Produtos chineses vão ficar mais caros no ‘e-commerce’? Entenda como governo quer tributar compras do exterior

Isenção de imposto, que pode chegar a 60%, para compra até US$ 50, cerca de R$ 250, vai acabar. Empresas como Shopee, Shein e AliExpress estão no alvo

Por Manoel Ventura — Brasília


Empresas como Shopee, Shein e AliExpress estão no alvo do governo Bloomberg

O governo federal vai acabar com a regra que isenta de impostos as remessas internacionais com valor inferior a US$ 50 (cerca de R$ 250). O benefício é exclusivo para pessoas físicas. A medida será tomada para combater o que considera sonegação de impostos de plataformas digitais, como Shopee e AliExpress, entre outras, que vendem produtos importados no Brasil e ganharam espaço no país.

Por que o governo vai taxar a Shein, Shopee e AliExpress?

Críticos, como varejistas e industriais nacionais, se referem a estes negócios como “camelódromos digitais”. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, classificou esse e-commerce como “contrabando” e estima arrecadar até R$ 8 bilhões por ano com a tributação.

Auditores da Receita Federal suspeitam que mercadorias entrem no país por meio do comércio eletrônico sem pagar impostos porque os vendedores estariam fornecendo informações falsas para sonegar tributos.

Pelas regras de hoje, uma pessoa física no Brasil pode comprar algo de outra pessoa física no exterior sem pagar impostos se o valor for abaixo de US$ 50.

Como vai funcionar a taxação de produtos da Shein, Shopee e AliExpress?

A Receita Federal avalia, porém, que empresas de outros países estariam vendendo a brasileiros ilegalmente por esse sistema. Outra possível fraude seria declarar o bem por valor inferior, ficando dentro do limite de US$ 50.

Por isso, o governo prepara uma medida provisória para acabar com essa isenção.

Tributação de 60%

Segundo o secretário da Receita Federal, Robinson Barreirinhas, não há majoração de tributo. Hoje já existe a tributação de 60% sobre o valor da encomenda, mas que não tem sido efetiva, na sua visão. É essa alíquota que será aplicada.

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— O que se está se propondo são ferramentas para viabilizar a efetiva fiscalização e exigência do tributo por meio de gestão de risco: obrigatoriedade de declarações completas e antecipadas da importação, com identificação completa do exportador e do importador, com multa em caso de subfaturamento ou dados incompletos/incorretos — disse.

Não haverá mais distinção de tratamento nas remessas por pessoas jurídica e físicas. Na visão do governo, hoje as remessas por pessoas físicas de bens com valores relevantes são inexpressivas.

— Com essas medidas, os consumidores serão beneficiados: com a declaração antecipada, a mercadoria poderá chegar no Brasil já liberada, podendo seguir diretamente para o consumidor. A Receita vai centrar a fiscalização nas remessas de maior risco, em que nossos sistemas de gestão de riscos, alimentados pelas declarações antecipadas, apontem risco maior de inconsistências. Com o tempo, o próprio consumidor vai preferir comprar de empresas confiáveis, que atendam estritamente a legislação brasileira.

Jorge Gonçalves Filho, presidente do Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV), defende a medida e diz que ela irá ajudar a indústria e o comércio brasileiro.

— Se o produto, de fato, não tem finalidade de ser enviado de pessoa física para uma pessoa física, mas de ser comercializado, ele tem que pagar um imposto que já existe.

O que dizem as empresas?

Procurada pelo GLOBO, a Shein informou que está comprometida em gerar valor para a indústria, os consumidores e a economia do Brasil e destacou que “as regras do 'de minimis' (tipo de isenção fiscal) são adotadas por muitos países com o objetivo de facilitar o comércio internacional e propulsionar o crescimento local”. A varejista de vestuário chinesa diz apoiar consolidação de regras no Brasil.

“Reconhecemos a importância em propor melhorias para as regras no Brasil de modo a fornecer segurança jurídica para os operadores e garantir que milhões de brasileiros possam continuar a ter acesso ao mercado mundial, bem como a artigos produzidos localmente”, afirmou a Shein em nota.

A Shein também reforçou que cumpre as leis e regulamentos locais do Brasil, e reiterou que "se esforça para estabelecer parcerias com diversos fornecedores e vendedores locais no mercado brasileiro".

A Shopee afirmou que as possíveis mudanças tributárias em compras internacionais não afetarão os consumidores da plataforma que compram dos mais de 3 milhões de vendedores brasileiros registrados no seu marketplace. Segundo a empresa, mais de 85% de suas vendas são de vendedores brasileiros e não do exterior.

"Diferente de outras plataformas que dependem da importação de produtos, o foco da Shopee consiste em conectar vendedores e consumidores locais e ajudar as empresas brasileiras a crescer e prosperar online", diz um trecho do comunicado enviado pela operação brasileira da companhia de Cingapura.

A empresa informou que opera como uma empresa nacional com escritórios em São Paulo, onde conta com mais de 1,5 mil colaboradores na equipe e atende a mais de 3 milhões de vendedores locais registrados.

“Inclusive, apoiamos o governo em qualquer mudança tributária que apoia o empreendedorismo brasileiro, pois também compartilhamos do mesmo propósito e queremos contribuir com o desenvolvimento do ecossistema local”, destacou a Shopee.

O Mercado Livre, que também comercializa produtos internacionais, informou ao GLOBO que está em operação no país há mais de 23 anos, reiterou que o segmento de compras internacionais representa uma pequena parte do volume anual de vendas no Brasil e que respeita integralmente a legislação tributária vigente.

A companhia argentina afirmou que “não se enquadra no questionamento levantado por parte do setor, defendendo que a observação das normas vigentes, a adoção de boas práticas, a qualidade da oferta e a experiência do usuário não dependem da nacionalidade de pessoas ou empresas”.

Também destacou o pagamento de impostos no Brasil. “Atualmente, além da sua contribuição fiscal direta, que aumentou 34% entre 2021 e 2022, superando a marca de R$ 3,5 bilhões no país, a companhia incentiva a formalização de milhares de vendedores do seu marketplace. (...) Além disso, a empresa monitora a natureza fiscal das transações realizadas dentro da plataforma, fazendo com que menos de 5% das vendas sejam realizadas por pessoas físicas, isentas de pagar tributos de acordo com o Código Tributário Nacional", diz a nota.

Procurado, o chinês AliExpress não respondeu até a última atualização desta reportagem.

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