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Economia

Risco de racionamento: proposta de restringir água para agricultura desagrada setor e pode elevar preços

Bancada ruralista afirma que agronegócio não pode pagar pela falta de planejamento do governo
Setor agrícola diz que medida para evitar racionamento de energia pode afetar preços Foto: Domingos Peixoto / Agência O Globo
Setor agrícola diz que medida para evitar racionamento de energia pode afetar preços Foto: Domingos Peixoto / Agência O Globo

SÃO PAULO E BRASÍLIA - A perspectiva de restringir o uso de água para irrigação preocupa o setor agrícola e desagradou à bancada ruralista. A proposta seria uma forma de garantir água suficiente para gerar energia durante o período seco no segundo semestre.

Para representantes do setor, porém, a iniciativa vai afetar produtos como milho e, por consequência, a ração animal e as carnes. A medida teria impacto nos preços, pressionando ainda mais a inflação. Parlamentares ligados ao agronegócio dizem que o setor não pode pagar pela falta de planejamento do governo.

Roberto Rodrigues: 'Se a seca durar até setembro, governo terá que tomar decisões difíceis', diz ex-ministro da Agricultura

— Propriedades que demandam água de reservatórios vão sofrer por causa dessa escassez, e o impacto nas lavouras será sentido — disse o deputado Beto Pereira (PSDB-MS).

O ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues afirma que a escassez levará o governo a tomar decisões que podem afetar diretamente a economia :

— O governo terá que tomar decisões difíceis se a seca se prolongar até setembro ou outubro. A falta de água para irrigação poderá promover escassez de alimentos, sobretudo os hortifrutigranjeiros, e isso teria efeito no aumento da inflação. Mas se faltar energia, o crescimento econômico será duramente afetado. Em outras palavras, a decisão a ser tomada deverá considerar o menor efeito negativo para a sociedade toda.

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José Carlos O’Farrill Vannini Hausknecht, sócio da MB Agro Consultoria, ressalta que ainda faltam detalhes do alcance da medida e de sua implementação, mas avalia que ela tem potencial para pesar no bolso do brasileiro:

— Uma restrição pode afetar a safra de milho, o que impacta o setor de etanol e de rações, com reflexos nos preços de aves e suínos. A redução na irrigação pode também ser sentida no feijão, que é a terceira safra de muitos locais nesta época do ano, e no trigo, em especial no Paraná.

Tarso Veloso, gerente da AgResource, em Chicago (EUA), lembra que a restrição ocorreria em um período no qual o solo das principais regiões já está criticamente seco.

— Este é mais um fator que se soma a um potencial grande de quebra de safra por fatores climáticos e em um momento de forte demanda— disse ele.

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O impacto previsto com a restrição das hidrovias tende a ser menor, segundo especialistas. As hidrovias do Norte, como Tapajós e Madeira, não devem ser afetadas. E o impacto tende a ser mais concentrado na hidrovia Tietê-Paraná, que no ano passado movimentou 2,1 milhões de toneladas de cargas, uma queda em relação aos 2,5 milhões de toneladas de 2019.

Os principais produtos que usaram hidrovia foram soja, milho e cana-de-açúcar.

Jeronimo Goergen (PP-RS) disse que o Brasil não pode apenas depender do agronegócio sem planejamento:

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— Não dá para lembrar de fazer açudes e barragens quando vem a seca. Quando chove e a safra é boa, todos esquecem de fazer planejamento.

Segundo vice-presidente da Comissão de Agricultura da Câmara, José Marioi Schreiner (DEM-GO) disse que a possibilidade de restrição da navegação em hidrovias e do uso de água para irrigação preocupa o setor.

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Ele defendeu o uso racional de fontes de energia, para evitar reflexos negativos na agricultura.

— O uso de energias renováveis evitaria sobressaltos, como a energia solar e o biogás. Tudo é uma questão de equilíbrio e racionalidade — disse o parlamentar.