Primeiro-ministro britânico critica mudança em trechos da obra de Road Dahl, autor de 'Matilda'

'É importante que obras literárias e de ficção sejam preservadas e não retocadas', disse porta-voz; Philip Pulmann sugere que escritor saia de catálogo


Primeiro-ministro britânico Rishi Sunak Stefan Rousseau / POOL / AFP

O primeiro-ministro britânico Rishi Sunak criticou a alteração de trechos considerados ofensivos nos livros de Roald Dahl, autor de clássicos da literatura infantil como "Matilda" e "A fantástica fábrica de chocolate". Nesta segunda-feira (20), o porta-voz do primeiro-ministro afirmou: "No que se refere à nossa rica e diversa herança literária, o primeiro-ministro concorda com o Bom Gigante Amigo que não devemos fazer "gobblefunk" com as palavras". "É importante que obras literárias e de ficção sejam preservadas e não retocadas. Sempre defendemos o direito à liberdade de expressão", completou.

O Bom Gigante Amigo é um conhecido personagem de Dahl. "Gobblefunk" é o idioma inventado pelo autor em vários de seus livros, composto por neologismos, como "men-gobbling cannybull" (canibal devorador de gente).

Segundo a imprensa britânica, as obras de Dahl, publicadas pelo Puffin (selo infantil da Penguin Random House), em breve ganharão novas edições, nas quais trechos considerados ofensivos serão reescritos. Termos pejorativos referentes a peso, saúde mental, violência, gênero e raça serão substituídos. Em "A fantástica fábrica de chocolates", por exemplo, Augustus Gloop não será mais descrito como "enormemente gordo", mas apenas como "enorme".

Há quem acuse a editora de censurar o autor, morto em 1990. Entre eles, está o escritor indiano-britânico Salman Rushdie, esfaqueado no ano passado e ameaçado de morte por fundamentalistas islâmicos desde a publicação do romance "Os versos satânicos", em 1989. "Roald Dahl não era nenhum anjo, mas a censura é absurda. Puffin Books e os herdeiros de Dahl deveriam sentir vergonha", disse o escritor no Twitter.

Suzanne Nossel, da PEN America, instituição que defende a liberdade de expressão em nome de mais de sete mil escritores, afirmou: "Aqueles que comemoram alterações específicas na obra de Dahl deveriam considerar como o poder de reescrever livros pode ser usado nas mãos daqueles que não compartilham seus valores e sensibilidades".

Por sua vez, o escritor Philip Pullman, criador da série de ficção científica "Fronteiras do universo", disse à rádio BBC que os livros de Dahl devem sair de catálogo e ser substituídos por obras de autores contemporâneos, como Malorie Blackman, Michael Morpurgo e Beverley Naidoo. "Leiam todos esses autores maravilhosos que estão escrevendo hoje e não recebem tanta atenção devido ao peso comercial de gente como Roald Dahl", sugeriu.

Pullman disse ainda que os trechos problemáticos da obra de Dahl não vão desaparecer da memória do público da noite para o dia, dado que edições antigas continuam em circulação. "O que você vai fazer com esses livros? Todas aquelas palavras ainda estão lá. Você vai atrás de todos esses livros e riscar as palavras com uma caneta preta?", provocou.

O espólio de Dahl afirmou que "não é incomum revisar a linguagem" antes de reeditar uma obra e descreveu as alterações como "pequenas e cuidadosas". Em 2020, a família já havia se desculpado por comentários antissemitas do autor.

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