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Metaverso: Entenda por que alta velocidade e estabilidade do 5G são decisivas para a internet 3.0

‘Big techs’ e fundos globais investem pesado no desenvolvimento de tecnologias para criar o que seria uma nova dimensão da internet, mas nada disso seria viável sem a nova geração de telefonia móvel
Visitante da última edição do Mobile World Congress, em Barcelona, experimenta óculos de realidade virtual: investimentos em torno do metaverso somarão US$ 800 bi até 2024 Foto: Angel Garcia/Bloomberg
Visitante da última edição do Mobile World Congress, em Barcelona, experimenta óculos de realidade virtual: investimentos em torno do metaverso somarão US$ 800 bi até 2024 Foto: Angel Garcia/Bloomberg

RIO —  O investidor de risco Matthew Ball definiu o potencial do metaverso — um ambiente que mescla o mundo físico e virtual no qual boa parte da população mundial poderá socializar em poucos anos, como prevê o cofundador da Microsoft Bill Gates — como uma espécie de sucessor da internet móvel.

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Executivos do Facebook, incluindo o CEO Mark Zuckerberg, também definiram o metaverso como a nova fronteira da internet ao justificar a mudança do nome da empresa controladora da rede social para Meta.

Desde então, esse termo é onipresente quando o assunto é tecnologia, mas não foi à toa que se tornou a nova obsessão das big techs agora. O 5G é o ar que se respira nesse universo.

O termo metaverso vem de um conceito distópico de realidade virtual contido no livro de ficção científica cyberpunk “Snow Crash”, de 1992. Agora, promete uma espécie de realidade amplamente conectada — onde humanos podem interagir por meio de avatares —, que propõe experiências renderizadas em 3D em tempo real, do trabalho ao lazer.

— Podemos pensar no metaverso como a mais nova dimensão da rede. Temos a internet 1.0, que deu acesso à informação, a 2.0, que trouxe novas formas de interação a partir das redes sociais, e agora vemos o surgimento da 3.0, baseada na imersão e num mundo que replica a realidade através de dispositivos digitais — explica Janaina Costa, pesquisadora sênior em Direito e Tecnologia do Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS Rio).

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Ela ressalta a busca incessante por inovação no mundo da tecnologia:

— Todo mundo quer ser ou fazer parte do novo hype do momento. Mas há de se lembrar que o setor já vem há algum tempo investindo em dispositivos de realidade virtual e realidade aumentada.

Atração de investimentos

Big techs e grandes fundos de investimentos direcionam muito dinheiro ao aprimoramento de hardwares e softwares que comportem as tecnologias necessárias para fazer a ponte entre mundos virtual e real, sem falar nas redes 5G.

Segundo projeções da Bloomberg Intelligence Unit, os investimentos em torno do metaverso devem atingir US$ 800 bilhões (cerca de R$ 4,5 trilhões) até 2024. O SoftBank, um dos principais investidores globais em start-ups, aportou US$ 150 milhões na plataforma Zepeto, da Naver Z Corp.

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A Niantic, criadora do jogo Pokémon Go, acaba de captar US$ 300 milhões para desenvolver um “metaverso do mundo real”.

A Epic Games, desenvolvedora do Fortnite, saiu com US$ 1 bilhão de uma rodada de financiamento em abril para seu projeto de longo prazo do metaverso.

A indústria de games, aliás, está na frente, com sua aposta precoce em experiências imersivas. Plataformas como Roblox e Fornite já são espaços de interação, que movimentam uma economia virtual crescente.

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Promovem desde eventos culturais como exposições e shows interativos a parcerias com marcas para a venda de produtos que só existem na versão digital.

