Crítica: com doses de humor e tensão, HQ conta como George Lucas superou obstáculos para criar saga que virou fenômeno cultural

Um dos melhores lançamentos do ano, 'As guerras de Lucas' combina valor informativo e artístico para agradar qualquer leitor interessado por 'Star Wars' ou pelo cinema de modo geral

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‘As guerras de Lucas’, de Laurent Hopman e Renaud Roche Reprodução

Responsável pela criação das franquias “Star Wars” e “Indiana Jones”, o diretor e produtor George Lucas fez uma trajetória incomparável no showbusiness. Em 1977, ele atingiu o estrelato ao apresentar seu universo de ficção científica de uma “galáxia muito distante”, introduzindo as figuras icônicas de Luke Skywalker, Darth Vader, Han Solo e Princesa Leia, entre outros. A batalha árdua para tirar do papel e desenvolver “Uma nova esperança” (1977), o primeiro filme da saga, é o foco da graphic novel biográfica “As guerras de Lucas”, dos autores franceses Laurent Hopman e Renaud Roche.

A HQ remonta a flashbacks da juventude de Lucas, garoto insolente que levava uma vida errática até sofrer um acidente de carro e quase morrer. Fã de heróis espaciais como Flash Gordon e Tommy Tomorrow (que ficou conhecido no Brasil como Léo Futuro), o jovem se matriculou na faculdade de cinema e logo explorou a temática futurista em “THX 1138” (1971), seu longa-metragem de estreia.

Scorsese, De Palma e cia.

Bálsamo para os cinéfilos, a obra pincela a amizade do biografado com os colegas Steven Spielberg, Martin Scorsese e Brian De Palma, entre outros, trazendo anedotas saborosas.

O cineasta de “O poderoso chefão” (1972), Francis Ford Coppola, por exemplo, chegou a oferecer a direção de “Apocalypse now” (1979) a Lucas, que recusou a proposta por estar infeliz e desiludido com a indústria enquanto trabalhava para viabilizar “Star Wars” — que já nos primeiros esboços tinha clara influência do filme japonês “A fortaleza escondida” (1958).

Metódico, determinado e dono de uma imaginação fértil, Lucas subverteu todas as descrenças no roteiro (ninguém entendia o conceito de palavras como “wookiee” e “jedi”) e superou os prazos impossíveis, o baixo orçamento, as filmagens problemáticas no deserto da Tunísia e até um princípio de infarto para conceber aquele que se tornaria um clássico da sétima arte.

A película decolou de vez com a escalação dos três atores principais, cujas personalidades eram semelhantes às dos personagens que encarnavam: “Carrie Fisher, filha da aristocracia hollywoodiana, interpreta uma princesa; Harrison Ford, um cara viajado e irônico, interpreta um contrabandista cínico; Mark Hamill, jovem valente, mas um pouco inocente, encarna o herói ingênuo”, contextualizam os cartunistas.

Se o trio protagonista era desconhecido, o consagrado ator britânico Alec Guiness foi convidado para interpretar Obi-Wan Kenobi. Ele quase abandonou a produção quando foi surpreendido com a notícia de que Kenobi morreria no meio do filme, mas foi convencido por Lucas a permanecer.

Ainda sobre o elenco, é provável que a maior parte dos leitores se choque ao saber que Anthony Daniels e Kenny Baker, dupla que imortalizou os robôs C-3PO e R2-D2, respectivamente, não se suportavam. Ou que Harrison Ford, casado, tinha um caso com Carrie Fisher — relações retratadas pelos autores sem o menor acanhamento, diga-se.

Poucas semanas após estrear, em 1977, “Star Wars” tornou-se um fenômeno cultural e quebrou todos os recordes de bilheteria, recebendo dez indicações ao Oscar e levando sete prêmios. Sua bilheteria total ajustada para a inflação do período seria hoje algo em torno de U$ 1,63 bilhão, segundo o site Box Office Mojo. Trata-se do segundo filme mais visto nos cinemas em todos os tempos, atrás apenas de “...E o vento levou”.

Lucas provou-se ainda um empresário inteligente ao exigir 50% dos direitos dos produtos de merchandising relacionados ao filme. O vinil da trilha sonora de John Williams, por exemplo, foi a maior venda do gênero em todos os tempos, com mais de dois milhões de cópias vendidas.

“Esse dinheiro, esse sucesso, não importam pra ele. Com esse filme, ele só queria reencontrar a magia da sua infância...”, diz Marcia, que era casada com Lucas e ocupa um lugar central na história.

Os traços dos quadrinhos são delicados e os desenhos são majoritariamente em preto e branco, com destaques específicos em cor. O texto é jornalístico e, ao mesmo tempo, repleto de humor, emoção e tensão, transpondo o leitor para os bastidores do processo criativo desta space opera.

Um dos melhores lançamentos do ano, “As guerras de Lucas” combina valor informativo e artístico para agradar qualquer leitor interessado por “Star Wars” ou pelo cinema de modo geral, proporcionando uma homenagem à altura para uma das mentes mais inventivas da cultura pop.

'As guerras de Lucas’. Autores: Laurent Hopman e Renaud Roche. Tradução: Flávia Yacubian. Editora: Comix Zone. Páginas: 208. Preço: R$ 139,90.

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