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Feminismo em debate na Casa Época & Vogue

Fernanda Young participou de mesa ao lado de Dedé Laurentino e Silvia Rogar na Festa Literária de Paraty
Fernanda Young e Dedé Laurentino em debate na Casa de Não Ficção ÉPOCA & Vogue Foto: Foto:Marcelo Saraiva
Fernanda Young e Dedé Laurentino em debate na Casa de Não Ficção ÉPOCA & Vogue Foto: Foto:Marcelo Saraiva

Na manhã desta quinta-feira (26), no centro histórico de Paraty, a Casa de Não Ficção ÉPOCA & Vogue abriu as portas com uma discussão sem censura sobre um dos temas mais urgentes dos nossos dias: o feminismo. A mesa "O feminino e o feminismo" reuniu os escritores Fernanda Young e Dedé Laurentino e a diretora de Redação da Vogue Silvia Rogar, que discutiram a ascensão do conservadorismo e da intolerância, a pertinência de estrangeirismos como "empoderamento" e as inúmeras definições e desafios do feminismo.

Young publicou recentemente seu primeiro livro de não ficção Pós-F: para além do masculino e do feminino (LeYa), um relato autobiográfico repleto de reflexões sobre as homens e mulheres -- reflexões politicamente incorretas, é claro, como é do feito da escritora. "Foi uma jornada curiosa. Quis falar da minha experiência. Não é um observação científica, é muito biográfico", disse.

No palco, Young contou um pouco sobre sua jornada feminista. Na adolescência, ela se identificava como feminista, mas, embalada pela efervescência dos anos pós-ditadura, abandonou o rótulo: afirmar a diferença não fazia mais sentido num mundo que prometia um futuro de liberdade. "Protegida pelo meu meio privilegiado, eu pude expandir minha liberdade e parei de usar o termo. Para mim, a exclusão do termo era a verdadeira liberdade", afirmou. "Hoje muito me choca a necessidade de ter que me dizer feminista como tanta veemência." Young contou que voltou a reinvindicar o rótulo depois que uma de suas filhas lhe disse que sua recusa do termo "feminista" era um "desserviço".

Debate também abordou os discursos de ódio na internet Foto: Foto: Marcelo Saraiva
Debate também abordou os discursos de ódio na internet Foto: Foto: Marcelo Saraiva

Young pode ter feito as pazes com o adjetivo "feminista", mas ainda tem alguns problemas com um ou outro substantivo que orbitam o feminismo -- especialmente se forem traduções pouco poéticas do inglês. Rogar perguntou a Young por que ela não gostava da palavra "empoderamento", repetida com frequência nos discursos feministas. "Porque é feia", respondeu. "E virou moda. Tudo o que é moda tende a cair no esquecimento. Eu não quero esse termo porque não quero poder. Poder é uma coisa burra, é egoico, é estúpido." Laurentino contemporizou: "A melhor definição do termo empoderamento para mim é a conquista da liberdade."

Laurentino também falou sobre outro termo popular nos debates feministas: o "lugar de fala". "Eu fiquei pensando o que eu poderia trazer para essa conversa sendo eu um homem", disse. "Esse negócio do lugar de fala é importante. Eu posso me envolver o quanto eu quiser com o feminismo, mas jamais vou experimentar o que é ser mulher na pele. Mas isso não quer dizer que eu não possa trazer uma opinião que não interrompa e que ajude a conversa a avançar." Laurentino contou que uma de suas filhas, uma menina de 12 anos, aproveitou as férias escolares, para escrever uma redação afirmando-se feminista, com exclamações e caixa alta. "Ela nunca ouviu falar de Simone de Beuavoir, mas sabe que ser mukher é diferente."

A conversa também enveredou pela ascensão de discursos truculentos que inundam as redes sociais. "Eu fico muito impressionada como a comunicação virtual abre margem para a burrice", disse Young. "É assustador, mas não devemos ficar assustados ou amendrontados". Ela complentou: não podemos permitir que os discursos de ódio cerceiem o direito à fala -- e ao riso -- de quem discorda do coro dos intolerantes. "Nós somos censores e censurados o tempo todo.  Fazer rir é cirúrgico e necessário. A primeira coisa que o fascismo faz é exlcuir o humor. O fundamentalista não tem humor nem empatia."

Young e Laurentino também aproveitaram o palco para compartilhar angústias e experiências pessoais. Laurentino confessou que considera "assustador" criar meninas hoje -- ele tem duas filhas. Ele teme que os adolescentes aprendam os códigos do sexo apenas por meio da pornografia disponível na internet. Young, mãe de quatro filhos, contou que parou até de beber quando virou mãe, na tentativa de fazer tudo perfeito. Não deu muito certo. "Você está estranhíssima", disse o marido, recomendando qua ela permitisse que as filhas conhecessem quem ela realmente era. Young, que já posou nua, também comentou que acha esquisita a relação brasileira com a nudez e confessou que volta e meia posta fotos de manilos no Instagram. Só para provocar.

A plateia também participou. Uma mulher que assistia à conversa da rua interrompeu para contar de seu otimismo, pois percebe que a geração de sua filha, que acaba de ingressar na universidade, é bem mais tolerante. "Isso também é graças à você", disse Young, do palco, reafirmando a importância da educação e do debate na conquista da liberdade.