Aos 33 anos, o atacante Thiago Galhardo, do Fortaleza, faz terapia duas vezes na semana para poder lidar com as questões que o desafiam: as críticas diárias ao seu trabalho, que se multiplicam nas redes sociais e às vezes extrapolam o lado profissional; a culpa por não ser tão presente na vida dos filhos — João Gabriel, de 7 anos, e Bernardo, de 5 — que não moram com ele; a angústia de ter que abdicar de tanto na vida pessoal para cumprir o objetivo de jogar futebol. Ao GLOBO, ele revela um pouco do mineiro de São João del Rei (MG) que existe por trás do atleta.
Qual é o seu maior sonho?
Voltar a defender a seleção. Também quero ser para os meus filhos o que ainda não consegui por causa do futebol. Quando me aposentar, quero viver para eles, que não moram comigo, são de mães diferentes. Quero levá-los à escola, passar o aniversário, o Dia das Crianças, levá-los para viajar, passear... Vou tirar um ano para ser o melhor pai do mundo, fazer as coisas que mais amo com eles. Hoje, eu os vejo pouco. Um mora no Rio, o outro, em São Paulo.
Como é ser pai para você?
Foi o que mudou a minha vida. Até a profissional. Meu filho mais velho foi minha maior benção. Demorei a entender minha situação de pai. No ano seguinte ao nascimento dele, fui para o Japão. Perdi todo o início, as primeiras palavras, mas ele não sabe o quanto me fez estar onde estou. Agora trabalho por eles. Você acaba não sendo presente, não dá banho, não dorme junto... Hoje temos uma relação melhor. Eles cobram gol e tudo.
Em quem você se inspira?
Meu pai e alguns pais de amigos. Não tenho o pai perfeito, fui pegando o que era viável de cada um e me tornei o que considero ideal. Sabemos que vamos falhar, que temos coisas do passado que nos incomodam. Tento não passar para meus filhos aquilo que me fez mal. Minha relação com meu pai é boa, ele foi um ótimo jogador. Todo mundo brincava que aprendi com ele. Tivemos muitas diferenças sobre criação, futuro profissional. Ele não gosta de viajar de avião, de abrir mão da rotina, então fica um pouco distante. Mas não vejo problema nisso. A gente se ama.
- Wellington Silva, Cuiabá: 'Se pudesse voltar no tempo, mudaria muitas coisas'
- Tchê Tchê, Botafogo: 'Já tive depressão; tem quem não entenda e ache que é frescura'
E a relação com sua mãe?
Apesar das imperfeições, se estou aqui hoje, é por causa dela. Abriu mão da vida dela por mim. Foi para o Rio me dar toda a estrutura necessária para eu viver meu sonho. Retribuí ajudando-a a se formar em Direito. Hoje ela trabalha com isso. Apesar das nossas mil diferenças de pensamento, nos respeitamos muito. Temos um amor grande um pelo outro.
É verdade que você já decidiu se aposentar em 2025?
Defini em 2009, quando comecei a jogar bola, pela vida que a gente leva. As pessoas veem glamour, mas não sabem o quanto o ser humano sofre. Só entendi isso depois de ver meus pais sofrerem com xingamentos. E o tanto que abrimos mão do pessoal para viver o futebol. Agora, quero abrir mão do profissional para viver com meus filhos.
Qual o pior momento que viveu?
No pessoal, a perda da minha vó. Não é clichê, pensei em parar de jogar futebol. Meus pais falaram que eu deveria continuar por ela. No profissional, em 2014, me vi no fundo do poço. Joguei no Boa Esporte (MG), fui muito maltratado lá. Depois fui para Cametá (PA), uma das piores cidades para se jogar. Foi um momento em que me vi sozinho. Não tive apoio de ninguém. No Brasiliense (DF), consegui reencontrar o foco. Muitas pessoas não têm uma segunda chance, eu tive.
Por quem você joga?
Pela minha avó.