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Por — Rio de Janeiro

“Meu filho é excluído pela minha própria família porque sou maconheira.” A falta de apoio dos parentes da mineira Jaqueline Toledo é só um dos muitos desafios que a produtora cultural de 31 anos enfrenta por se expor como uma mãe usuária da cannabis. Até visita de uma assistente social ela já recebeu como “medida cautelar” pelos cuidados do pequeno Miguel, de 8 anos. “Chegando em casa, tudo o que ela viu foi um lar organizado e com condições salubres para uma criança viver. Estou cansada de as pessoas me desqualificarem como mãe”, lamenta. “Nunca escondi que fumava. Miguel até briga quando fumo cigarro de nicotina. Diz que o ‘natural’ faz menos mal.”

Nas redes sociais, Jaqueline adotou a alcunha de “mãeconheira”, termo que se tornou uma espécie de bandeira entre mães que fumam a erva e lutam contra o proibicionismo, os preconceitos oriundos dele e a violação do direito à maternidade de mulheres que fazem o uso recreativo e medicinal da planta. No Brasil, a proibição da cannabis deu-se em 1938, mas o Supremo Tribunal Federal iniciou, em 2023, a análise de uma ação para descriminalizar o porte entre 25g a 60g da substância para consumo pessoal. O julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro André Mendonça.

A discussão em torno do uso de drogas no país é complexa, como não deixa esquecer Soninha Francine, secretária municipal de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo. Além das mortes registradas nas operações em nome da guerra às drogas, “realizadas principalmente nas comunidades periféricas”, há também um recorte de classe e raça a ser explorado. “As pretas e pobres sofrem muito mais repressão da sociedade nesses casos, com abuso e violência policial. Maconha é fumada por gente de tudo quanto é endereço e escolaridade, mas o proibicionismo é seletivo, os efeitos não são os mesmos para todas”, afirma.

Coletivos de “mãeconheiras” começaram a se formar nas redes sociais sob uma abordagem antiproibicionista, com foco em dar auxílio médico, social e psicológico às mulheres e suas famílias. O Segurando as Pontas, criado pela psicóloga Marcelle Louzada e pela médica Daniela Arruda, é um deles. “Há 385 mulheres no grupo do WhatsApp que abrimos para falar sobre maternidade cannábica, e muitas chegam vulneráveis, sem qualquer informação e suporte”, comenta Marcelle.

Dona do perfil @maeconheira, criado em 2017 e com mais de 100 mil seguidores, a carioca Luiza*, que mora na França, diz que seus dois filhos adolescentes cresceram com uma visão naturalizada da planta, diferente da qual desenvolveu sob influência familiar. “Tinha um julgamento de que era a porta de entrada para outras drogas”, relembra. A cientista social, de 49 anos, ainda conta que a caçula, de 16, demonstra mais curiosidade sobre o consumo de drogas como o álcool. O primogênito, de 19, nunca teve interesse por qualquer substância. “Não apoio essa prática na juventude. Agora, é um alívio ver que estão virando adultos de sucesso, meu filho estuda na Sorbonne. Se tivessem ido para um caminho errado, o primeiro motivo que apontariam é o fato de eu fumar maconha.”

Luiza preferiu não revelar seu nome verdadeiro para se blindar de possíveis ataques e problemas com a Justiça. A escritora Maíra Castanheiro, por sua vez, tornou-se publicamente uma ativista. Em 2020, lançou o livro “Diário de uma mãeconheira”, uma seleção de crônicas postadas numa página do Facebook, em 2015, que falavam sobre a rotina com sua filha, Maria Alice, e o uso recreativo da planta. Em 2019, Maíra chegou a perder a guarda da criança, hoje com 11 anos, sendo retomada no ano passado. “O pai não aceitou que eu a levasse para Florianópolis comigo, e o advogado dele usou os prints das postagens no recurso. Senti que foi uma decisão arbitrária do juiz. Não me foi pedido sequer um exame toxicológico, nem uma reunião com assistente social”, conta ela, que coloca as mães como as protagonistas da luta pela legalização da cannabis. “São aquelas que pedem por remédios à base da erva para seus filhos, e as que os perdem na guerra às drogas.”

A advogada Ana Borela pondera a dificuldade em comentar o caso, pelos processos ocorrerem em segredo de Justiça. “Quando o juiz decide pela guarda unilateral, de algum modo, ele entende que um dos genitores não está apto à guarda compartilhada. Mas isso pode ser revisto a qualquer momento.” Tomara.

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