Coluna
Thiago Prado É editor-adjunto de País de O GLOBO. Trabalhou na revista "Veja" (2010-2018) e no jornal "O Dia" (2006-2010)
O jornalista Thiago Prado Foto: Marcelo Carnaval / Agência O GLOBO

Erros em pesquisas reforçam cenário imprevisível de eleições no Rio

Em 2014, 2016 e 2018, números do Ibope foram diferentes do resultado no estado

O Ibope comemorou na semana que passou o desempenho das suas pesquisas eleitorais neste ano. "Houve acerto de quem foi para o segundo turno em 25 das 27 unidades da federação", escreveu o jornal O Estado de S. Paulo na última terça-feira. Méritos para o instituto, não é fácil cravar resultados em um cenário tão volátil como o do Brasil.

No Rio de Janeiro, no entanto, o Ibope acumula erros nas últimas três eleições. A diretora do instituto, Marcia Cavalari, admite que "precisa estudar a fundo" o que ocorreu no estado. As imprecisões tornam ainda mais nebuloso o cenário para 2020.

Aos números do passado: na disputa para governador, em 2014, Anthony Garotinho foi apontado no dia da eleição pelo boca de urna do Ibope (pesquisa feita após a votação) com 28% dos votos, o suficiente para superar Marcelo Crivella (18%) e enfrentar Luiz Fernando Pezão no segundo turno. Quando o resultado saiu, Garotinho marcou apenas 19,7% e Crivella, 20,2%.

Em 2016, os dados na direção incorreta atingiram Flávio Bolsonaro, hoje senador eleito. Na última pesquisa divulgada pelo Ibope antes do domingo da eleição para prefeito, ele aparecia com 8% dos votos válidos. Quando as urnas se abriram, Flávio teve 14%, patamar próximo ao de Pedro Paulo Carvalho e Marcelo Freixo, que disputaram até o fim uma vaga no segundo turno contra Marcelo Crivella.

Este ano, por mais que o Ibope diga que identificou o crescimento de Wilson Witzel na reta final do primeiro turno, repare o que ocorreu no sábado, dia 26, um dia antes da votação. O instituto apontou Eduardo Paes como líder com 32% dos votos válidos; Romário, 20%; Witzel e Indio da Costa, 12% cada. No domingo, a Justiça Eleitoral informou: o ex-juiz alcançou inacreditáveis 41%; Paes, 19%; e Tarcísio Motta ficou em terceiro, com 10%. Romário, com 8,7%, e Indio (5,9%) minguaram.

No segundo turno, mais uma projeção que não correspondeu à realidade. Imaginávamos que Paes estava conseguindo reduzir a vantagem para Witzel. No sábado, Ibope e Datafolha deram, respectivamente, uma diferença de apenas 8 e 6 pontos percentuais de votos entre os dois concorrentes. Encerrada a apuração, Witzel obteve 59,87% dos votos contra 40,13% de Paes. Foram quase 20 pontos de vantagem.

Fica muito difícil projetar algo para as eleições de 2020 se nem as próprias pesquisas conseguem captar corretamente o que acontece na cabeça do eleitor do Rio de Janeiro. Previsibilidade não é mais uma palavra possível de ser usada na política fluminense. Depois da trinca capitão-juiz-bispo, teremos mais novidades nos próximos anos?

Como exercício de futurologia, fui ouvir os próprios políticos que, em tese, poderiam estar na disputa para prefeito em 2020. Primeiro, recorri aos nomes tradicionais de sempre. "Perdi a eleição e estou negociando convites de trabalho (um deles para presidir o Jornal do Brasil)", desconversou Paes sobre concorrer. "Vou tocar o PSD e voltar para a minha profissão: a advocacia", diz Indio. "Nem sei o que vou comer amanhã. Muito cedo", afirma Pedro Fernandes, candidato derrotado ao governo, que apoiou Witzel no segundo turno. "Se tiver eleição...", respondeu Marcelo Freixo, pessimista sobre o futuro do Brasil.

O novo polo de poder bolsonarista também terá, certamente, um candidato a apresentar no Rio. Pela lei, os filhos Eduardo, Carlos e Flávio não poderão concorrer ao Executivo porque o pai assumirá a presidência da República. Será que a família apostará em Rodrigo Amorim, do PSL, deputado estadual mais votado do Rio após quebrar uma placa que homenageava a vereadora morta Marielle Franco?

