Enquanto o secretário do Comércio dos EUA fazia uma viagem à China na semana passada, a Huawei, gigante de telecomunicações que enfrenta sanções comerciais dos EUA, lançou seu novo smartphone que ilustra o quão difícil tem sido para os Estados Unidos reprimir os avanços tecnológicas do país asiático.
O novo celular é alimentado por um chip que parece ser a versão mais avançada da tecnologia local da China até agora – uma espécie de conquista que os Estados Unidos têm tentado barrar.
O momento de seu lançamento pode não ter sido uma coincidência. O Departamento de Comércio tem liderado os esforços dos EUA para restringir a capacidade de Pequim de obter acesso a chips avançados. A secretária de Comércio, Gina Raimondo, passou grande parte de sua viagem defendendo as sanções dos EUA às autoridades chinesas, que a pressionaram para suavizar algumas das regras.
O papel poderoso de Raimondo – bem como a antipatia da China em relação às sanções dos EUA – se refletiu em sites de comércio eletrônico da China com mais de uma dúzia de vendedores comercializando capas para smartphones com o rosto de Raimondo. Imagens adulteradas mostravam a Secretária de Comércio segurando o novo telefone com frases como “Eu sou Raimondo, desta vez eu endosso a Huawei” e “Embaixador do celular Huawei, Raimondo”.
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A mídia chinesa se referiu ao novo smartphone da Huawei como um sinal da independência tecnológica do país, mas analistas dos EUA disseram que a conquista ainda dependia muito provavelmente do uso de tecnologia e maquinário norte-americanos, o que teria violado as restrições comerciais dos EUA.
Começando na administração de Donald Trump e continuando sob o presidente Joe Biden, os Estados Unidos vêm aumentando constantemente as restrições à venda de chips e componentes para a fabricação dos produtos no país asiático e em particular para a Huawei.
Nos últimos anos, essas restrições restringiram a capacidade da Huawei de produzir smartphones 5G. Mas a Huawei parece ter encontrado uma maneira de contornar essas restrições para fabricar um telefone avançado. Embora as informações detalhadas sobre o telefone sejam limitadas, o novo Mate 60 Pro da Huawei parece ter muitas das mesmas capacidades básicas de outros smartphones no mercado.
Uma análise do telefone pela TechInsights, publicação canadense especializada em semicondutores, concluiu que o chip do novo smartphone da Huawei foi fabricado pela Semiconductor Manufacturing International da China (SMIC) e está operando além dos limites tecnológicos que os Estados Unidos têm tentado barrar.
Douglas Fuller, professor associado da Copenhagen Business School, disse que a SMIC parece ter usado equipamentos armazenados antes da entrada em vigor das restrições.
- A linha oficial na China de uma quebra heróica do bloqueio tecnológico dos imperialistas americanos é incorreta. Em vez disso, os EUA permitiram à SMIC um acesso significativo e contínuo à tecnologia americana - disse Fuller.
A Huawei e a SMIC não responderam a um pedido de comentário. O Departamento de Comércio também não respondeu a um pedido de comentário. Blogueiros e sites de notícias chineses celebraram o lançamento do smartphone como prova de que as restrições dos EUA não poderiam impedir a China de desenvolver a sua própria tecnologia.
“Independentemente das intenções da Huawei, o lançamento do Mate 60 Pro foi imbuído por muitos internautas chineses de um significado mais profundo de subir sob pressão dos EUA”, disse, em editorial, o jornal estatal Global Times.
O novo smartphone foi lançado na semana em que autoridades americanas e chinesas emitiram inúmeras declarações sobre cooperação. As autoridades chinesas pediram aos Estados Unidos que revertessem as restrições às exportações de chips. Mas Gina – cujo e-mail, juntamente com outras autoridades dos EUA, foi alvo este ano de hackers chineses – disse aos repórteres que havia adotado linha dura em relação aos controles de tecnologia em suas reuniões, dizendo que os Estados Unidos não estavam dispostos a remover restrições ou comprometer questões de segurança nacional.
Durante a viagem, Gina e seus assessores estabeleceram um diálogo para compartilhar informações sobre como os Estados Unidos estavam aplicando seus controles tecnológicos. Mas destacou que isso não era um convite aos chineses para tentarem suavizar os controles de exportação.
Gina também se encontrou com o primeiro-ministro chinês, Li Qiang, durante sua visita. Na semana anterior, Li visitou a Huawei durante uma visita ao sul da China, segundo a agência oficial de notícias Xinhua, e se encontrou com o fundador da empresa, Ren Zhengfei.
O lançamento do telefone da Huawei levanta questões sobre se o departamento de Gina continuará a tentar melhorar a relação com as autoridades chinesas – ou potencialmente assumirá uma postura mais agressiva para reprimir o acesso da China à tecnologia dos EUA.
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A administração Biden está se preparando para publicar uma versão final das restrições tecnológicas que divulgou pela primeira vez em outubro do ano passado, e as regras revisadas poderão chegar dentro de semanas.
Nazak Nikakhtar, ex-funcionário do Departamento de Comércio, disse que o progresso da Huawei foi “resultado de uma política de longa data dos EUA”, com as licenças americanas que permitiram que as empresas continuassem vendendo tecnologias avançadas para empresas que o Departamento de Comércio colocou na lista de proibições, como Huawei e SMIC.
De 3 de janeiro a 31 de março de 2022, o Departamento de Comércio aprovou licenças para a venda de US$ 23 bilhões em produtos de tecnologia para empresas chinesas que estavam na lista de bloqueio, de acordo com informações divulgadas em fevereiro pelo Comitê de Relações Exteriores da Câmara.
- Onde existem lacunas nas políticas de licenciamento, as exportações serão canalizadas através dessas lacunas - disse Nikakhtar.
Em comunicado na quarta-feira, o deputado Mike Gallagher, republicano do Wisconsin, que chefia um comitê do Congresso sobre a China, pediu o fim de todas as exportações de tecnologia dos EUA para a Huawei e a SMIC. Fabricantes de chips dos EUA, como Qualcomm e Intel, receberam licenças de exportação.