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Mel Lisboa fala sobre política, maternidade e casamento na quarentena

'Eu estou tentando manter a calma para passar tranquilidade para as crianças', diz a atriz, que teve a volta à TV adiada devido à pandemia
Mel Lisboa usa trench coat Casa Juisi, colar Reinaldo Lourenço e brinco A Figurinista Foto: Bob Wolfenson; styling Ciro Midena
Mel Lisboa usa trench coat Casa Juisi, colar Reinaldo Lourenço e brinco A Figurinista Foto: Bob Wolfenson; styling Ciro Midena

No grande dia, tudo mudou. O início das gravações da nova temporada da “Malhação” estava marcado para 16 de março, justo quando as atividades da teledramaturgia da Globo foram suspensas para evitar a propagação do novo coronavírus. Mel Lisboa, há 13 anos longe das novelas da casa, entraria então no set como Rosane, mãe da protagonista, Luli, que será vivida por Manu Morelli. “No último trabalho que eu fiz na Globo (“ Sete pecados”, em 2007), eu era a filha de alguém. Agora, volto sendo mãe de uma jovem, e, para mim, isso é legal porque me ajuda a entender meu amadurecimento, a minha idade”, diz Mel, que completou 38 anos em janeiro, e, na última década, esteve focada no teatro, principalmente com a Cia Pessoal do Faroeste, e em séries para TV paga e streaming.

Mel Lisboa Foto: Bob Wolfenson
Mel Lisboa Foto: Bob Wolfenson

No futuro folhetim, além de Luli, de 16, ela terá um filho de 11. Na vida real, também são dois: Bernardo, 11, e Clarice, 7. É com eles e com o marido, o músico Felipe Roseno, que ela está em quarentena em sua casa em São Paulo — o flat alugado no Rio, para ficar enquanto trabalha na cidade, foi devolvido, já que “Malhação: Transformação”, como é chamada a nova história, está sem data para ser retomada. Enquanto isso, é reprisada “Malhação: Viva a diferença”, exibida originalmente entre 2017 e 2018.

Antes de outro imprevisto recente — em fevereiro, uma enchente atingiu o estúdio do fotógrafo Bob Wolfenson na capital paulista e deixou 80% de seu acervo não digitalizado debaixo d’água —, Mel fez um ensaio com o premiado profissional. São essas fotos, inéditas, que acompanham a entrevista que ela concedeu à ELA por telefone.

De casa, Mel analisa o contraste entre seus privilégios de poder parar, e mesmo assim continuar a pagar suas funcionárias, e a situação difícil de quem mora nas periferias e nas ruas. Para ajudar os mais vulneráveis, se engajou em campanhas. Já para ajudar a si mesma e aos fãs a passarem o tempo, começou a ler contos ao vivo no Instagram (@mellisboa) alguns dias por semana. Por lá também fala de política. Os haters, claro, não perdoam — mas ela não está nem aí.

Como está a sua quarentena?

Eu estou em São Paulo, em casa com meus filhos e meu companheiro. Estou tentando administrar tudo, porque as crianças estão tendo aula em várias plataformas digitais. E eu sou péssima com tecnologia, então fico aqui lutando para que eles possam fazer suas tarefas. É uma situação completamente inusitada.

E para o seu casamento, como tem sido a experiência?

Estamos em harmonia, por sorte. Somos parceiros, fazemos uma divisão para não sobrecarregar ninguém. A cozinheira da casa sou eu. O faxineiro é ele, muito bom, por sinal. Eu sou muito mais preguiçosa ( risos ).

Em casa o tempo todo, dá para namorar mais?

Isso é difícil com criança ( risos ). Deve funcionar para quem não tem filhos, mas com a gente não é bem assim. Pelo contrário... tem que marcar horário!

Você já era uma pessoa mais caseira?

É engraçado… Tem horas que acho que eu estava sentindo que alguma coisa ia acontecer porque gosto muito de sair, de encontrar as pessoas, de ir aos lugares, de ir a festas. E, desde o final do ano passado, eu estava mais recolhida, não estava nem entendendo por quê. Pode ser que seja uma fase, que eu esteja envelhecendo mesmo e querendo ficar mais em casa. Não sei. Mas, quando isso do coronavírus aconteceu, eu pensei: “Nossa, olha que maluco”. Eu estava já nesse movimento interno há um tempo. Por esse lado, está tudo bem. Só é uma situação muito desconfortável por conta do medo, do que você imagina que vá acontecer com o mundo, com as pessoas, com a falta de cuidado desse governo, com a irresponsabilidade com as vidas. Mas eu estou tentando manter a calma para passar tranquilidade para as crianças. Eu chorei só um dia com o Bernardo. Ele estava fazendo a lição, eu estava lendo um livro. Daqui a pouco, ele me olhou, parou, aí eu falei “Vem cá me dar um abraço” e ele me abraçou, deitou e a gente começou a chorar.

