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Ela Gente

Costanza Pascolato diz que terno branco Armani a impediu de cometer suicídio

Consultora de moda lança livro para celebrar seus 80 anos
Costanza Pascolato Foto: Bob Wolfenson / Bob Wolfenson
Costanza Pascolato Foto: Bob Wolfenson / Bob Wolfenson

Às vésperas de completar 80 anos — seu aniversário é no dia 19 de setembro —, a consultora de moda Costanza Pascolato chegou à conclusão que sua vida daria um belo seriado, desses que se estenderiam por temporadas e não deixariam a audiência entediada. O roteiro, segundo ela, seria cheio de aventuras. Começaria com sua saída da Itália, ainda na infância, logo depois da Segunda Guerra Mundial; teria um divórcio no começo da década de 1970; dramas familiares; uma carreira de sucesso; e muito humor.

Enquanto nenhuma produtora se mexe para colocar a ideia em prática, Costanza lança o livro “A elegância do agora” (ed. Tordesilhas, R$ 98), o quinto de sua trajetória — no Rio, a noite de autógrafos será no próximo dia 11, na Livraria da Travessa, no Shopping Leblon. “Reuni uma série de coisas que aconteceram comigo que podem servir de conselho para os outros. Tive depressão, câncer duas vezes... Cheguei aos 80 e ainda estou trabalhando à beça num mundo que mudou totalmente, sobretudo na questão da aceleração por causa da internet”, diz.

Numa conversa franca, a consultora fala sobre a relação com as filhas, Consuelo e Alessandra Blocker, a admiração pela mãe, a empresária Gabriella Pascolato, morta em 2010, casamento, estética e solidão.

Costanza Pascolato Foto: Bob Wolfenson
Costanza Pascolato Foto: Bob Wolfenson

O que é ser transgressora aos 80 anos?

Não se trata de transgressão, como deixo claro no meu livro. É resistência ao tempo e aos problemas sem perder o humor, que é uma grande força. Agradeço aos céus por tudo que tive na vida. Nunca me senti poderosa. O mundo gira, a vida segue e eu estou assistindo a todas as transformações de uma posição privilegiada.

Você sempre fala sobre valores familiares...

Falo sobre isso até de um jeito chato. Em “A elegância do agora”, passo de uma maneira leve por pontos que talvez as pessoas tenham aprendido em algum momento, mas estão se esquecendo. Tudo está muito casual, dizem qualquer coisa por aí. E não é bem assim. Pense na educação das crianças. Se fizermos tudo que elas querem, crescem sem limites. E é exatamente esse rumo que a sociedade está tomando.

Tem acompanhado o noticiário do mundo?

Não ouço mais nenhum tipo de notícia. O que for relevante, saberei de alguma forma. Não quero ficar deprimida. Não tenho energia para suportar o que é chato.

O humor é uma marca sua. Só ele pode nos salvar?

É importante. Se faço alguma bobagem, começo a dar risada na mesma hora.

Costanza Pascolato Foto: Arquivo Pessoal
Costanza Pascolato Foto: Arquivo Pessoal

Ficou mais intransigente com o tempo, sem paciência?

Sempre fui exigente. Tenho uma tendência ao refinamento, algo muito difícil hoje em dia. Parece que fazem de um tudo para deixar as coisas mais ou menos, malfeitas. Sou virginiana e as pessoas desse signo não gostam de bagunça. A gente precisa de ordem para se sentir confortável. Quando vou escrever um artigo, penso em começo, meio e fim da narrativa, além do contexto. Não adianta ficar soltando um monte de bobagens como muita gente anda fazendo. Parece que a maioria “imbecilizou”. Tento passar algo com meus textos, ainda que seja imperceptível para boa parte dos leitores.

Como enxerga a internet?

As pessoas estão muito infelizes. Se jogam nessa coisa digital como se fosse uma droga. Percebo que elas estão fugindo delas mesmas, o que é triste. Esse negócio da polarização nada mais é do que um divertimento atual. A turma se sente existindo no momento em que começa a dar sua opinião.

Você tem opinião sobre tudo?

Se nós tivermos uma conversa inteligente sobre um determinado assunto, vou imprimir o que penso. Caso contrário, fico na minha. Ninguém precisa saber o que se passa pela minha cabeça. Só se for realmente útil. Foi assim que aprendi em casa.

Sua educação foi muito rígida?

Foi porque tinha a ver com o contexto da época. A gente vinha de uma guerra e meus pais achavam que a disciplina era a base de tudo. E eles tinham razão. Mas fui duramente castigada porque não segui o caminho que mamãe e papai achavam certo. Fui independente. Pagando o pato ou não, eu fazia do meu jeito. Nunca fui mulher de ficar aturando “piti” de marido. Aliás, fui deserdada depois de colocar um ponto final no meu primeiro casamento.

