Americanas: diretoria chegou a criar e-mails falsos de fornecedores com gastos fictícios, diz investigação

Segundo a PF, tática não seguia uma sequência lógica ou temporal pré-definida. Em delação, ex-funcionário diz fechamento de resultado era "traumático"


Americanas: diretoria chegou a criar e-mails falsos de fornecedores com gastos fictícios, diz investigação Foto de arquivo

RESUMO

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GERADO EM: 03/07/2024 - 04:01

Fraude bilionária na Americanas

Investigação revela que ex-diretores da Americanas criaram emails falsos de fornecedores para fraudar contabilidade bilionária, incluindo contratos fictícios de Verba de Propaganda Cooperada. Esquemas incluíram manipulação de despesas, reclassificação de valores e bloqueio de inclusão de notas, visando inflar lucros e enganar auditorias. Expectativas do mercado eram mantidas com resultados fictícios divulgados pela empresa.

A fraude contábil bilionária que durou ao menos uma década na Americanas não seguia uma sequência lógica ou temporal pré-definida no modus operandi, de acordo com as investigações do Ministério Público Federal (MPF). Com isso, além da criação de comitês inexistentes para ludibriar as empresas de auditoria, a antiga gestão da varejista chegou a criar e-mails falsos de fornecedores.

De acordo com um relatório da Polícia Federal (PF), com base na delação de Marcelo da Silva Nunes, que ocupou a função de diretor financeiro na varejista, eram criados e-mails falsos dos fornecedores dando o “de acordo” para as cartas fictícias de Verba de Propaganda Cooperada (VPC).

"Os fornecedores não tinham noção que os e-mails das cartas de VPC eram alterados", disse Nunes aos investigadores em delação, que conta com mais de 300 documentos anexados. O objetivo era que essas cartas dos fornecedores fossem enviadas às auditorias para aprovar as contas da varejista.

O VPC envolve a concessão de créditos por parte dos fornecedores aos varejistas por motivos comerciais variados, como a inclusão de produtos em materiais promocionais de lojas ou websites, ou em situações onde um produto mais recente é lançado, ocasionando um acúmulo de estoque da versão anterior.

Mas, segundo a PF, a antiga diretoria criava lançamentos contábeis fraudulentos, referentes a VPCs inexistentes.

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'Fechamento de fim de ano traumático'

Em delação, Nunes disse que a alteração das cartas de VPC consistia em pegar uma carta verdadeira e, com base nisso, modificar as datas e os valores, mantendo os dados cadastrais. Ele disse ainda para a PF que "o lugar mais fácil de conseguir (essas cartas falsas) será com os auditores que são a Price e a KPMG".

Ele relata que nas reuniões com a auditoria sempre se fez tudo para esconder essas fraudes. "O processo de fechamento de resultado de final de ano era sempre muito traumático porque tinham que ser cometidas várias fraudes para esconder da auditoria".

Dessa forma, segundo a PF, o resultado era fraudado com a criação e registro artificial de contratos de VPC, que melhoravam o resultado da companhia, reduzindo custos, mas sem sua efetiva contratação com fornecedores.

Empresa usava 'cashback' como investimento

O relatório da PF apontou ainda uma série de esquemas, como alteração na geografia das despesas e contabilização de despesas como investimentos. Nessa lista eram incluídos, por exemplo, gastos com frete, pessoal, cashback, despesas com lojas e tecnologia. Havia ainda ausência de divulgação do registro de créditos tributários.

Chegou a um ponto, aponta o MPF, que, a partir de determinada data, o sistema para inclusão de notas era bloqueado, "impedindo que os gestores incluíssem notas de despesas no módulo contas a pagar".

Em alguns momentos, a direção usava a criatividade. “Assim, por exemplo, reclassificavam valores da linha de “Despesas com pessoal” para linha de “Despesas com prestadores serviços” ou para “Outras”, com vistas a dar uma melhor leitura ao mercado, condizente com a narrativa montada para explicar o resultado, aponta o MPF.

"Algumas das fraudes eram realizadas para inflar artificialmente os lucros da companhia; outras serviam para escamotear o efeito caixa esperado diante do falso lucro e receita declarados, nos balanços bem como outras eram perpetuadas para esconder os crimes das auditorias realizadas sobre a contabilidade das empresas", aponta o MPF.

Segundo a PF, verifica-se que, mês a mês, todos recebiam os resultados reais, tomavam conhecimento do refino dos números, elegiam um resultado fictício e tomavam conhecimento do resultado fraudulento. Isso ocorria para não frustrar as expectativas do mercado.

"Havia uma expectativa de mercado para que a cotação das ações chegasse a tal patamar, e esta expectativa era atingida com base nos resultado apresentados" pela empresa, diz a PF, destacando que a cultura da varejista era de não ter resultados ruins.

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