Você busca uma visão astrológica para O momento atual? Conversou com a sua mãe (a astróloga Cláudia Lisboa, colunista do GLOBO) sobre isso?

Minha mãe encara as maiores dificuldades com um olhar generoso. É uma característica dela. Temos conversado bastante e ela está preocupada também, claro, não só do ponto de vista astrológico. Mas ela não faz exatamente previsões, também é uma característica dela.

É muito diferente ter uma mãe astróloga?

Sim, sempre foi muito diferente. Quando estou passando por algum momento novo, vou até ela e vejo como está esse meu momento e tento, a partir das tendências, me adequar. Perto do meu aniversário, pergunto a ela sobre a minha revolução solar, para ver as tendências do ano seguinte. Na revolução solar, até a questão de onde você passa o seu aniversário pode influenciar. Então, se eu posso, viajo na data. No ano passado, fui para Buenos Aires, por exemplo. Mas é sempre dentro de uma possibilidade. Não adianta ser um lugar para onde falta tempo, falta dinheiro, falta tudo ( risos ).

A postura do presidente da república diante da pandemia te preocupa. Em um post recente, você escreveu “precisamos parar esse homem”...

Eu sempre fui contra o Jair Bolsonaro e tudo que ele representa e fala. Nunca votaria nele, não votei, mas ele foi eleito, é o presidente, e está mostrando ser completamente despreparado e irresponsável. Ele está colocando em risco o país para tentar agradar o mercado. Agora, ele está beirando o absurdo tão fortemente que as pessoas estão se unindo contra ele, mesmo quem votou nele. Ele tem ainda, claro, muitos apoiadores, o que é assustador, fico impressionada. Não tenho o menor problema em me colocar politicamente, até pelo contrário. Neste momento, acho que a gente tem que se colocar. Não vejo problema que, quando eu poste alguma mensagem política, as pessoas me xinguem ou deixem de seguir.

O que fez você ter a vontade de voltar para a TV aberta em “Malhação”?

Já fazia um tempo que eu estava nesse namoro. As novelas ainda têm uma relevância muito grande no país e é importante fazê-las, é um aprendizado também. Quando surgiu essa oportunidade de “Malhação”, com um papel super bacana, abri mão de uma série para a qual estava escalada porque, se fizesse a série, ia postergar mais uma vez esse plano, que é uma coisa que acho que tem que acontecer já.

O que mais a atraiu nesse convite?

A “Malhação” está há 25 anos no ar e tem por quê. Ela tem uma função social muito legal. O tema jovem me interessou muito também e fiquei estudando para poder entender tudo isso. Acho que eu sou da última geração analógica. O gap geracional entre mim e meus filhos é enorme, é muito maior do que foi entre a minha mãe e eu. Então, buscar entender quem são esses jovens de hoje, o que eles querem, o que eles temem, é muito importante. A personagem também é muito legal. Ela é mãe de uma adolescente. É um momento para mim muito especial porque, no último trabalho que eu fiz na Globo, eu era a filha de alguém. Agora, mais de dez anos depois, eu volto sendo a mãe de uma jovem, e, para mim, isso é legal porque me ajuda a entender também o meu amadurecimento, a minha idade. A Rosane, a personagem, é uma mulher muito real, ela tem as imperfeições dela. Isso me encanta na personagem.

Ela mostrará uma maternidade menos idealizada? Você se identifica com isso?

Me identifico muito. A gente não sabe nunca o que fazer. Diariamente, a gente tem que tirar um coelho da cartola ( risos ). Você vê os temperamentos dos seus filhos, identifica que as maiores qualidades deles podem ser também os seus maiores defeitos, aí você tem que ver como lida com isso...

Em “Malhação” você vai lidar com a nova geração. O que vê de bacana ou de preocupante nela?

É interessante como eles já vêm com muita informação. Me parecem até mais maduros em assuntos como o feminismo. Na idade deles, era feminista, mas não sabia. Mas, ao mesmo tempo, eles não têm tempo de vida para processar tudo isso. Às vezes, é uma geração mais angustiada, mais ansiosa.