Costanza e Giulio Cattaneo della Volta Foto: Arquivo Pessoal
Costanza e Giulio Cattaneo della Volta Foto: Arquivo Pessoal

E você teve três maridos: Robert Blocker, Giulio Cattaneo della Volta (seu grande amor) e Nelson Motta. Esse capítulo está encerrado?

Graças ao meu bom Deus. Não sou mais um animal reprodutor. Esse negócio de acasalamento funciona até um certo ponto. Se eu tivesse uma pessoa que viveu comigo a maioria dos meus anos, aí ficaria junto. Mas não dá para começar uma história hoje.

Você já disse que sua tara está no intelecto masculino.

É verdade! Mas gosto de olhar um homem bonitinho. Para mim, beleza é saber se comportar em qualquer ocasião.

Tem medo da solidão?

Fico tranquila sozinha. Conheço pessoas que choram nessa situação. Deve ser porque não se dão bem com elas mesmas...

Que tipo de mãe você é?

Não fui tão liberal, mas as meninas foram excelentes. Sou uma mãe melhor hoje do que fui ontem e anteontem. Quando me separei do Blocker, meu pai e ele decidiram que eu ficaria sem as garotas, que só poderia vê-las nos fins de semana. Elas ficaram com o pai no Rio; eu, em São Paulo. E foi assim durante quatro anos até meu ex-marido se casar outra vez. Hoje, me perdoei, mas foi uma das coisas mais desastrosas que fiz, porque minhas filhas pagaram a conta.

E como era a relação com sua mãe?

Não era fácil, mas mamãe foi uma força para mim. Tudo aquilo que ela achava que eu não tinha de bom, eu procurava melhorar. Queria ser mais inteligente, mais culta. Minha mãe era meu exemplo absoluto. Ela era ousada, corajosa e maravilhosa. Recomeçou a vida num país completamente diferente, como o Brasil.

Você se considera brasileira? Afinal, está aqui desde os 5 anos.

Jamais deixaria esse país. Quando estou na Itália, no entanto, sinto que sou muito italiana. Outro dia estava em Florença e comi algo que há décadas não entrava no meu prato. No momento em que coloquei na boca, me lembrei do nome da cozinheira da minha avó.

Está mais despreocupada com sua imagem?

Claro que não! É muito mais difícil você se manter direitinho conforme o tempo vai passando. Sempre me arrumei para me sentir legal. Levo um tempão para me aprontar. Passo horas maquiando os olhos, ajeitando os cabelos. A natureza é generosa. Deixei de enxergar bem quando as rugas começaram a aparecer. Ou seja: sem os óculos, nem sei o que está acontecendo com a minha pele.

Costanza e Robert Blocker Foto: Arquivo Pessoal
Costanza e Robert Blocker Foto: Arquivo Pessoal

Como lidou com a depressão?

Foi um dos piores episódios da minha vida. Foi horrível. Sempre reagi e batalhei contra as coisas, como uma guerreira, mas eu simplesmente não conseguia. A depressão me jogou no fundo do poço. Era impossível sentir algo além daquela dor profunda. Isso aconteceu na década de 1980 depois que Consuelo decidiu morar nos Estados Unidos. Cheguei a pensar em suicídio. Subi na janela do meu quarto, no alto do prédio, e cogitei pular. Mas vi que estava de branco e desisti. A cena ficaria horrível. O terno Armani me salvou dessa enorme burrada que eu iria fazer.

A estética, mais uma vez...

É um negócio forte na minha personalidade. Eu realmente tenho esse olhar que capta tudo que é interessante. Meus olhos são mais inteligentes do que meu cérebro.

E a batalha contra o câncer?

A natureza é tão legal. Tive o primeiro tumor no seio em 1993; o segundo, em 2013. Aí, eles ficaram iguais. Nas duas vezes, eles foram detectados cedo e o tratamento foi relativamente suave. Precisei apenas de radioterapia. Aprendi a ter resistência, perseverança e não me deixar apavorar. Faça prevenção. Isso é ter respeito por si mesmo.

O que você ainda espera da vida?

Sei que tenho menos tempo e decidi que preciso viver o melhor possível os poucos anos que me restam. Fico aqui mais uma década e meia, no máximo.

E isso não a assusta?

Superei esse aperto no coração com meditação.

As pessoas dizem que você é um ícone. O que acha?

Não sei se sou. Mal entendo como passei a ser vista como tal. Mas tudo bem. Agradeço a Deus que sempre me deu essa notoriedade. É coisa do destino. Nunca fiz nada para aparecer. Só vivo a minha vida corretamente.