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'Orgasmo cerebral': vídeos que prometem relaxamento viram febre na internet

A ideia é combater insônia e ansiedade
Sweet Carol Foto: BobToledo / Reprodução
Sweet Carol Foto: BobToledo / Reprodução

Orgasmo cerebral. Este é o apelido que a internet deu à resposta fisiológica provocada pelos vídeos de ASMR (sigla para autonomous sensory meridian response ou, em bom português, resposta sensorial autônoma do meridiano), atual fenômeno do YouTube. Em outras palavras, são reações físicas, como arrepios e formigamento na cabeça e na coluna, a estímulos visuais e auditivos.

Funciona assim: diante da câmera, youtubers fazem movimentos lentos e repetitivos, como o de um lápis escrevendo sobre a folha, e sussurros e ruídos suaves, tipo o de amassar papéis. Do outro lado, o espectador vai relaxando. Em “Vídeo para dar soninho”, Mariane Carolina Rossi, dona do canal Sweet Carol, o maior do Brasil sobre o assunto (1,2 milhão de assinantes e vídeos que somam 220 milhões de visualizações), bate e arrasta as unhas sobre uma caixa de papelão e faz os sons “tuc tuc” e “sh sh” com a boca. Em outro, varre suavemente a lente com um pincel de maquiagem enquanto sussurra palavras gentis. O foco está no rosto dela, como se o vídeo estivesse sendo feito para quem assiste, dando sensação de proximidade e intimidade.

— É utilidade pública, afinal, o mal atual da humanidade é estresse e falta de sono — diz a paulista Carol, de 25 anos.

A jovem criou um canal para falar sobre bullying na escola, mas mudou o foco para ASMR depois que uma seguidora disse que sua voz era “calminha e ajudava a dormir”. Passou a ganhar dinheiro e trocou a carreira de enfermeira pela de ASMRtist, como é conhecido quem faz esse tipo de vídeo.

— Vi imagens de uma mulher fazendo sons com embalagem e me lembrei de como eu ficava relaxada ao ver pessoas mexendo em embrulhos plásticos — conta Carol, a primeira no Brasil a adaptar a técnica ao português.

Ana Gutierrez Foto: Reprodução
Ana Gutierrez Foto: Reprodução

E o céu é o limite para a criatividade. Semana passada, Carol criou um vídeo no estilo roleplay (que reproduz cenas do cotidiano, como uma ida ao dentista), inspirado em Bettina Rudolph, a jovem milionária que virou meme. Vestida como ela, Carol reproduz sons de escritório, como o digitar no teclado do computador. Também há vídeos focados em comida e no objeto de relaxamento, como slime e sabonetes sendo esculpidos com estilete.

A técnica de ASMR disseminada por Carol no país ganhou seguidores. A curitibana Ana Gutierrez, de 24 anos, criou há dois anos o seu próprio canal, o Lá nas Alturas. Tudo começou quando ela estudava para o ENEM e não conseguia se concentrar. Hoje, Ana conta com mais de 76 mil inscritos e vídeos que somam 6 milhões de visualizações.

Slime Foto: Reprodução
Slime Foto: Reprodução

Os canais de relaxamento começaram a fazer sucesso em 2015, nos Estados Unidos, quando o ASMR se disseminou na internet, prometendo combater ansiedade e insônia. De acordo com o Google Trends, as buscas no YouTube para ASMR mais que dobraram de janeiro de 2018 a janeiro de 2019. São 13 milhões de vídeos sobre o tema. Já o Instagram registrou mais de 5 milhões de vídeos do tipo, o que colocou o ASMR como uma das grandes tendências de 2018 na rede social. Se a popularidade é grande, o embasamento científico é praticamente zero.

Barulho da boca sugando comida também relaxa Foto: reprodução internet
Barulho da boca sugando comida também relaxa Foto: reprodução internet

— Não temos pesquisas que comprovem a eficácia desses vídeos como promotores do sono — diz a neurologista Andrea Bacelar, presidente da Associação Brasileira de Sono. — Mas como não é nocivo, também não é contraindicado.

O psicólogo e pesquisador do Instituto D’Or Ronald Fischer afirma que há alguns estudos, porém poucas certezas.

— O que sabemos é que, talvez, haja uma diferença nas conexões cerebrais que faça com que algumas pessoas tenham realmente uma maior sensação de relaxamento e bem-estar.