Com a palavra, o próprio parlamentar eleito: “Ainda é prematura essa definição. Sou disciplinado e meu líder é o senador Flávio Bolsonaro. O fato é que o PSL deverá ter sim um protagonismo. As urnas demonstraram em 2018 o desejo do eleitor fluminense em romper o sistema e a velha política. No município do Rio não será diferente em 2020”, diz Amorim.

Fato é que, como mostra Thiago Herdy na Época desta semana, grupos de WhatsApp bolsonaristas continuarão ativos e mobilizados de olho na disputa de 2020. Depois de eleger governadores e deputados federais e estaduais, a meta será invadir prefeituras e Câmaras de Vereadores pelo Brasil.

Na disputa pela Prefeitura do Rio, também não podemos esquecer de Crivella, que, a despeito da baixa popularidade, deverá tentar a reeleição. Perguntado se assim o fará, me mandou um vídeo em que chama de 'fake news' todas as matérias que falam de cortes no projeto das clínicas da família. Crivella tem agido desta forma o ano inteiro. Na eleição, não deu nenhuma entrevista. Ele sumiu completamente do debate público. Complicado imaginar uma recondução ao cargo mantendo essa postura.

“Ele é candidatíssimo”, diz Isaías Zavarise, assessor-chefe do gabinete de Crivella, que afirma ser impossível vermos novamente um ‘tsunami bolsonarista’ como o de 2018. “Na política temos ciclos. Se o Bolsonaro não conseguir governar conforme a expectativa dos eleitores, teremos mudança novamente no futuro”. O nome disso é democracia, a propósito.

Para fechar, reproduzo aqui a análise que fiz na semana passada para O Globo sobre Eduardo Paes e seu redimensionamento na cena política fluminense nos últimos três anos. Já dizia o ex-governador e ex-senador mineiro Magalhães Pinto: “Política é como nuvem. Você olha e ela está de um jeito. Você olha de novo e ela já mudou”.

***

Em março de 2015, no mês seguinte à sua eleição para a presidência da Câmara, um poderoso Eduardo Cunha começou a defender publicamente a candidatura do PMDB à Presidência da República: “Eduardo Paes é o meu candidato”, cravou. Às vésperas da Olimpíada do Rio, a ideia começou a ser defendida por peemedebistas e seduziu o então prefeito carioca.

Seus estrategistas consideravam que a organização dos Jogos seria a grande vitrine para o projeto rumo ao Planalto. Dias depois de Cunha, o próprio Paes tratou do tema em entrevista para ‘Veja’: "Não tenho a menor dúvida de que será a hora de o PMDB lançar uma candidatura própria à presidência da República”. Após a insistência na pergunta sobre se o seu nome seria uma possibilidade, brincou: “Bota o jingle aí”.

Em três anos, desceu a ladeira a popularidade do ex-prefeito. Paes não conseguiu emplacar o sucessor na prefeitura do Rio; viu aliados como Sérgio Cabral, Jorge Picciani e Paulo Melo serem presos acusados de corrupção; e acabou envolvido na operação Lava-Jato, seja por aparecer em um áudio desastrado falando sobre Maricá com o ex-presidente Lula, seja pelas citações em delações premiadas de executivos de empreiteiras.

Ciente do abalo na imagem, Paes submergiu desde janeiro de 2017. Morou fora do país, sumiu das entrevistas e deixou para a última hora o anúncio da candidatura ao governo. Planejamento perfeito, não fosse a surpreendente onda Wilson Witzel. No domingo passado, dos 92 municípios do estado, Paes venceu apenas em Rio das Flores, Niterói e na capital, que governou por oito anos.

Se por um lado fica claro que as ambições de voos mais altos foram redimensionadas, por outro é possível dizer que o futuro político do ex-prefeito segue em aberto. Marcelo Crivella faz um governo impopular no Rio (sequer elegeu seu filho para deputado federal) e, até hoje, Paes não virou réu em nenhum processo da Lava-Jato.

As eleições de 2020 para prefeito do Rio são logo ali e a política é uma montanha russa. Geraldo Alckmin ficou em terceiro lugar na disputa pela prefeitura de São Paulo em 2008. Depois, elegeu-se governador do estado duas vezes no primeiro turno. Esse ano, teve apenas 4,7% dos votos para presidente. Há dois anos, Flávio Bolsonaro era chacota por ter quase desmaiado em um debate na TV para prefeito. Hoje é o senador mais votado do Rio.

Paes tem 48 anos e, por mais que diga agora que vai procurar emprego na iniciativa privada, seu habitat natural é a política.

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