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Economia Energia

'O maior risco é de apagão em 2021, não de racionamento', diz presidente de consultoria do setor elétrico

Luiz Augusto Barroso, da PSR, diz que Brasil já tem a segunda maior tarifa residencial de energia do mundo e que conta de luz ficará ainda mais cara
Luiz Augusto Barroso, presidente da consultoria PSR, a maior do setor elétrico, e ex-presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) Foto: Leo Pinheiro/Valor / Agência O Globo
Luiz Augusto Barroso, presidente da consultoria PSR, a maior do setor elétrico, e ex-presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) Foto: Leo Pinheiro/Valor / Agência O Globo

BRASÍLIA - Luiz Augusto Barroso, presidente da consultoria PSR, a maior do setor elétrico, e ex-presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), avalia que há risco de desligamentos no sistema elétrico, os apagões, por causa da crise hídrica , mas afirma que há recursos aos quais o governo pode recorrer para evitar esse cenário.

Como avalia a segurança do suprimento de energia no país? Há risco de apagão?

Em 2021, o maior risco é de apagão, e não de racionamento. Estamos com reservatórios baixos no Sudeste, a região que concentra 70% da oferta de energia do país. A situação não é confortável e, portanto, existe sim um risco de apagão. No entanto, é importante observar que “risco” indica que um evento pode ocorrer, e não que vai necessariamente acontecer.

Temos vários recursos que contribuem para a segurança de suprimento, tais como reservatórios mais confortáveis nas outras regiões e um perfil de oferta de energia diferente dos outros anos de crise hídrica, com maior participação térmica e renováveis e maior capacidade do sistema de transmissão. Há ações adicionais de gestão por parte do governo que podem ser decisivas para assegurar que o “pode” não se transforme em “vai”.

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Na sua avaliação, o que o governo precisa fazer para garantir a segurança no fornecimento de energia?

Pelo lado da oferta, ações fundamentais são a gestão dos usos múltiplos da água; garantir a disponibilidade dos geradores e de combustível para as térmicas, adiando manutenções; importar energia de países vizinhos; e buscar flexibilidades no sistema. Ainda é possível buscar alguma nova oferta a curto prazo.

Pelo lado da demanda, é importante criar sinais de preço para redução voluntária de consumo. Acho que o governo está fazendo o dever de casa e tomando as medidas corretas. Agora é verificar se tudo anda bem nos próximos 45 dias. Finalmente, a comunicação realista com a população sobre a situação e evolução do quadro é tão fundamental quanto as ações no lado da oferta e demanda.

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A tendência é que a conta de luz fique muito mais cara?

Dependendo da interação entre estas medidas e outros fatores que compõem a tarifa, a conta de luz pode ficar cara ou muito mais cara. O Brasil já está em segundo lugar no ranking das tarifas residenciais mais caras do mundo (atrás da Alemanha) e isso afeta o bolso da população. Este quadro não muda da noite para o dia. Chegamos aqui por uma série de erros do passado, e estamos aos poucos melhorando.

O consumo de energia voltou ao nível pré-Covid. O Brasil dá conta?

Se fizermos o dever de casa e a falta de chuva não piorar, temos chances. Caso contrário, não.

Alguma medida é mais prioritária?

Em nossa opinião, seria a gestão dos usos múltiplos da água. Como as vazões afluentes são muito menores do que as obrigações de defluência mínima determinadas pelos usos múltiplos, os reservatórios estão esvaziando rapidamente. Com isso podemos começar a armazenar água onde interessa, o que será fundamental para garantir o atendimento de ponta no final do segundo semestre. Se nada mudar e não chover, os reservatórios esvaziarão muito e podemos ter problemas.

O país precisa de mais usinas termelétricas?

O país precisa de um ecossistema de fontes, onde cada uma agrega um valor, ou atributo, diferente e complementar.

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O sistema elétrico brasileiro está adaptado para eventos climáticos extremos como o de 2021?

Estamos nos adaptando, tal como muitos outros países. e isso não se faz da noite para o dia. A seca atual é pior que a prevista pelo planejamento. E a crise atual vai alterar estes critérios. A palavra-chave para assegurar resiliência é a diversificação da matriz energética.

Isso significa mais custos?

Sim, pode (significar). Maiores níveis de confiabilidade podem significar maiores custos. É por isso que dar um sinal econômico para a demanda responder é fundamental. Pode ter um preço a partir do qual vale a pena não consumir.