Bolsonaristas sentem mais orgulho de junho de 2013 do que petistas, revela pesquisa Ipec/O GLOBO

Para 21% dos que votaram no ex-presidente em 2022, manifestações trouxeram mais consequências positivas, contra 16% entre pessoas que escolheram Lula

Por Flávio Tabak, Guilherme Caetano e Hyndara Freitas — São Paulo


Manifestação no centro do Rio de Janeiro, em 20 de junho de 2013. Protesto reuniu cerca de 300 mil pessoas na Av. Presidente Vargas, terminando em confrontos entre manifestantes radicais e a PM Thiago Freitas / Agência O Globo

Os dois polos da política nacional têm lados distintos sobre as manifestações de 2013. A pesquisa Ipec/O GLOBO revela que os eleitores do ex-presidente Jair Bolsonaro guardam sentimentos mais positivos sobre os atos do que os do presidente Lula. Embora as manifestações tenham sido vinculadas à esquerda em um primeiro momento, é comum na nova direita a interpretação de que 2013 foi o início de uma jornada que culminou no impeachment e na eleição de Bolsonaro. Os resultados do Ipec comprovam esse sentimento.

A pesquisa revela uma tendência geral de descontentamento com 2013, com somente 16% das pessoas se dizendo orgulhosas de terem apoiado os atos. No entanto, entre as pessoas que votaram em Bolsonaro, o resultado salta para 21%. Já entre quem diz ter votado em Lula, os orgulhosos com os atos caem para 13%.

Relembre as manifestações que pararam o Brasil em 2013

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Também é ligeiramente maior o número dos entrevistados que votaram em Lula arrependidos de terem apoiado as manifestações daquele ano (5%), contra 3% de quem escolheu Bolsonaro em 2022. A pesquisa ainda identificou que 39% das pessoas que votaram em Bolsonaro em 2022 não apoiaram os atos de junho de 2013 e não se arrependem disso, enquanto entre eleitores de Lula o índice é um pouco maior, 43%, ainda dentro da margem de erro de dois pontos percentuais para mais ou menos. O esquecimento também é maior entre os petistas: 25% deles dizem não se lembrar das manifestações, contra 22% dos eleitores de Bolsonaro.

As respostas sobre orgulho e arrependimento — Foto: Editoria de arte Ipec/O GLOBO

Entre aqueles que votaram nulo ou em branco em 2022, 11% disseram aos pesquisadores ter orgulho de ter ido às ruas, e 40% afirmaram não ter apoiado e que não se arrependem disso.

Para o professor Christian Lynch, do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Iesp-Uerj), apesar de o significado de Junho ser disputado por grupos políticos diversos, a série de derrotas que a esquerda teve a partir de 2013 “contaminou” sua interpretação dos protestos.

— Tendo em vista tudo o que ocorreu depois, sempre no sentido de acontecimentos excepcionais destinados a depor e eliminar a possibilidade de a esquerda voltar ao poder, como Lava-Jato, impeachment de Dilma, cassação dos direitos eleitorais de Lula, eleição de Bolsonaro e quase criminalização da esquerda, é natural que os eleitores de Lula tenham más lembranças do evento que deflagrou aqueles acontecimentos — diz Lynch.

Os resultados no cruzamento por voto em 2022 — Foto: Editoria de arte Ipec/O GLOBO

Nova direita

Em outra pergunta do questionário, mais um sinal da preferência bolsonarista por 2013. Entre os eleitores de Lula, 38% consideram que os protestos trouxeram consequências negativas ou mais negativas do que positivas. Entre os eleitores de Bolsonaro, o número cai para 30%.

Por outro lado, 21% dos bolsonaristas afirmam que as manifestações tiveram consequências muito positivas ou mais positivas que negativas, enquanto, entre os lulistas, 16% têm a mesma opinião. Para 24% dos eleitores de Bolsonaro, não houve consequências nem positivas nem negativas, e 18% dos eleitores de Lula têm essa opinião mais neutra. E, para 29% dos lulistas, as consequências foram muito negativas, enquanto entre os eleitores de Bolsonaro esse número cai para 19%.

Os protestos foram positivos ou negativos? Resultados por eleitores de Lula e Bolsonaro — Foto: Editoria de Arte Ipec/O GLOBO

Para o cientista político Renato Dorgan, do Instituto Travessia, esses resultados fazem parte de uma lógica que envolve o ex-presidente abraçando o discurso da antipolítica e do combate à corrupção com força, enquanto PSDB, rival histórico do PT nos pleitos federais, também se viu envolvido em investigações sobre corrupção, como a Lava-Jato.

Classes médias

O cientista político avalia ainda que 2013 significou o nascimento de uma revolta generalizada contra a política, que culminou com o fortalecimento de “outsiders” e mais liberais, como o Movimento Brasil Livre, o Partido Novo e também o bolsonarismo:

— Em 2013 surge uma insatisfação contra o sistema, contra a política brasileira daquele momento, que era muito o PT e as alianças do partido com o Centrão. A partir de 2016 cresce uma antipolítica e os discursos mais totalitários, da ordem e dos costumes. Em 2016 há a vitória de outsiders, como João Doria, e depois vem 2018 com Bolsonaro e a vitória de políticos do MBL. Aquele movimento não foi de massas, mas sim de classe média predominantemente.

Para a cientista política Luciana Santana, da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), “ao longo prazo, pessoas que se apropriaram dos discursos anticorrupção e dessas manifestações tornaram-se bolsonaristas”, o que poderia explicar a maior afinidade aos atos de 2013.

O Ipec entrevistou presencialmente 2 mil pessoas de 127 municípios, entre 1º e 5 de junho. A margem de erro é de dois pontos para mais ou para menos dentro de um intervalo de confiança de 95%.

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