Sandra Kogut celebra 40 anos de carreira e inaugura exposição

Cineasta carioca aborda polarização política na instalação 'No céu da pátria nesse instante', no Sesc Niterói


Frases são projetadas sobre o corpo dos visitantes na exposição Divulgação/Guga Ferreira

Aficionada por cinema desde a adolescência, Sandra Kogut decidiu cursar filosofia na PUC-Rio, na hora de escolher seu caminho profissional. O fascínio pelo audiovisual, contudo, a impediu de seguir exatamente por essa via. Ainda jovem, dirigiu clipes musicais para o “Fantástico”, da TV Globo, e criou instalações de vídeo, em incursões pelas artes visuais. “Tentava inventar coisas”, lembra-se, sobre um mercado cinematográfico dominado por figuras masculinas. “Já aconteceu de chegar para filmar e ser barrada, por não entenderem que eu era a diretora.”

No ano em que completa quatro décadas de carreira, a carioca, de 59 anos, carrega o trunfo de ser uma das mais prestigiadas cineastas brasileiras, com filmes celebrados ao redor do mundo. É o caso de “Mutum” (2007), que recebeu menção honrosa na Berlinale, e de sua obra mais recente, o documentário “No céu da pátria nesse instante”, ganhador do prêmio especial do júri no Festival de Brasília, no ano passado. O filme se debruça sobre a polarização política a partir de imagens e depoimentos de pessoas comuns engajadas nas eleições de 2022. Mas, antes de chegar ao circuito comercial (ainda sem previsão), o material reunido ao longo de um ano e meio de entrevistas se desdobra numa exposição, no Sesc Niterói, a partir desta quinta-feira.

A instalação homônima ao longa-metragem leva os visitantes a uma caixa preta onde frases como “vai ter eleição ou não vai” e “eu vejo uma TV, você outra”, ditas por personagens dos dois lados do espectro político, são projetadas sobre os corpos do público (a única maneira de visualizá-las). Algumas também podem ser ouvidas em fones, enquanto imagens dos ataques de 8 de janeiro em Brasília são exibidas no chão.

A diretora Sandra Kogut tem filmes celebrados internacionalmente — Foto: Ana Branco

Além de retomar as incursões da diretora em experimentos com as tecnologias de áudio e vídeo em espaços expositivos, tanto o longa quanto a instalação revelam o interesse de Sandra por personagens que vivem longe dos holofotes. “Essa figura que é coadjuvante ou está até fora de quadro, sem voz, sem imagem, é sempre o olhar mais interessante para mim”, diz. Relatos que, na opinião dela, guardam uma humanidade fundamental para a compreensão do Brasil. “Se pensarmos no cara que está acostumado a falar, a figura pública, você não tem mais acesso a ele. Já é uma imagem totalmente blindada, construída.”

Na instalação, o material despe-se da narrativa inerente a um documentário e cada pessoa experimenta uma montagem única. Um aspecto especialmente simbólico diante da polarização política, segundo a professora da UFRJ Consuelo Lins, que assina o texto de apresentação. “Você precisa do corpo do outro para ler as frases projetadas. E o seu ‘vizinho’ pode não ser do mesmo campo político do que o seu”, diz. Providencial para um momento em que as pessoas parecem pouco dispostas ao diálogo.

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