Dia Internacional da Mulher: diferença salarial entre os gêneros ainda resiste no Brasil

Executivas explicam de que forma as empresas podem aplicar políticas para ajudar a virar o jogo

Por — São Paulo


O gender gap ainda é resistente nas empresas: a diferença é de 29,3% entre mulheres e homens com curso superior Shutterstock

A equiparação salarial entre homens e mulheres, em cargos de liderança, só acontecerá daqui a 130 anos”, diz, sem rodeios, a empresária Viviane Duarte, da consultoria Plano Feminino e presidente do Instituto Plano de Menina, criado em 2016 para capacitar garotas de periferias a oportunidades de estudo e desenvolvimento. O dado é do Relatório Global de Disparidade de Gênero do Fórum Econômico Mundial de 2023, que corrobora com o gender gap, diferença de remuneração entre os sexos masculino e feminino.

“Após a pandemia, houve um número muito grande de mulheres demitidas, além do retrocesso em busca de uma sociedade mais igualitária. Quando pensamos em demissões e escassez, isso as atinge muito, em especial a mulher negra, situada na base da pirâmide”, explica Viviane.

Viviane Duarte, da consultoria Plano Feminino e presidente do Instituto Plano de Menina — Foto: Divulgação

Segundo pesquisa feita pelo IBGE com homens e mulheres em um período de 10 anos, esse gap diminuiu 5%. Em 2012, elas ganhavam 27% a menos do que eles; já em 2022, 22%. No entanto, essa diferença aumenta para 29,3% entre quem tem curso superior, conforme relatório do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) divulgado no fim do ano passado.

Apesar da Lei da Igualdade Salarial entre Homens e Mulheres, sancionada pelo presidente Lula no ano passado, em que empresas com cem ou mais empregados precisam elaborar relatórios de transparência e critérios remuneratórios para garantir o mesmo salário para ambos os gêneros em funções iguais, a fiscalização de seu cumprimento ainda é deficitária. E, em casos de promoção, a lei não se aplica. “Mas mesmo com imperfeições, a potência de algo vindo do setor governamental é grande”, pontua Marienne Coutinho, Membro do Comitê de Inovação & Enterprise Solutions da KPMG no Brasil. “Na prática, há pressão da sociedade para o aumento de líderes femininas nas empresas.”

Marienne Coutinho, Membro do Comitê de Inovação & Enterprise Solutions da KPMG no Brasil — Foto: Divulgação

Apaixonada pela temática, Marienne dedicou-se, em sua trajetória de quase 30 anos, a entender as raízes do problema. Elas passam pela falta de assertividade das mulheres ao batalhar por salários mais justos à dificuldade em reconhecerem os próprios valores e competências, dando asas à síndrome da impostora. “Na minha experiência, os homens pedem mais aumento. Se elas estão insatisfeitas, é raro falarem do assunto. A mulher é educada para ser menos agressiva, então pensa: ‘não vou incomodar, preciso do emprego’. Tem a ver com falta de autoconfiança”, complementa. “Tentamos vários programas de mentoria e cursos de desenvolvimento, criamos awareness. As novas gerações são mais conscientes.”

Luciana Domagala, vice-presidente de Pessoas e Sustentabilidade da Ipiranga, de 51 anos, foi a primeira mulher promovida a um cargo de liderança em sua antiga corporação, aos 35, quebrando a barreira de gênero. “Duvidei se tinha tamanho para sentar naquela cadeira. Precisava me provar muito mais”, conta. Hoje, põe em prática projetos de diversidade e equidade salarial. Em cinco anos, a companhia de distribuição de combustíveis saltou de 23% para 34% no número de mulheres empregadas e, em posições executivas, de 11% para 38%.

Luciana Domagala, vice-presidente de Pessoas e Sustentabilidade da Ipiranga — Foto: Divulgação

No Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), foi criado, em 2018, o Comitê de Diversidade, com o objetivo de estimular políticas voltadas para Diversidade, Equidade e Inclusão na indústria de petróleo, gás e energia. Segundo a diretora-executiva da companhia, Claudia Rabello, dentro desse contexto, surgiu, no ano seguinte, a iniciativa de um Programa de Mentoria Feminina. O projeto, hoje gerenciado pela Universidade do Setor de Petróleo e Gás (UnIBP), pretende impulsionar a carreira e potencializar as competências de mulheres que já atuam em posições de liderança nas empresas de petróleo e gás, para que elas alcancem postos de gestão ainda mais elevados.

"O funcionamento ocorre por meio de mentoria cruzada, em que a empresa inscreve no programa um(a) executivo (a) para o papel de mentor(a) e uma executiva a ser mentorada, e os “matches” são realizados por meio de análises de perfil e potencialidades entre as empresas/pessoas inscritas", explica Claudia.

Apesar de boas iniciativas como essas, quando se fala em conselhos administrativos, órgãos responsáveis por decisões e deliberações estratégicas de uma empresa, as mulheres ainda são poucas. Embora em caminho crescente, há apenas 15,2% no comando das 389 empresas que compuseram estudo do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). “Existem vários movimentos que pregam maior diversidade, mas vivemos em bolhas e precisamos sair delas. Há bons profissionais em todos os níveis no mercado”, ressalta Valéria Caffé, diretora da instituição.

Rachel Maia, Presidente do Conselho Administrativo do Pacto Global da ONU — Foto: Divulgação

Embora os números não joguem à favor das mulheres, a Presidente do Conselho Administrativo do Pacto Global da ONU, Rachel Maia, é otimista e prefere olhar o copo meio cheio. “O letramento da população dominante nas cadeiras de poder se faz necessário. É desconstruir para construir novamente. Não queremos o lugar dos homens, mas a oportunidade de mostrar o nosso talento”, afirma a executiva. E seguimos, sempre atentas e fortes.

Mais recente Próxima Mulheres gastam cerca de seis horas semanais a mais que os homens com afazeres domésticos, aponta estudo