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Designer transforma coleção sobre ancestralidade negra em pesquisa

Gabi Monteiro apresentou sua investigação "Racismo é estético" em Manchester
Gabi Monteiro em foto feita durante a sua visita a Manchester, no Reino Unido Foto: Morgane Henninot, no Estúdio Vertical
Gabi Monteiro em foto feita durante a sua visita a Manchester, no Reino Unido Foto: Morgane Henninot, no Estúdio Vertical

Ao fazer a primeira pesquisa no Google em busca de referências para a criação de uma coleção de roupas, há cerca de três anos, a designer Gabi Monteiro não imaginava que estava dando o pontapé inicial numa investigação aprofundada sobre racismo e ancestralidade. Depois de lançar, no ano passado, a linha Vale Longo, que teve a Zona Portuária do Rio como pano de fundo , ela transformou o conteúdo no projeto “Racismo é estético”, que acaba de apresentar na Universidade de Manchester, no Reino Unido, e vai submeter a programas de mestrado em Berlim.

— Descobri que tinha em mãos algo muito maior do que uma coleção que se encerraria nas roupas. A pesquisa se inicia com a chegada dos africanos escravizados à região do Cais do Valongo e vem até os dias de hoje, observando como eles eram retratados nas obras de Debret e nas fotos de Louis Agassiz, e a maneira como isso se dá nas produções audiovisuais contemporâneas — comenta Gabi, formada em Design de Moda pela PUC-Rio. — Mesmo em situações em que o negro é maioria, ele não é retratado de forma equivalente.

Gabi falou sobre isso em Manchester, ao exibir os vídeos feitos para divulgar a coleção. Foi graças a esse material, inclusive, que ela chegou até lá, após ser aprovada numa residência artística de cinco dias na Inglaterra. Para financiar a viagem, ela lançou uma campanha de arrecadação pela internet, na qual levantou R$ 18.650 mil em menos de um mês.

— Se não achasse que sou merecedora, provavelmente, teria vergonha de pedir dinheiro. Mas isso não foi um problema, porque sei que não tinha essa grana por falta de trabalho, mas porque, teoricamente, esse tipo de viagem deveria estar fora do meu radar — diz.

É que parte da pesquisa de Gabi se cruza com a sua própria história, quando ela começou a questionar o fato de morar no Chapéu Mangueira, tendo mãe e avó também nascidas em comunidades, e a refletir sobre os episódios de racismo que sofreu ao longo da vida.

— Até hoje não sei muito bem o que quero. Vou fazendo o que o universo joga para mim. Mas almejo mais do que continuar morando no Chapéu Mangueira, arrumando casa, lavando louça ou cuidando de uma família — avisa a designer, que se prepara para submeter sua pesquisa a bolsas de mestrado em universidades de Berlim, que lhe garantiriam uma boa ajuda de custo para estudar em um ambiente marcado pela pluralidade. — Eu me coloco livre para descobrir os espaços que desejo ocupar. Mas, para isso, precisei entender a minha história. Saber por que minha família não tem como pagar um aluguel para mim ou me dar um carro. Isso não é de agora. São séculos de perpetuação de um conceito inventado pelo homem eurocêntrico para dominar outras pessoas que até hoje perpassa a nossa sociedade.