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Por Eduardo Vanini

Tonico Pereira chegou aos 75 anos sem abrir mão da intensidade que o acompanha desde a juventude. Aceitou diminuir o consumo de álcool por causa da saúde, mas não sai de casa sem um comprimido estimulante sexual na bolsa. “Tenho que andar armado né, meu irmão?”, avisa. No campo profissional, o ator que deu vida a personagens fixados na memória afetiva do público, como o Zé Carneiro, do “Sítio do Picapau Amarelo”, e o Mendonça, de “A grande família”, tampouco cogita uma aposentadoria. “Estou sempre disposto a trabalhar. Mesmo com pouca aptidão física, adapto os personagens à minha condição.”

Isso não significa que a versatilidade, outra característica nata, esteja comprometida. Afinal, se hoje ele está no ar como o frei Leão, em “Amor perfeito”, novela das 18h da TV Globo, em 1979, causou burburinho ao protagonizar, com o colega Anselmo Vasconcelos, o primeiro beijo gay do cinema nacional no longa “República dos assassinos”, de Miguel Faria Júnior. Personagens invariavelmente forjados a partir de suas próprias vivências: “Costumo dizer que fui formado por bares e puteiros do Brasil”.

Pai de Daniela, de 49 anos, e Thaia, de 47, do primeiro casamento, e dos gêmeos Antonio e Nina, de 18, com a bailarina e atriz Marina Salomon, com quem é casado, Tonico nutre também um curioso apreço pelos negócios — nem sempre bem-sucedidos. “Sou um empreendedor de merda, mas sou. Já fali algumas vezes, mas não devo nada a ninguém”, salienta. A lista de empreitadas inclui peixaria na Cidade de Deus, loja de parafusos e peças de automóveis (Dona Porca e seus dois Parafusos), em Copacabana, botequim em Botafogo e livraria em Niterói.

O investimento da vez é o TPM Brechó, em Botafogo, inaugurado pouco antes da pandemia. “A ideia surgiu pelo fato de ser um negócio de baixo custo, já que a maioria das peças é consignada”, explica. Foi lá que ele recebeu a reportagem para uma conversa marcada pelo tom gaiato e encerrada com uma observação modesta: “Não sei por que as pessoas ficam me procurando para entrevistas?”. Tire suas conclusões a seguir.

O GLOBO - Como está a agenda além da novela “Amor perfeito”?

TONICO PEREIRA - Faltam mais ou menos dois meses para terminar, e aí vem aquela expectativa de saber se vou continuar ou não (a trabalhar). Está acontecendo muito isso de ficarmos parados. Mas estou sempre disposto a atuar. Mesmo com pouca aptidão física, adapto os personagens à minha condição. Não tenho escola nenhuma, nunca fiz uma aula de teatro, mas tenho a minha vivência. Isso é o que me move.

E como tem sido lidar com a nova geração de atores, numa época em que o desempenho nas redes influencia na escalação de um elenco?

Hoje você faz um “Big Brother” e vira uma palavra que não uso para mim, que é artista. Não sou artista, sou ator. Artista é Van Gogh, Picasso. Mas é isso. Vamos lutando, vamos vivendo. No meu caso, aprendi com os atores mais velhos. Hoje, o jovem rejeita um pouco essa participação. Eles são muito “senhores” porque fizeram curso de não sei o quê nos EUA.

Quem foram suas principais referências?

O Grande Otelo era uma delas. Lembro da primeira vez que o vi, nos corredores da TV Educativa, na Lapa. Ele estava passando o texto, como eu. Num certo momento, perguntou se eu era o Tonico Pereira. Respondi que sim, e ele disse que eu era um grande ator. Fiquei puto por não ter dito o mesmo a ele antes.

Quem mais?

Em “Gabriela” (1975), também tive muitos apoiadores. Armando Bógus, Jaime Barcellos... Talvez, como era magro demais, parecia faminto, e eles me olhavam com mais generosidade. Além disso, costumo dizer que fui formado por bares e puteiros do Brasil. Meu pai era semianalfabeto, a minha mãe também. A única coisa que eu fiz razoavelmente bem foi o primário.

E como chegou às artes cênicas?

