Americanas e Light levam bancos a pedirem mais R$ 2 bi em fundo de garantia de crédito do BNDES

Aporte do Tesouro no programa de garantias foi discutido por Febraban em reunião esta semana. Banco de fomento vê fortalecimento como essencial para alavancar o crédito em meio a crise de empresas

Por Vinicius Neder — Rio


O BNDES financia projetos de infraestrutura Fabio Rossi

Preocupado com os efeitos do aumento da cautela dos bancos, por causa do escândalo corporativo da Americanas e, mais recentemente, pelo pedido de recuperação judicial da Light, o setor financeiro quer que o governo federal turbine o Peac e o Pronampe, programas de garantias lançados na fase aguda da pandemia, em 2020.

As sugestões incluem um aporte de R$ 2 bilhões no Peac e a elevação do teto de faturamento das empresas aptas a recorrer de R$ 300 milhões ao ano para R$ 500 milhões ao ano. Isso permitiria ampliar a capacidade do Peac, operado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), em cerca de R$ 24 bilhões.

A Febraban, entidade que representa os bancos, criou em fevereiro um grupo de trabalho (GT) para monitorar o mercado de crédito, em parte por causa dos efeitos relacionados ao problema da Americanas. As sugestões sobre o Peac e o Pronampe foram debatidas na última quarta-feira, em São Paulo, numa reunião desse GT, disseram fontes que acompanharam as discussões, sob a condição do anonimato.

Cenário negativo

No encontro, os participantes se debruçaram sobre dados negativos sobre o cenário de crédito para empresas. Desde o ano passado, o crescimento do crédito para empresas vinha em desaceleração, em parte por causa do ciclo de elevação dos juros pelo Banco Central (BC). O quadro piorou com o escândalo da Americanas, especialmente nas linhas de crédito de antecipação de “recebíveis” – como são chamados os valores de vendas a receber, no jargão do mercado –, muito utilizadas por varejistas.

O diagnóstico do GT da Febraban é que os escândalos corporativos recentes elevaram a cautela dos bancos, que temem tomar calote se fizerem novos empréstimos. Se os bancos ficam com medo de emprestar, a desaceleração do crescimento do crédito pode se agravar, reforçando o efeito dos juros altos sobre o esfriamento da economia.

Para o setor financeiro, reforçar os programas de garantia seria a melhor saída para o governo enfrentar o problema. A falta de garantias é um obstáculo conhecido das empresas quando pedem empréstimos, especialmente no caso das de menor porte. Sem imóveis, fábricas ou fianças corporativas para oferecer aos bancos, muitas vezes os pequenos empresários têm o crédito negado.

Como membro da entidade do setor financeiro, Mercadante participou de reunião sobre crédito, representando o BNDES — Foto: Gabriel de Paiva/ Agência O Globo

O presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, participou da reunião do GT de crédito da Febraban na quarta-feira. Desde fevereiro, o banco de fomento é membro da entidade. O BNDES informou, por escrito, que, na reunião, “surgiram sugestões de aprimoramento e fortalecimento do FGO e do FGI”. “O BNDES entende que esse fortalecimento pode ser um instrumento fundamental para alavancar o crédito, especialmente em um momento de retração”, diz a nota.

Como funcionam as garantias

O Pronampe e o Peac oferecem garantias de crédito com recursos públicos, por meio do FGO, fundo administrado pelo Banco do Brasil (BB), e do FGI, administrado pelo BNDES. Quem empresta são os bancos privados, com recursos deles. Os fundos dão garantias. Funcionam como um seguro-fiança para o aluguel imobiliário, oferecendo ao tomador do empréstimo a garantia, assim como o seguro-fiança permite ao inquilino alugar a moradia sem um fiador. Se há calote, o aval cobre a perda. O banco fica mais seguro de emprestar, porque o risco de perda é menor.

Como nem todos dão calote, a capacidade de um fundo de aval garantir empréstimos é superior ao aportado. No caso do FGI, do BNDES, houve um aporte de R$ 20 bilhões em 2020. Naquele ano, o Peac garantiu R$ 92 bilhões em empréstimos. Em 2021, o programa ficou fechado, mas foi reaberto em agosto. Sem novos aportes, a fase atual do programa poderá garantir mais de R$ 42 bilhões – desde agosto, foram R$ 36,4 bilhões; em 2020, na primeira fase, foram R$ 92 bilhões.

Outra sugestão debatida entre os bancos é a elevação do valor máximo dos empréstimos garantidos pelo Peac, de R$ 5 milhões por empresa para R$ 10 milhões por empresa. Para o Pronampe, a ideia seria subir o teto de R$ 150 mil para R$ 500 mil. O objetivo é ampliar o número de empresas que podem recorrer aos programas.

Juros freiam; garantias aceleram

Diretor do BNDES no governo Michel Temer, Vinicius Carrasco, sócio-diretor da companhia de maquininhas Stone, é crítico da expansão dos programas de garantia com recursos públicos. O avanço desse tipo de crédito, ao mesmo tempo em que o BC tenta esfriar a concessão de empréstimos com a elevação de juros, é "contraproducente”: enquanto a política de juros pisa no freio, os programas de garantia pisam no acelerador.

– Esses programas lidaram com um problema sério da pandemia, quando o risco foi exacerbado – afirmou Carrasco, completando que esse problema agudo ficou para trás. Mesmo agora, com o escândalo da Americanas, o quadro não parece tão grave, na visão do ex-diretor do BNDES. – Não parece haver preocupação com o risco da economia como um todo. Os sinais são de que as coisas estão longe de parecer problemáticas.

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