O European Union Deforestation Act (EUDR), que vai barrar produtos importados originados de áreas que foram desmatadas a partir de 2020, é uma das mais de 50 regras que fazem parte do Green Deal, projeto aprovado pelo Parlamento Europeu em 2019 e que tem por objetivo atingir as metas do Acordo de Paris.
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Pelo acordo, a União Europeia tem a meta de reduzir as emissões de CO2 em 55% em relação aos níveis de 1990 até 2030 e alcançar a neutralidade de carbono até 2050. Exigir que importadores não comprem produtos de áreas desmatadas é uma forma de evitar a degradação florestal e, assim, novas emissões de CO2 em queimadas.
O EUDR vai valer a partir de 1º de janeiro de 2025. Para que seja implementado, os exportadores terão de rastrear seus produtos para provar a quem os compra que eles não tem qualquer parte vinda de áreas desmatadas, ilegal ou legalmente.
O primeiro efeito que a lei terá será sobre o preço, avaliam os setores afetados no Brasil. Para adotar um moderno sistema de rastreabilidade, muitas empresas e produtores verão seus custos se elevarem.
Desmatamento na Amazônia
A lei abarca sete categorias de produtos, que representam 30% do total exportado pelo Brasil para a UE.
A Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) defende o questionamento da legalidade da medida. A entidade afirma estar preocupada com um possível impacto negativo da legislação para a imagem do agro brasileiro e nas vendas para outros mercados.
— O mercado brasileiro está preocupado com a lei, porque pode fechar portas para os produtos do agro — disse Sueme Mori, diretora de Relações Internacionais da CNA.
Veja abaixo como esses setores serão afetados e como estão se preparando para a nova legislação:
Papel e celulose
O Brasil é o maior exportador mundial de celulose, e cerca de 22% são exportados para a UE. De acordo com a Indústria Brasileia de Árvores, 100% do volume exportado têm certificação de que não houve desmatamento desde 1994, ano usado como parâmetro pela certificadora internacional. A rastreabilidade, portanto, não é um gargalo, na visão das empresas.
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Da mesma forma que a UE é um importante mercado para a indústria de papel e celulose brasileira, alguns países europeus têm elevado nível de dependência do fornecimento da matéria-prima brasileira. Caso da Itália, que usa a celulose importada do Brasil para a produção local de itens como guardanapo, papel toalha e papel higiênico.
Segundo José Carlos Fonseca Jr., diretor de Relações Governamentais da Ibá e presidente da Associação Brasileira de Embalagens em Papel (Empapel), não há fornecedor no mundo que possa substituir o Brasil no caso italiano. Seria uma disrupção na cadeia produtiva, diz.
Madeira
Paulo Pupo , superintendente da Associação Brasileira da Indústria de Madeira Processada Mecanicamente (Abimci), disse que o Brasil é um importante player no suprimento mundial de madeira e exporta para todos os continentes em vários segmentos de produtos madeireiros como, por exemplo, compensados, madeira serrada, molduras, pisos, portas, entre outros.
Há décadas esse cenário não é diferente com o mercado europeu, um dos destinos mais constantes de nossas exportações.
— O setor atende de forma plena e constante o cumprimento das exigências atuais de mercado, tanto nas que se referem à origem legal de nossos produtos, quanto naquelas relacionadas aos requisitos técnicos e de desempenho dos produtos. Porém, as condições impostas são particularmente desafiadoras e de difícil atendimento dentro do prazo estabelecido pela Comissão Europeia — afirmou.
Carne
Diretor de Sustentabilidade da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), Fernando Sampaio disse que a entidade tem um parecer que mostra que a legislação viola princípios da OMC. Por isso, o setor entende que o governo brasileiro deve continuar contestando a medida.
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— Já fazemos controle de desmatamento, na Amazônia principalmente, desde 2009. Não é uma dificuldade atender a legislação europeia, mas pedimos uma transição entre a rastreabilidade [o bovino é acompanhado desde o nascimento até a chegada à mesa do consumidor] parcial e total — afirmou.
Café
O café é um dos setores mais expostos à nova lei da UE. Do total exportado pelo Brasil entre janeiro e abril deste ano, 48% foram para o bloco, considerando o café em grão e o solúvel, de acordo com Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé).
A plantação de café é feita em sua maioria em áreas de antigas pastagens – que não foram desmatadas recentemente – ou se trata de vegetação nativa. A dificuldade está em provar que o produto não vem do desmatamento, já que quase 80% dos 265 mil produtores são da agricultura familiar.
Por isso, o Cecafé criou, em parceria com a Serasa Experian, a plataforma Cafés do Brasil, em fase de testes. Nela, há dados de sensoreamento remoto, geolocalização dos produtores, lista suja de trabalho escravo, entre outros. Já estão na plataforma produtores que representa 94% das exportações para a UE.
Cacau
Dos segmentos abarcados pela legislação é o que menos será afetado. Hoje, o Brasil praticamente não exporta amêndoas de cacau, e os embarques de derivados têm como destino principalmente a América do Sul, EUA e Canadá.
O setor não tem um sistema de rastreabilidade unificado, e os produtores reconhecem que isso será um desafio quando voltarem a exportar com força, pois mais de 70% dos agricultores são de pequeno porte, segundo Guilherme Moura, diretor da Federação de Agricultura da Bahia, um dos principais estados produtores.
O Brasil já chegou a ser o segundo maior exportador do mundo de sementes de cacau, mas se tornou importador nos anos 1990.
Borracha
Diogo Esperante, diretor executivo da Associação Paulista de Produtores e Beneficiadores de Borracha, disse que, em princípio, o regulamento não afeta os produtores brasileiros diretamente. Isto porque o setor não é exportador.
—Toda a produção nacional é consumida aqui. Contudo, devido ao fato de as empresas consumidoras de borracha no Brasil serem, em sua maioria, multinacionais, elas já estão aplicando os padrões exigidos pela legislação aqui no país. Isso não está sendo visto como um problema, pois todos os seringais já possuem geolocalização referenciada — disse Esperante, destacando que as atividades não estão em mata nativa.