RIO - A ferramenta de pagamentos e transferências pelo WhatsApp foi anunciada com pompa na segunda-feira da semana passada, com direito a mensagem do cofundador e diretor executivo do Facebook, Mark Zuckerberg. Mas a euforia durou pouco. Na terça-feira, o Banco Central (BC) determinou a interrupção do serviço .
O presidente da Visa no Brasil, Fernando Teles, se disse surpreso com a decisão, pois o BC alterou uma circular para poder exigir que o serviço seja autorizado pelo órgão. Agora, a companhia está reunindo informações que serão enviadas ao regulador, para aprovação ou não, mas a expectativa é positiva.
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Depois de se reunir com o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto na quarta-feira, o WhatsApp disse, em nota, que busca retomar com o seu sistema de pagamentos “o breve possível”.
A determinação do Banco Central foi uma surpresa para vocês?
Foi uma surpresa porque houve uma mudança na circular, é uma novidade. O Banco Central mudou uma circular e, a partir desta mudança, ele nos pediu que interrompêssemos a iniciativa e submetêssemos, novamente, as nossas regras para que ele possa fazer uma avaliação e, então, autorizar o serviço.
No comunicado o BC cita que “o início das operações sem a prévia análise do regulador poderia gerar danos irreparáveis ao Sistema de Pagamentos Brasileiro”. Antes do lançamento, houve conversas com o BC?
Nós somos um arranjo (conjunto de regras e procedimentos) de pagamento já autorizado pelo regulador. Então, até terça-feira, às 18h, quando você lançava um novo arranjo, não precisava pedir uma nova autorização. Ela só seria necessária após um determinado volume de transações ou financeiro.
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No caso específico desta solução, temos um arranjo de pagamento que já está autorizado, que é a permissão para uma pessoa comprar de um estabelecimento; e um arranjo de transferência, que já fazia parte das nossas regras, mas que não havia necessidade de requisitar uma autorização do Banco Central.
Então, antes desse lançamento específico com o Facebook, não. Nós já tínhamos ido ao Banco Central em outras ocasiões para falar sobre o arranjo de transferência, falar sobre o Visa Direct (serviço que permite a transferência de valores entre cartões de débito ou crédito), explicar o funcionamento da tecnologia. Não era necessário o pedido de autorização. Ele passou a ser necessário a partir de terça-feira.
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Vale destacar que o Facebook, ou o WhatsApp, não é um participante do nosso arranjo, é apenas um cliente que contratou uma solução tecnológica para permitir a transferência de recursos entre seus usuários. Poderia ser o Facebook ou qualquer outra empresa, como uma seguradora, para transferência das indenizações para os segurados; ou um aplicativo de transporte, para o pagamento dos motoristas. Em nenhum desses casos seria preciso pedir uma autorização ao BC, por se tratar apenas do uso de uma tecnologia já pertencente ao arranjo.
O que mudou com a reedição da circular?
Com essa medida, o BC fez com que esse arranjo de transferência faça parte do Sistema de Pagamentos Brasileiro. Dessa forma, ele pode exigir uma autorização, no prazo que entender mais adequado. Nesse caso, o BC entendeu que deveria ser imediatamente.
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Quais são os próximos passos?
O BC nos disse: por gentileza, parem com a utilização do arranjo e submetam o seu conjunto de regras para que eu possa avaliar e, assim, autorizar sua continuidade. Esse é o próximo passo. Estamos reunindo informações, além das que já apresentamos, para que ele possa avaliar. Pelo comunicado, o Banco Central entendeu que pode haver algum risco, e o nosso papel é mitigar e dar conforto ao regulador com as informações que ele precisa: se a operação é segura, se está dentro dos padrões de confiabilidade e de qualidade, sobre o respeito aos dados do consumidor, como a transação se dá entre as partes...
E qual é a expectativa? O brasileiro vai ou não poder transferir dinheiro pelo WhatsApp?
Primeiro, eu acho que a solução é extremamente benéfica para os usuários, por ser muito fácil, prática e não ter cobrança de taxas para quem envia e quem recebe o dinheiro. Então, a minha expectativa é positiva, porque ela é boa para os usuários, boa para o sistema e boa para o país, porque coloca o Brasil em outro patamar de inovação nesse mundo de pagamentos eletrônicos.
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O serviço foi lançado na semana passada. Como estava a adesão?
Na verdade, ainda estava num processo que a gente chama de “family and friends”. Foram habilitadas apenas algumas pessoas, principalmente das empresas envolvidas, mais para fazer um teste. Para garantir que o sistema está funcionando corretamente.
Como foi o desenvolvimento do projeto?
Foi o Facebook que nos procurou, para permitir a transferência de recursos para os seus clientes. O projeto está em desenvolvimento há mais de 18 meses, então houve um aprendizado muito grande sobre todos os requisitos de qualidade, de segurança e de operação.
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O interessante de trabalhar com eles é que essas Big Techs têm muita preocupação com a experiência do usuário, de que os serviços sejam fáceis, simples, autoexplicativos. E isso exigiu todo um desenvolvimento tecnológico que foi feito pelos participantes.
Isso permitiu, por exemplo, o desenvolvimento do Visa Cloud Token (tecnologia onde os tokens para transações estão na nuvem, não nos aparelhos), que é uma inovação fantástica do ponto de vista da segurança, o que para nós é uma preocupação constante.
O WhatsApp tem as comunicações criptografadas, mas para concluir uma transação é preciso que esses dados sejam lidos por alguém. Como fica a questão da segurança?
Quando você cadastra o seu cartão, o WhatsApp requisita um token para o emissor (os bancos parceiros). Quando você fizer uma transação, vai acontecer uma nova requisição. O emissor manda esse token exclusivamente para aquela transação. Quem vê essa informação? O banco autorizador, a empresa que está no meio — nesse caso a Cielo — e o banco receptor. Mas mesmo que fosse possível para alguém invadir essa transação e capturar essa informação, ela não serve para nada. Aquele token, que é apenas um número, não serve para nada além daquela transação. Não dá para pegar esse número e tirar dinheiro da sua conta.
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Outra preocupação é com a clonagem de WhatsApp. Se alguém tiver acesso à minha conta vai poder transferir dinheiro?
Não, porque o WhatsApp exige uma senha específica para iniciar as transações. É mais uma camada de segurança. Os smartphones possuem seus dispositivos de proteção, como a biometria, o WhatsApp tem a verificação em duas etapas e as transações exigem mais uma senha.