'The White Lotus': um passeio pelo caldeirão de culturas, cores e sabores da Sicília, no Sul da Itália

A maior ilha do Mar Mediterrâneo serviu de cenário para a segunda temporada da série

Por Luciana Fróes, O Globo — Rio de Janeiro


Personagens da série 'The White Lotus' numa das muitas cenas gravadas na Sicília, sul da Itália Divulgação

O seriado "The White Lotus" explorou (e deixou todos extasiados com) as belezas da Sicília, no Sul da Itália, de menos de 26 quilômetros quadrados de extensão (sim, só isso) e perto de cinco milhões de habitantes. Mas não ponha os pezinhos nessa parte da "bota" achando que a turma ali calça Ferragamo ou veste Prada. A impressão que se tem (apesar do luxo extremo que vemos de pano de fundo no seriado) é que a praia ali é outra.

A maior ilha do Mediterrâneo é um caldeirão de sabores, história e culturas. Remonta a gregos, romanos, espanhóis, cartagineses, normandos, fenícios e árabes (ufa), que andaram por lá e deixaram rastros. Conquistada e abandonada, ocupada e disputada, a região mistura um pouco de cada um desses povos, seus rastros são perceptíveis em cerâmicas (lindas), gastronomia, arquitetura, comportamento... É um mostruário surpreendentemente harmonioso. E adorável.

Veja fotos: conheça o hotel na Sicília onde foi filmada a segunda temporada da série 'The White Lotus'

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San Domenico Palace, em Taormina, já foi um convento católico e já abrigou monarcas e astros do cinema

Trinácia, a medusa com cabelos de serpentes, é o símbolo da Sicília. Está na sua bandeira e pelas portas de restaurantes, estampados nos pratos, nos vasos de planta... Ganha muitas versões, com frutas, flores e cores. O nome foi coisa dos gregos, que há séculos (tudo ali é assim) navegavam pelos mares do Sul e perceberam a forma triangular da ilha. Trinácia vem daí.

É recorrente a definição de que esta parte da Itália é um museu aberto e ao ar livre. Agrigento e Palermo são a prova disso. Só de sítios arqueológicos, a Sicília soma 269 catalogados, entre conjuntos de templos, torres, igrejas, palácios... Tudo lado a lado, um pouco de todos os povos e culturas. Emoldurando esse cenário de cinema (e televisão também), um mar cristalino de águas mornas, límpidas, de tonalidade única, que só se vê ali. E clima gostoso, um pouco caldo no verão, mas nada que um bom mergulho não resolva.

Sítio arqueológico em Agrigento, na Sicília, sul da Itália — Foto: Reprodução / cdavinci / pixabay

A Sicília não é Toscana também na mesa. Queijo? Pecorino. Uvas? A nomenclatura é ótima: catarrato, carricante, frappato, martellato... A mais icônica é a nero d'avola, motivo de orgulho dos locais. Em "The White Lotus", os casais visitam uma vinícola, acho que é a Planeta, que vale conhecer. O exemplar preferido na rodada de degustação foi o Eruzione (erosão em italiano), uma alusão ao Etna, que está logo ali. A Planeta produz e é encontrado no Brasil, a Vivino traz: 90% de carricante e 10% de riesling, sob medida para acompanhar os frutos do mar. O preço é camarada. Aliás, as cifras na Sicília costumam ser mais tolerantes com o bolso do brasileiro do que em algumas outras regiões da Itália.

Palermo é a sua capital, cidade grande, 700 mil habitantes, grande movimentação portuária, avenidas largas contrastando com ruas estreitas (com roupas secando na sacadas, Sofia Loren na veia), feiras livres (melhor tomate da vida) e monumentos, catedrais, teatros, templos por todos os lados. Em menos de meia hora dali, se alcança Mondello, quase uma Barra da Tijuca de Palermo. Para quem quer sossego, o alívio é imediato.

A praia de Mondello, na região de Palermo, capital da Sicília, sul da Itália — Foto: Reprodução / Wikimedia Commons

Mondello é mar, praia de areia fina, que recebe com uma boa infraestrutura hoteleira. E boa mesa. Em mais uma alusão, no Twitter, alguém comentou que os personagens só comiam no hotel. Que erro! Comer em bares e restaurantes pela Sicília é um programa obrigatório. Foi lá que desfrutei de um prato memorável e no endereço tradicional do balneário, o Charleston, uma construção ao estilo do Copacabana Palace, só que encravada no mar: a "fritata", um clássico da ilha, uma combinação de vários peixes locais empanados e sequinhos, pontificada pelo peixe-espada, o principal da Sicília, servido com cuscuz de peixe, prato recorrente por lá. Herança de quem? Dos árabes. Tomamos um rosé Tenuta Rapitalá, que combinava com a coloração da nossa pele pós-praia.

Taormina, Cefalú, Caltanissetta, Catânia, Enna, Marsala (a do vinho), Mondello, Siracusa, Noto, Ragusa, Trapani, Scala dei Turchi... É viagem para mergulhar fundo. Colorida, solar, informal, alegre, religiosa, gulosa, pobre ( em alguns momentos lembra o Brasil), é a mais diferente das regiões da Itália que visitei.

Rua no centrinho de Taormina, na Sicília, cidade onde foram gravadas muitas cenas da segunda temporada da série 'The White Lotus' — Foto: Reprodução / Pixabay

Algumas localidades podem ter um trânsito caótico, onde motoristas não respeitam sinalização alguma. Atônita, perguntei ao motorista do táxi se não existiam regras de trânsito por ali. Rindo, ele me explicou: "Signora, o sinal verde é para seguir em frente, o vermelho é uma sugestão para parar e o amarelo, bem, é para alegrar".

Me senti em casa.

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