Época Brasil

Guarda-chuvas compõem 'look ostentação' em baile funk

Modismo teve início em raves nos EUA e acabou replicado em festas da periferia paulistana
PA São Paulo ( SP ) 08/11/2019 Pancadão de Paraisopolis. Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo Foto: Agência O Globo
PA São Paulo ( SP ) 08/11/2019 Pancadão de Paraisopolis. Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo Foto: Agência O Globo

Com ou sem nuvens no céu, eles estão lá. Em meio ao funk no som máximo e sinalizadores coloridos, guarda-chuvas sobem e descem o tempo todo na multidão do Baile da DZ7, em Paraisópolis, Zona Sul de São Paulo.

Se é cafona chamá-los de guarda-chuvas ("o nome é umbrella, tá ligado?"), é ainda menos descolado julgá-los pela presença nas festas. Quem tem, ostenta, quem não tem, passa vontade.

A moda do guarda-chuva surgiu nas raves e "pool parties" americanas, como proteção do sol, mas acabou se transformando numa manifestação de orgulho dos jovens que portavam e exibiam marcas como a Oakley.

O Baile da 17, que acontece semanalmente em Paraisópolis, onde nove jovens morreram pisoteados Foto: Agência O Globo
O Baile da 17, que acontece semanalmente em Paraisópolis, onde nove jovens morreram pisoteados Foto: Agência O Globo

A empresa fundada em 1975 por Jim Jannard é hoje referência da cultura da ostentação. Na periferia, a regra é: "Não importa se a roupa é feia, desde que seja Oakley".

"As umbrellas começaram a aparecer em meados de 2006 nos Estados Unidos. As pessoas levavam os guarda-chuvas para se protegerem do sol nas raves, mas acabavam dançando com eles, e a galera gostou disso", diz Tony Silveira, também conhecido como Casper.

Ele é dono da página no Facebook "Oakley Info BR", criada para divulgar a marca, sem vínculos oficiais, e coleciona produtos da empresa há cinco anos.

Casper afirma que as primeiras umbrellas usadas com esse novo intuito eram da Oakley, o que acabou popularizando a marca como modelo da tendência. Elas foram logo adotadas pelos chamados bondes da Oakley, grupos de pessoas que vão a raves vestindo a marca da cabeça aos pés.

"Quando foi lançada nos Estados Unidos, a umbrella custava entre US$ 35 até US$ 50. Hoje em dia, elas valem entre R$ 700 e R$ 8 mil. Não todos produtos valem a mesma coisa. Depende também do grau de raridade de cada modelo, de acordo com a quantidade circulando no mercado", diz Casper.

Os guarda-chuvas não são fabricados pelas marcas que estampam o produto, que acabaram terceirizando a produção. Por isso, não é possível encontrá-los nos sites das empresas esportivas.

As vendas se dão em grande parte no mercado informal, principalmente pelo eBay, site internacional de comércio eletrônico, e em grupos de Facebook. No Brasil, a maioria é importada.

Apesar de ter ajudado a alavancar a tendência, a Oakley divide espaço com muitas outras marcas, como Nike, Ferrari, Mizuno, Lacoste, Puma, entre outras.

O baile DZ7 uma semana após a morte de 9 jovens pisoteados pela ação da PM Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo
O baile DZ7 uma semana após a morte de 9 jovens pisoteados pela ação da PM Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo

O acessório foi importado pelos brasileiros no começo desta década e surgiu com força nos bailes funk de São Paulo. Os funkeiros dizem que a moda é vista como paulistana e que causa estranheza em quem vem de outros estados.

Coreografia do guarda-chuva

Morador de Paraisópolis, Edilson Ribeiro da Silva, de 19 anos, "cola" no Baile da DZ7 preparado. Ele veste até uma luva própria para passar a madrugada "chaveando" sua umbrella.

"Ah, é da hora, parça. Você está lá no meio do tumulto, embrasando e começa a esquentar, não é? Aí você balança o guarda-chuva, faz vento e as minas ficam pirando. É só balançar para cima e para baixo que as minas gostam", disse ele.

Ao seu lado, o amigo Lucas Magalhães, de 17 anos, mostrava seu guarda-chuva "paraguaio" da Nike. "Quando está calor, a gente faz vento pras minas, tá ligado? A gente faz assim, rodando", afirma ele, manobrando o objeto com rapidez. Ao seu redor, quase todas as umbrellas estavam nas mãos dos garotos — unânimes em afirmar que o sentido era impressionar as meninas.

Ali perto, dois comerciantes olhavam reticentes as umbrellas subirem e descerem no pancadão. Questionados sobre o que pensavam delas, os dois se entreolharam. "Se chover, esses aí tomam chuva", disseram, rindo. "É caro demais pra molhar, tem de deixar em casa".