Calamidade no Rio Grande do Sul: sistema para conter águas falhou em Porto Alegre; entenda

Capital gaúcha tem 68 quilômetros de diques, muro de contenção, comportas e bombas para proteger cidade, mas houve falta de manutenção por décadas que permitiu o alagamento, segundo especialista em hidráulica

Por — Rio de Janeiro


Rua completamente alagada no bairro Navegantes, em Porto Alegre Carlos Fabal/AFP

Apesar de ter sido criado para suportar até seis metros de elevação, o sistema de contenção de águas do Rio Guaíba em Porto Alegre não aguentou o nível acima dos cinco metros na capital gaúcha. O motivo, de acordo com o professor do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) da UFRGS, Gean Paulo Michel, é falta de manutenção e negligência da prefeitura ao longo de décadas. O sistema começou a operar a partir de 1974.

Questionados, a prefeitura de Porto Alegre e o Departamento Municipal de Água e Esgotos afirmaram que foram investidos R$ 592 milhões em obras relacionadas a prevenção de cheias ou que amenizam situações de alagamentos na cidade. Mas na listagem de investimentos enviada pela prefeitura, não há valores voltados especificamente para a manutenção do sistema de contenção de águas. Leia abaixo como ele deveria ter funcionado.

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Como funciona o sistema de contenção de águas?

O sistema opera com diques, construídos com aterramento da orla, o Muro da Mauá, 14 comportas e 19 casas de bomba. O sistema também tem a função de deter os rios Jacuí e Gravataí. Há prédios e outras edificações em ilhas que não são protegidas por este sistema.

Por onde são distribuídos os diques?

Eles formam uma linha de 68km que vai do Norte da cidade, passa pela região Oeste, onde é banhado pelo Guaíba, e segue à Zona Sul. Há uma linha de 24km ao longo da FreeWay até a Avenida Castelo Branco e segue pela Avenida Rio Branco. E outra de 44km, de diques internos, que servem para conter os arroios (canais naturais) que cortam Porto Alegre.

Gráfico mostra como funciona o sistema de diques e comportas de Porto Alegre — Foto: Editoria de Arte

Onde fica o Muro da Mauá?

Na região central de Porto Alegre, a contenção é feita por um muro, o Muro da Mauá, com 2.646 metros de comprimento e seis de altura. Finalizado em 1974, ele fica ao longo do Canal dos Navegantes, que faz parte do Delta do Jacuí, que, além de pântanos e de um arquipélago com 16 ilhas, recebe o fluxo dos rios Caí, Sinos e Gravataí.

Como funcionam as comportas?

As comportas são estruturas metálicas de até cinco metros de altura, e podem ser usadas inclusive para travessias de pedestres e veículos. Mas são usadas primordialmente para barrar a passagem da água quando ela chega no nível da base que não fica submersa do Muro da Mauá, na altura de três metros. As comportas são dispostas sobre trilhos e empurradas por pessoas com auxílio eventual de veículos pesados, como caminhões e tratores. A vedação se dá pelo próprio contato e por sacos de areia colocados juntos às comportas. Essas águas são enviadas de volta para o Guaíba pelas casas de bombas.

Como funcionam as casas de bombas?

As 23 casas de bombas jogam água das chuvas para os rios Guaíba e Gravataí. Com as águas do Guaíba entrando na capital gaúcha, algumas, como no Centro da cidade, estão sobrecarregadas. As bombas também podem ser acionadas quando a água da cidade fica presa em determinados locais, pelo bloqueio gerado pelo sistema de proteção.

Gráfico explica o funcionamento das casas de bombas de Porto Alegre — Foto: Editoria de Arte

Quem administra o sistema de contenção de águas?

O sistema é administrado pela prefeitura de Porto Alegre, por meio do Departamento Municipal de Água e Esgotos (DMAE).

Houve falha no sistema?

A falta de manutenção por décadas levou ao colapso do sistema, segundo o professor do IPH Gean Paulo Michel. O professor da UFRGS acrescentou que não havia um plano de contingência de retirada de moradores em caso de inundação

— Temos que ter um plano B. Um sistema com abrigos, que tipos de abrigos... O abrigo aceitaria animais? As rodovias de acesso aos abrigos podem ficar alagadas? Essas coisas precisam estar definidas com antecedência — pontuou o professor.

Enchentes no Rio Grande do Sul:

  • O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), declarou estado de calamidade pública devido aos municípios impactados pelo temporal no estado.
  • Após estabilidade nos últimos boletins, número de mortos por enchentes no Rio Grande do Sul volta a subir na manhã desta quinta-feira, chegando a 151, de acordo com o último balanço divulgado pela Defesa Civil do estado. 
  • O registro de desaparecidos, por outro lado, recuou para 104 nesta manhã, números que não sofreram alterações no balanço seguinte, divulgado às 12h.
  • Moradores de Caxias do Sul, na serra gaúcha, sentiram tremores de terra na madrugada desta segunda-feira (13).

Mobilização e resgates no Rio Grande do Sul

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