Vim para o Rio com uma carta de apresentação para jogar futebol no América. Jogava em Campos, onde nasci, pelo Goytacaz. Mas eu era boêmio para cacete e vi que não ia dar para treinar profissionalmente. Tenho uma prima que estudava Letras na UFF, e o marido era o presidente do diretório acadêmico. Fui visitá-los, e ele me disse que estavam fundado um grupo de teatro. Cheguei lá, e encontrei várias meninas libertárias. Resolvi trocar o vestiário cheio de homens nus pela experiência teatral. Mas foi um trabalho muito sério. Era um grupo muito politizado, vários amigos foram presos.

Como foi protagonizar o primeiro beijo gay do cinema nacional?

Fui muito sacaneado, inclusive, por atores. Achava isso medíocre. Afinal, qual o problema em fazer algo que é cênico? Estou sempre me embrenhando no sentido de ser um homem que ajuda os humanos.

E qual é, na sua opinião, a principal característica da sua geração de atores?

A primeira delas é o engajamento político. Sempre tive visões a partir da falta de recursos da minha família. Precisei começar a trabalhar aos 8 anos. Vendi mariola, suspiro, empada, quindim... Também fazia faxina e cheguei a ser “avião” de uma linha de contrabando, algo que posso contar hoje porque já prescreveu. Vendia cigarro, caneta e perfume.

E como era em relação ao comportamento? As festas deviam ser animadas.

Porra! Eram com tudo o que tínhamos direito, né? Uma vez, fui numa festa do meu grupo que rolou uma sopa de cogumelos. Ficou todo o mundo enlouquecido, até que chegou um amigo e tomou como se fosse comida mesmo. Repetiu não sei quantos pratos e ficou ainda mais enlouquecido (risos). Além de tudo, eu era brigão. Desafiava até a polícia. Meu apelido, em Campos, era Vaca Brava.

Acha que buscava o risco, de alguma forma?

Não buscava, mas acontecia. Certa vez, fomos a uma cidade do Sul do Brasil para fazer um espetáculo. Fiquei num hotel muito ruim e, então, perguntei onde era o puteiro. Cheguei ao local, e era maravilhoso! Passei o resto da temporada hospedado lá e fiquei com algumas das mulheres. Tinha uma prostituta que, quando me via, começava a chorar. Depois, descobri que ela se lembrava do Zé Carneiro. Também levei o elenco da peça para se apresentar lá, teve até gente do Theatro Municipal cantando no puteiro.

Mas qual era exatamente o risco?

Era o auge da epidemia de HIV.

Você está como gostaria, aos 75?

Não, porque estou sem saúde. Tive quatro cânceres de bexiga, um tumor benigno no pulmão, sou diabético, tenho doença pulmonar obstrutiva crônica e agora comecei um tratamento para os rins. Ainda gosto de tomar uma cana num botequim, mas estou proibido. Sou privilegiado, porque a TV Globo tem um plano de saúde que me dá esse tipo de atenção. A Globo já me salvou algumas vezes. Há uns 15 anos, me deu uma prótese peniana. Mas ela foi expelida porque infeccionou e nenhum médico quis recolocá-la. Botaram uma semirrígida. Mas, com a outra, ficava cinco horas de pau duro. Agora, não fica mais com a dureza que tinha.

Como tem sido a vida sexual, então?

Hoje é bastante contemplativa. Mas, quando acontece, é muito bom. Uso um remédio estimulante que está sempre comigo. Tomo todos os dias porque a gente tem que estar sempre armado né, meu irmão?

É saudosista em relação à juventude?

Não. Vivo o presente, mas sem abandonar a minha história. A minha história é o que me formou.

A perda dos amigos causa angústia?

É um círculo que se aproxima, se espreme e vai chegar a sua hora, né? Não tenho medo da morte, mas espero que ela não chegue quando eu estiver dormindo. A minha intenção é sair na porrada com ela.

Olhando a vida em retrospecto, arrepende-se de alguma coisa?

O arrependimento é um ato de inteligência. Tem muita gente que diz que não se arrepende de nada. Acho isso burro para caralho. Eu me arrependo de uma porrada de merdas. O cigarro é uma delas.

Com foi vivenciar a paternidade em momentos diferentes da vida, primeiramente na casa dos 20 anos e, depois, aos 57?

Com as duas primeiras filhas, não dormi em casa várias vezes, vivia na esbórnia. Com os mais novos, não durmo enquanto não chegam. Mas recuperei a minha relação com as mais velhas e, com os gêmeos, é diferente. Só não me sinto à vontade em falar “não façam isso”, “não façam aquilo”. Seria hipócrita. Eles têm o direito de viver a vida como vivi a minha.

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