Benjamin Netanyahu nunca priorizou a libertação dos reféns israelenses capturados pelo Hamas no atentado de 7 de outubro. Caso a prioridade fosse a libertação desses pais, mães, filhos e filhas que há 11 meses sofrem nas mãos terroristas, eles certamente já teriam voltado para suas famílias. Alguns deles não teriam sido mortos, como os seis jovens assassinados pelo Hamas na semana passada.
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A prioridade do premier israelense é agradar a seus aliados na coalizão de ultradireita que querem uma ocupação permanente da Faixa de Gaza. Ao longo das negociações para um cessar-fogo, Netanyahu sempre impõe novas condições para sabotar um acerto. Uma parcela gigantesca da população israelense, incluindo os principais grupos de parentes de reféns, sabe disso e começou a organizar manifestações com centenas de milhares de pessoas em Tel Aviv, Jerusalém e outras cidades. Defendem um acordo imediato, ainda que possa ser visto como injusto ou coloque em risco a segurança de Israel no longo prazo.
As bases do acordo são conhecidas. Não há divergências sobre a primeira etapa, quando, ao longo de seis semanas, reféns civis seriam libertados em troca de prisioneiros palestinos nas prisões em Israel. As forças israelenses se retirariam dos principais centros populacionais de Gaza e interromperiam as ações militares. O problema se dá na segunda etapa, na qual reféns militares israelenses nas mãos do Hamas seriam trocados por outra leva de prisioneiros palestinos.
Associada a essa troca, Israel precisaria se retirar de toda a Faixa de Gaza, de acordo com o texto da resolução 2735 das Nações Unidas, com texto apresentado pelos EUA e aprovação de 14 dos 15 membros (a Rússia se absteve). Netanyahu não aceita e impõe que Israel mantenha presença militar no corredor Filadelfia, na fronteira entre Gaza e o Egito, e outra no corredor Netzarim, dividindo território palestino em dois.
O argumento do Netanyahu é o de que não pode fazer concessões ao Hamas. Mas como resgatar os reféns? Cerca de cem foram libertados quando houve um acordo transitório de cessar-fogo no final do ano passado. Desde então, apenas 8 foram resgatados e talvez dezenas tenham sido mortos. O prosseguimento do conflito certamente levará a mais mortes de reféns, além de milhares de palestinos, incluindo crianças — já são mais de 40 mil mortos.
A oposição e os parentes de reféns sabem que o verdadeiro objetivo de Netanyahu é se perpetuar no poder. O premier precisa dos radicais no seu governo, que ameaçam deixar a coalizão se ele aceitar o cessar-fogo. Querem recolonizar Gaza, com novos assentamentos, e expulsão ao menos de parte dos palestinos. Caso deixe o poder, o primeiro-ministro sabe que pode acabar atrás das grades.
Além da libertação dos reféns, Israel teria um outro benefício com um cessar-fogo. Afinal, o Hezbollah já deixou claro que imediatamente suspenderia suas ações contra Israel. Dezenas de milhares de israelenses poderiam retornar para a sua casa no norte do país. Mas Netanyahu, insisto, apenas se importa com ele e seu filho, que vive na boemia em Miami enquanto milhares de israelenses de sua idade precisam lutar na guerra.