MPF abre ação contra vereador e pede indenização de R$ 250 mil por ofensas a trabalhadores resgatados no RS

Sandro Fantinel disse que baianos "vivem na praia, tocando tambor". Procurador defende que montante seja destinado a projetos e campanhas contra trabalho escravo

Por Fernanda Canofre* — Bento Gonçalves (RS)


Sandro Fantinel sugeriu que agricultores não contratarem 'aquela gente lá de cima' Reprodução/RBS TV

O Ministério Público Federal (MPF) entrou com uma ação contra o vereador Sandro Fantinel, de Caxias do Sul (RS), para obrigá-lo a pagar indenização de, no mínimo, R$ 250 mil por danos morais coletivos pelas ofensas que fez a trabalhadores nordestinos encontrados em condições análogas à escravidão. Eles eram tercerizados e trabalhavam para vinícolas da região.

Na ação, o MPF pede que esse valor seja destinado a projetos e campanhas contra o trabalho escravo e a xenofobia ou a iniciativas em Caxias do Sul que promovam a cultura baiana.

Na última terça-feira, ao discursar sobre o resgate dos trabalhadores de um alojamento em Bento Gonçalves, Fantinel disse que os baianos "vivem na praia, tocando tambor" e sugeriu que agricultores e empresas agrícolas contratem trabalhadores argentinos, e não mais "aquela gente lá de cima", em referência aos nordestinos.

Diante da atitude do político, a Câmara Municipal de Caxias do Sul aprovou, por unanimidade, a abertura do processo de cassação de Fantinel (sem partido).

Na quarta-feira, a Polícia Civil de Caxias do Sul instaurou inquérito para apurar crime de racismo nas falas de vereador.

No último dia 22, 207 pessoas contratadas para trabalhar na colheita de uva foram resgatadas de um alojamento em Bento Gonçalves (RS), em condições degradantes de trabalho, análogo à escravidão. A operação, realizada por órgãos federais, foi feita após três trabalhadores terem conseguido fugir do alojamento, onde eram mantidos contra a vontade e sem receber os salários combinados.

Agressões em série

O discurso de Fantinel foi classificado pelo MPF como odioso, preconceituoso e de caráter xenofóbico e discriminatório em relação à origem geográfica, em especial a população que nasceu ou vive no estado da Bahia.

O procurador da República Fabiano de Moraes destaca, na ação civil pública, que o vereador colocou as vítimas como culpadas da situação em que se encontravam.

Além de agredir os escravizados, o réu menosprezou e discriminou o povo e a cultura da Bahia ao dar a entender que os baianos não são trabalhadores nem corretos nem limpos nem organizados, frisa o MPF, relatando outros trechos xenofóbicos do discurso.

Ataques à União

Para o MPF, o vereador também atacou os órgãos de fiscalização da União ao insinuar que as condições em que os trabalhadores foram encontrados são “normais” na Serra Gaúcha e que eles queriam trabalhar 15 dias e ganhar por 60.

O MPF aponta que essa insinuação induz ao entendimento de que o trabalho de fiscalização foi ilegal e ignora o fato de que todas as informações trazidas a público relatam que as pessoas eram mantidas no local contra a vontade, submetidas a jornadas exaustivas, com alimentação inadequada para consumo e que inclusive há relatos de tortura com armas de choque e spray de pimenta.

O Ministério Público do Trabalho (MPT), por sua vez, avalia que a empresa que contratou os mais de 200 trabalhadores resgatados em Bento Gonçalves cometeu crime de tráfico de pessoas, além de ter submetido os funcionários à condição de trabalho análogo à escravidão.

(*Especial para O GLOBO)

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