuva, acho que nós atrasamos de vez a colheita (do arroz) do Rio Grande do Sul. Se for o caso, para equilibrar a produção, a gente vai ter que importar arroz, a gente vai ter que importar feijão, para que a gente coloque na mesa do povo brasileiro um preço compatível com aquilo que ele ganha.

Na mesma entrevista, sem citar diretamente Jair Bolsonaro, Lula lembrou dos temporais que atingiram a Bahia em 2022, quando 25 pessoas morreram. Bolsonaro não visitou a região. Lula disse que “o presidente da República estava passeando de jet ski em Fernando de Noronha e não se preocupou.”

A consultoria DataAgro estima perdas de 10% a 11% na produção de arroz do estado. Mas outras culturas devem ser afetadas. A empresa prevê perdas de 3% a 6% na soja e de 2% a 4% no milho.

Impacto em soja e ração

Segundo Gedeão Silveira Pereira, presidente da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), além da suspensão de dívidas de produtores rurais, o setor pede que o governo crie linhas de crédito com o Tesouro como garantidor e juros mais baixos. Segundo ele, o efeito na soja preocupa. O estado é o segundo maior produtor do país.

— O Rio Grande do Sul inteiro tem soja hoje, e não é só uma questão para as áreas alagadas. Nossa preocupação é que, se seguir chovendo, a produção de soja começa a se deteriorar, ela perde qualidade — disse.

No norte do estado, que concentra a produção de animais, a preocupação é logística, segundo ele. O bloqueio de estradas e queda de pontes afeta o escoamento da produção de leite e o envio de animais para o abate, mas também a chegada de ração para os animais, explica Pereira:

— Preocupa-me como será a recomposição da logística porque nós estamos parados. O Estado parou. O porto parou. E estamos sem combustível.

A Cogo Inteligência em Agronegócio estima que 30% da safra de soja ainda não foram colhidos. No caso do arroz, a previsão é que essa proporção seja de 22%.

Cálculos da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) indicam que dez unidades produtoras de carne de aves e de suínos estão paradas ou com dificuldade de operar. O estado responde por 11% da produção de carne de frango e 19,8% da de suínos. Além da produção de animais em si, há dificuldades para adquirir ração para alimentá-los.

Banco aponta impacto inflacionário

Em relatório, o Goldman Sachs afirma que o arroz é uma cultura importante para a cesta básica do brasileiro e que o mercado já começou a revisar para cima as previsões de inflação doméstica de alimentos. O banco destaca que o estado é responsável por 7% das vendas no varejo e cerca de 6% das vendas do comércio eletrônico no país.

O estado, lembram os analistas, responde por 17% do total de abate nacional de suínos; 13% de frango; e 5% de bovinos. A inflação alimentar deverá aumentar, especialmente para produtos perecíveis, afirma o banco.

"A inundação de áreas plantadas, bem como interrupções no transporte de grãos, outras commodities e produtos perecíveis podem impactar rendimentos e o equilíbrio entre oferta e procura, provocando pressões inflacionistas", afirmam no relatório. "O arroz é uma importante cultura para o RS e para a cesta básica das famílias brasileiras. O mercado já começou a revisar para cima as previsões de inflação doméstica de alimentos".

Reflexo nos preços até julho

Tatiana Pinheiro, economista-chefe de Brasil da Galapagos Capital, diz que o peso do arroz não é tão grande no índice de inflação, mas a soja afeta outros produtos:

— O peso do arroz não é tão alto no IPCA. Já o peso da soja aparece no bife, no peito de frango, no preço do ovo e do leite, justamente por causa da ração, além do próprio óleo de soja. O que a gente calcula é um impacto entre 0,1% e 0,2% adicionado ao IPCA.

Segundo Fábio Romão, da LCA Consultores, os primeiros sinais de impacto vão aparecer no preço do arroz, entre os meses de maio e julho. No segundo momento, devem chegar ao óleo de soja e a algumas proteínas.

'Canais de comercialização estão impedidos'

O professor do FGV Agro Felippe Serigati afirma que a intensidade do impacto das enchentes do Rio Grande do Sul no setor agro ainda não pode ser mensurada, o que deve acontecer apenas quando os níveis de água baixarem.

— E temos que levar em conta não apenas a perda dos produtos, mas também as perdas decorrentes da obstrução dos canais logísticos. Alguns produtos não foram impactados pelas chuvas, mas os canais de comercialização estão impedidos — diz o pesquisador.

Serigati avalia que as maiores perdas devem se acometer a cadeia de arroz porque o estado responde por uma parte majoritária da produção brasileira. A Datagro, empresa de inteligência do setor, fez um levantamento estimando o impacto financeiro para a cadeia de alguns produtos relevantes na economia do Rio Grande do Sul.

Foram plantados 900 mil hectares de arroz no estado nas safras de 2023 e 2024, com rendimento estimado de 7,5 milhões de toneladas. Os dados foram levantados junto às principais entidades representativas do segmento arrozeiro — o Instituto Riograndense do Arroz (IRGA), a Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul (Federarroz) e o Sindarroz, sindicato da indústria no estado.

Aproximadamente 83% da área plantada — ou 6,3 milhões de toneladas — já havia sido colhida até esta semana. Dos 150 mil hectares restantes, onde 1,2 milhão de tonelada de arroz foram plantados, 45 mil hectares estão em lugares afetados pelas enchentes.

“Considerando que o arroz de terras baixas é uma cultura acostumada com umidade, que consegue ficar embaixo da água por até 7 dias, a avaliação preliminar é que as perdas podem girar em torno de 50% da produção potencial restante, ou de 600 a 700 mil toneladas”, diz o documento.

Ainda não foram avaliadas as perdas no volume armazenado em estoques inundados. A estimativa é que a safra será entre 10% e 11% menor, levando a uma redução de 6,7 milhões a 6,8 milhões de toneladas de arroz e perdas financeiras de R$ 68 milhões.

Fatia importante do PIB brasileiro

Os 22% restantes representam cerca de 200 mil hectares e 1,6 milhão de toneladas. Esse volume em risco representa 16% da safra estimada para o país (10,5 milhões de toneladas).

A produção agrícola é a face mais visível de um impacto econômico que os analistas ainda tentam mensurar, face ao desastre no estado. O Produto Interno Bruto (PIB) do Rio Grande do Sul representa fatia de 6% a 7% do PIB nacional. Além do impacto no preço dos alimentos e na inflação, as restrições logísticas e de circulação devem ter efeito no varejo, na indústria e nos serviços.

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