Jovem alimenta virtualmente elefantes por meio de realidade aumentada em demonstração de aplicações do 5G em congresso de telefonia móvel em Barcelona Foto: Angel Garcia/Bloomberg
Jovem alimenta virtualmente elefantes por meio de realidade aumentada em demonstração de aplicações do 5G em congresso de telefonia móvel em Barcelona Foto: Angel Garcia/Bloomberg

Um show do rapper Travis Scott no Fortnite totalizou 12 milhões de jogadores simultâneos acompanhando, um recorde. A grife italiana Gucci, que desenvolveu seu espaço no Roblox, vendeu uma carteira virtual em junho por US$ 4.115 (cerca de R$ 23 mil), bem mais que o preço da versão física numa loja: US$ 2.400.

Espaços de trabalho e terrenos virtuais para consumidores e empresas são frentes de negócios para as plataformas. O jogo The Sandbox movimentou US$ 86,5 milhões somente em novembro com vendas únicas de terrenos virtuais através de tokens criptográficos (NFTs).

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O metaverso deve revolucionar setores como arquitetura, engenharia, construção e manufatura. Gigantes fabricantes de chips como Qualcomm,Nvidia e Intel Corp têm desenvolvido soluções de comunicação de objetos conectados com servidores na nuvem para automatização e gerenciamento de processos de forma virtual.

Mais dados nas mãos das 'big techs'

Nada disso seria possível sem um ponto central: a infraestrutura de rede. Por isso, o 5G é apontado como decisivo para viabilizar o metaverso por conta da baixa latência e da alta velocidade na transferência de dados, cruciais para a estabilidade das interações e a automatização de processos:

— O 5G vai permitir uma gestão muito eficiente dos objetos conectados. Será excelente para permitir alta qualidade de serviços baseados em realidade virtual e aumentada — diz Luca Belli, coordenador do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV Direito Rio.

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O Bank of America incluiu o metaverso em sua lista com as 14 tecnologias que podem acelerar o impacto de megatendências e se mostrou convencido de que esse futuro está logo ali. “Até o fim da década, passaremos mais tempo no metaverso do que na vida real”, diz o documento da instituição.

Dispositivo vai mostrar se você chorou

No entando, Rafael Zanatta, diretor da Associação Data Privacy Brasil de Pesquisa, aponta riscos no desenvolvimento dessa nova camada do ciberespaço, como potencializar a coleta e análise de dados dos usuários pelas redes sociais para gerar anúncios e serviços personalizados:

— Quando você está nesse ambiente de imersividade, há dispositivos detectando todos os seus movimentos, emoções e reações. Isso abre uma agenda grande de preocupações sobre as coletas de dados que não são dados cadastrais como o CPF ou metadados dos dispositivos, mas dados inferidos sobre o próprio estado emocional das pessoas, obtidos por meio de dispositivos como pulseiras e óculos de projeção de realidade virtual, que podem detectar movimentos do corpo e dos olhos. Olhando até o nível de lágrimas ou secura de olhos, inferindo estados emocionais que podem ser utilizadas como dados para exploração econômica.

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Concentração das redes transposta

Soma-se a isso o risco de concentração do metaverso na mão de poucas empresas, potencializando o atual debate em torno das gigantes de tecnologia como Facebook e Google, diz Janaina Costa, do ITS Rio:

— Caso uma ou poucas big techs sejam as donas de um metaverso ou do metaverso principal, temos a discussão de governança desse espaço. Tudo isso em um contexto em que nem a questão da governança da internet (que temos hoje) está totalmente resolvida.

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Para o professor Silvio Meira, da Universidade Federal de Pernambuco, a tentativa da Meta, de Zuckerberg, de se autointitular detentor do metaverso serve de cortina de fumaça para a empresa em meio às acusações que vem sofrendo nos EUA como a de priorizar lucro em detrimento da moderação de conteúdo, o que a empresa nega.

— A tentativa do Facebook de dizer “eu sou o metaverso” muito provavelmente fracassará — diz Meira. — Não acredito que seja possível uma única empresa construir o metaverso. Isso vai ser feito por uma rede de negócios. Além disso, há outras maneiras de se construir o metaverso, de forma distribuída e descentralizada, com base em tecnologia blockchain.