Lembra dela? Atleta mulher intersexo, Edinanci Silva disputou quatro Olimpíadas pelo Brasil e foi alvo de preconceito

Judoca entrou para o hall da Fama do Comitê Olímpico Brasileiro (COB) neste ano

Por O GLOBO — Rio de Janeiro


Judoca Edinanci Silva conversando com médico Bernardino Santi, durante treinamento em Sidney-2000 Ivo Gonzalez / Agência O Globo / 01-09-2000

A judoca Edinanci Silva, hoje com 45 anos, foi a quatro Olimpíadas (Atlanta-1996, Sidney-2000, Atenas-2004 e Pequim-2008). Antes da viagem para os Estados Unidos, para a primeira delas, no entanto, se viu nos holofotes por não passar no chamado teste de feminilidade: depois de descobrir ter nascido intersexo, foi preciso passar por duas cirurgias antes de embarcar para Atlanta.

Em Paris-2024, o teste de gênero voltou aos holofotes por conta da boxeadora argelina Imane Khelif. Depois de derrotar a italiana Angela Carini em 46 segundos, foi alvo de ataques nas redes sociais. A polêmica remonta ao Mundial de Boxe de 2023, na Índia. Na competição, organizada pela Associação Internacional de Boxe (IBA), a atleta foi desclassificada após ser reprovada no teste de verificação de gênero. Ela não foi a única: a pugilista taiwanesa Lin Yu Ting, do peso pena, também perdeu a medalha.

A IBA não especificou por que as atletas falharam nos testes, mas esclareceu que nenhuma delas passou por exames de testosterona. À época, o presidente da associação, o russo Umar Kremlev, afirmou que testes de DNA “provaram que elas tinham cromossomos XY e, portanto, foram excluídas”. XY é a combinação de cromossomos masculinos. Para os Jogos de Paris-2024, porém, as atletas estão aptas. O COI as defendeu, e disse em nota que as boxeadoras “sofreram ataques enganosos em redes sociais”, e que os procedimentos a que foram submetidas pela IBA são “pouco claros e arbitrários”.

Edinanci: primeira brasileira em quatro Olimpíadas

Natural de Sousa (PB), Edinanci era vista como o maior de potencial de medalhas para o Brasil no judô na época em que competia. Em 1996, conseguiu o chamado "carnê rosa" (atestado de feminilidade), indispensável para disputar sua primeira Olimpíada, após passar por duas cirurgias. Ela retirou os testículos internos, responsáveis pela produção de testosterona (hormônio masculino) e fez a reconstrução do sexo feminino. Também retirou o útero, já que ele não era desenvolvido e havia risco, por isso, de que se desenvolvesse um câncer.

Antes disso, em 1995, seu caso — então inédito no esporte brasileiro — também mobilizou uma equipe de especialistas em genética para tentar amenizar a situação.

Alvo de preconceito em sua época, Edinanci chegou a pensar em largar o judô justamente por não gostar de ver na TV, conforme revelou em entrevista ao GLOBO em 2010. Apesar disso, ela contou não ter saído traumatizada da situação: foi "apenas uma barreira, e pequena", disse ela na ocasião.

Agora, em 2024, Edinanci entrou para o hall da Fama do Comitê Olímpico Brasileiro (COB) — quinta judoca a conseguir o feito. Pioneira, ela foi a primeira mulher brasileira a disputar quatro edições de Jogos Olímpicos: apesar de o pódio não ter vindo nessas edições, ela conquistou medalhas em outras competições.

Nos Jogos Pan-Americanos, foi ouro duas vezes (Santo Domingo-2003 e Rio-2007) e bronze em Winnipeg-1999. Entre suas conquistas, Edinanci também foi a primeira judoca a conquistar duas medalhas em Mundiais, saindo com o bronzes em Paris-1997 e Osaka-2003.

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