Rogério Furquim Werneck
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Rogério Furquim Werneck
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Rogério Furquim Werneck


É difícil imaginar que possa faltar tino político a quem já foi eleito três vezes presidente da República. Mas a verdade é que se acumulam evidências de que Lula vem se permitindo preocupante dilapidação dos seus recursos políticos.

Grande parte das dificuldades remonta à resistência do presidente a reconhecer que só foi eleito graças à profunda aversão de parcela substancial do eleitorado de centro a Jair Bolsonaro. Já no primeiro turno ficara mais do que claro que os eleitores haviam escolhido um Congresso marcadamente de centro-direita.

Tudo isso apontava para a necessidade de um movimento inequívoco de Lula para o centro do espectro político, no eixo que de fato importava, que era o da condução da política econômica.

Não foi o que ocorreu. Assombrado pelo passado, Lula viu seu novo mandato como uma oportunidade para insistir em políticas caras ao PT, certo de que isso redimiria o partido das pechas que lhe foram assacadas na esteira do desastre do terceiro governo petista.

Tendo resistido à ideia de montar um governo efetivo de coalizão, o Planalto limitou-se a ceder ministérios avulsos ao Centrão, sem sequer disfarçar que tal cessão tinha como único propósito angariar algum apoio das bancadas agraciadas no Congresso, por precário que fosse.

Como o Centrão não é propriamente um baluarte da responsabilidade fiscal, o Planalto não teve dificuldade para extrair do Congresso a revogação do teto de gastos e amplo espaço para expansão de dispêndio público. Uma licença para gastar que deverá redundar em um salto de pelo menos 10 pontos percentuais na dívida bruta do governo como proporção do PIB, ao longo do atual mandato presidencial.

Mas o governo já se deu conta de que nem mesmo as metas fiscais pífias que prometeu poderão ser cumpridas, tendo em vista o vigor de expansão de gastos que já desencadeou. E, claro, a voracidade com que os parlamentares vêm tentando defender a parte que entendem que lhes toca no festim da gastança.

Como já mostram os recentes revezes do Planalto no Congresso, o apoio parlamentar do governo parece fadado a se tornar ainda mais imprevisível, com o acirramento das disputas nas eleições municipais.

Em meio a tamanha incerteza de natureza fiscal e política, o governo teria de fazer o possível para assegurar um clima minimamente propício à recuperação do investimento privado, para tentar preservar, em alguma medida, o dinamismo da economia observado em 2023.

Não é o que se tem visto. Entregue ao negacionismo, o governo desencadeou agora mais um esforço de reconstrução da história, no seu incansável empenho em vender ao país a ideia de que o calamitoso governo Dilma Rousseff não passou de narrativa injusta, sem aderência aos fatos.

Em discurso proferido em Pernambuco, na Refinaria Abreu e Lima — memorial icônico da malversação de recursos dos governos petistas — o presidente permitiu-se arguir que “a história ainda vai ser contada”. E que “tudo que aconteceu neste país foi uma mancomunação entre... juízes... e... procuradores..., subordinados ao Departamento de Justiça dos Estados Unidos, que nunca aceitaram o Brasil ter uma empresa como a Petrobras” (GLOBO, 19/1).

Em paralelo, para espanto do país, o governo tentou interferir na Vale —empresa privatizada há quase 30 anos — com o intuito de alçar ninguém menos que Guido Mantega à presidência da empresa. Seria um gesto de reabilitação do ministro da Fazenda de Dilma Rousseff e de reconhecimento da gratidão a ele devida. Afinal, a investida acabou sendo abortada. Mas ainda se teme que o governo encontre formas de impedir a escolha de um CEO que não seja de seu agrado (Valor, 29/1).

Num momento em que boa parte das oportunidades de investimento privado no país está relacionada a projetos de infraestrutura — sabidamente expostos a alto risco de natureza regulatória e dependentes de um ambiente de estrito respeito às regras do jogo, sem históricos de arbitrariedades —, o episódio não poderia ter sido mais danoso.

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