Mesmo com o aumento de receitas de 9% acima da inflação, as contas do governo federal fecharam o primeiro semestre deste ano com um rombo de R$ 68,69 bilhões, uma alta de 55% frente ao mesmo período do ano passado, quando o déficit fora de R$ 43,23 bilhões. Os dados foram divulgados ontem pelo Tesouro Nacional.
Este é o terceiro pior resultado da série histórica do Tesouro Nacional, iniciada em 1997. Além disso, é o pior número desde 2020, no auge da pandemia de Covid-19 quando a economia recuou 3,3%.
A diretora da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, Vilma Pinto, diz que, diante dos resultados divulgados, o governo dificilmente conseguirá alcançar a meta estipulada no arcabouço fiscal ao fim do ano. Na visão dela, o governo terá de anunciar novas medidas de congelamento do Orçamento nos próximos bimestres:
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— O contingenciamento anunciado ainda não foi tão severo. De acordo com os cenários que vêm sendo previstos e os números da IFI, eu acredito que talvez seja necessário fazer contingenciamentos em pequenas doses nos próximos bimestres para tentar alcançar o centro da meta.
Para o economista da Austin Ratings, Alex Agostini, o déficit ficou dentro do estimado, mas a preocupação é o resultado no fim do ano:
— Para atingir R$ 28,8 bilhões de déficit, o ideal era o governo contingenciar R$ 62 bilhões até o fim do ano. Como ele já fez R$ 15 bilhões, então tem que contingenciar até R$ 46 bilhões. O problema é que a despesa está crescendo muito mais do que as receitas. O governo precisa apresentar um plano crível de redução de despesas.
A economista Juliana Inhasz, professora do Insper, por sua vez, considera “impossível” o governo alcançar a meta estabelecida. Segundo ela, isso acontece em função de medidas como a valorização do salário mínimo, que pressionou benefícios do governo.
— Ficar fora de uma regra que o governo mesmo estabeleceu mostra um baixíssimo comprometimento com esse princípio de equilíbrio fiscal, que é fundamental para conseguir colocar o Brasil no eixo — afirma a especialista.
Haddad evita avaliar déficit
No Rio, ao deixar a entrevista coletiva de encerramento do encontro de ministros de Finanças do G20, o titular da Fazenda, Fernando Haddad, evitou avaliar se o déficit verificado nas contas do governo no primeiro semestre tornará necessários novos congelamentos no Orçamento deste ano, para cumprir a meta do arcabouço fiscal.
Segundo Haddad, a decisão sobre eventuais novos congelamentos será feita a cada avaliação bimestral das contas públicas:
— A cada bimestre vamos divulgar, como está previsto na lei. A cada bimestre, se houver necessidade, contingencia ou bloqueia.
Apesar de as receitas líquidas do governo (ou seja, após as transferências para estados e municípios) terem subido 8,5% acima da inflação, as despesas cresceram mais. Os gastos do governo federal foram 10,5% maiores neste ano do que em 2023, isso já descontando a inflação do período.
O número mostra o desafio que será cumprir a meta de déficit zero em 2024. A última estimativa da equipe econômica prevê que este ano fechará com um rombo de R$ 28,8 bilhões nas contas públicas federais, no limite do permitido pela regra do arcabouço fiscal (de um déficit de até 0,25% do PIB, ou R$ 28,8 bilhões).
Expansão do Bolsa Família
Para manter o saldo negativo nesse valor, o governo já determinou o congelamento de R$ 15 bilhões do Orçamento deste ano.
— Estamos em um processo de recuperação fiscal. O país vem vivendo déficit nos últimos anos. Estamos propondo virar esse transatlântico. Este ano estamos mirando aproximar-nos o máximo possível do déficit zero. Ao longo do ano, esse déficit vai convergir para mais próximo de zero. Considero crível ficar na meta, há desafios, mas considero possível — disse o secretário do Tesouro, Rogério Ceron.
Entre as principais despesas que aumentaram nos últimos seis meses estão os benefícios previdenciários (alta de R$ 40 bilhões), Benefício de Prestação Continuada (BPC), com aumento de R$ 8 bilhões, créditos extraordinários (mais R$ 7,5 bilhões), sentenças judiciais e precatórios (mais de R$ 12,9 bilhões) e despesas do Poder Executivo, como o Programa de Aceleração de Crescimento (PAC), com alta de R$ 30,2 bilhões.
Ceron disse que a regularização da fila do INSS acumulou um número maior do que o previsto de beneficiários, o que fez os gastos subirem.
— O crescimento do BPC chama atenção, não há uma motivação evidente. Por isso, estamos com uma série de medidas — afirmou.
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Entre as medidas para economizar recursos, está a revisão de benefícios sociais e o aperto de regras de concessão desses benefícios .
O Tesouro explicou ainda que já esperava um crescimento do déficit no primeiro semestre de 2024, pelo reajuste dos servidores e expansão do Bolsa Família. Agora, espera-se uma expansão fiscal menor no segundo semestre. *Colaborou Vinícius Neder