RIO - Foram cinco meses de imersão em meia centena de diários de um dos maiores economistas brasileiros, Celso Furtado, para escrever o livro que sua mulher, a jornalista Rosa Freire D’Aguiar, lançou esta semana no Rio, “Celso Furtado, diários intermitentes”, pela Companhia das Letras. Em 2020, o intelectual completaria cem anos.
O livro descreve a trajetória do economista desde a juventude até 2002, dois anos antes de Furtado morrer. Ele criou a Sudene e foi ministro nos governos João Goulart e José Sarney. Seu livro “Formação Econômica do Brasil” é um clássico.
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Para Rosa, a frustração é ver que há ainda no Brasil “bolsões imensos de subdesenvolvimento”, problema que o economista combateu:
- A atualidade tem um lado que o Celso combatia, que era a luta contra o subdesenvolvimento, era a razão de ser da vida dele. O quadro que ele pinta dos anos de redemocratização, de 1983 e 1984, a História do Brasil naquele momento, é um documento.
“Tanto a direta como a esquerda tinham, há um quarto de século, a certeza de que possuíam uma solução para os problemas do país. Uns e outros pensavam que por atos de voluntarismo se podiam remover os obstáculos ao desenvolvimento e/ou justiça social. Como o Estado seria o instrumento privilegiado dessa transformação, a luta foi pelo seu controle.
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Como a direita pôde mobilizar as forças do medo (e não somente entre as classes privilegiadas), ganhou a dianteira e produziu o ciclo de autoritarismo. O resultado final (a corrupção desbragada) produziu o descrédito do Estado como instrumento de engenharia social”, escreve em 1985.
Furtado descreveu a frustração ao voltar ao Nordeste em 1975, breve período de cinco meses que passou no Brasil, depois de ter sido obrigado a se exilar, em maio de 1964.
— O projeto que tinha de desenvolvimento não vingou. Vingou uma imensa concentração de renda, pobreza aumentando muito. Ele considera sua geração fracassada.
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Mais recentemente, há tentativas de apagar a memória dele em alguns locais, diz Rosa, como troca de nome de centro acadêmico e até de termelétricas. Rosa conta que o Centro Acadêmico da Universidade Federal de Santa Catarina alterou seu nome para Roberto Campos, economista contemporâneo de Furtado, mas de viés liberal.
— Os estudantes votaram, tudo bem. Mas trocar o nome das termelétricas, não. Não consigo imaginar alguém na estatal preocupado com isso. Disseram que não tinham autorização, mas não é verdade. Eu estive na inauguração!