Premier do Peru renuncia em meio a suposto tráfico de influência após vazamento de áudio em que chama jovem de 'amor'

Ministério Público investigará Alberto Otárola, que foi substituído pelo diplomata de centro-direita Gustavo Adrianzén, de 57 anos

Por O Globo com agências internacionais — Lima


O ex-premier do Peru Alberto Otarola Sergio Lima / AFP

O primeiro-ministro do Peru apresentou na terça-feira sua renúncia imediata em meio a um escândalo de suposto tráfico de influência. Alberto Otárola, o braço direito da presidente Dina Boluarte, deixou o cargo 48 horas após ter sido revelado que ele ofereceu um emprego a uma mulher que ele assediou por meio de mensagens e perseguiu com declarações amorosas. Em seu lugar, assumiu o diplomata de centro-direita Gustavo Adrianzén, de 57 anos, que atuava como representante do Peru na Organização dos Estados Americanos (OEA), em Washington.

O novo primeiro-ministro também ocupou o Ministério da Justiça no governo do ex-presidente Ollanta Humala (2011-2016), entre abril e outubro de 2015.

— O perfil político de Adrianzén é muito semelhante ao de seu antecessor. Não espero nenhuma mudança — afirmou o analista político José Carlos Requena ao canal de televisão N.

Boluarte, que conta com uma taxa de desaprovação de 83%, não quis manter Otárola no cargo — ele garantiu que é inocente e que tudo não passa de uma campanha orquestrada. Ele renunciou nesta quarta-feira depois de aterrissar em Lima em um avião vindo do Canadá, onde interrompeu sua participação em uma convenção de mineração. Os áudios foram divulgados durante o final de semana pelo canal Panamericana de Televisión.

— O país testemunhou uma trama, uma conspiração, uma operação de mídia, planejada durante meses, da qual participaram várias pessoas que agem nas sombras e têm segundas intenções. Eles tentaram falsamente fazer a população acreditar que eu havia intervindo na contratação de uma ou várias pessoas no Estado, quando isso é uma farsa — disse seu advogado em uma coletiva de imprensa depois de se reunir com Boluarte no Palácio.

Antes de se tornar o braço direito do governo, Otárola ocupou o Ministério da Defesa durante os protestos que deixaram cerca de 50 mortos em janeiro do ano passado, a maioria pelas forças de segurança.

Nesta quarta, ele culpou o ex-presidente Martín Vizcarra pelo vazamento. Na gravação, o então premier pede o currículo e chama de "amor" Yaziré Pinedo Vásquez, que em 2023 recebeu dois contratos com o Estado por US$ 14,3 mil (cerca de R$ 71 mil) como assistente técnica administrativa no Ministério da Defesa. "Diga-me, então, amor, para falar. Você sabe que essas coisas são chatas e irritantes, mas você sabe que eu também te amo", teria dito à jovem de 25 anos.

— Não tenho dúvidas de que Martín Vizcarra está por trás de tudo isso. Ele e sua equipe de corruptos — afirmou Otárola com raiva.

Vizcarra, que sucedeu Pedro Pablo Kuczynski no palácio e governou o Peru entre 2018 e 2020, sofreu impeachment por supostos crimes de corrupção. Sua imagem também foi manchada pelo "Vacunagate", um escândalo internacional que revelou o tráfico de vacinas contra a Covid-19 no país durante a primeira onda da epidemia. O então presidente se vacinou secretamente.

'Relacionamento provavelmente amoroso'

Já Yaziré, que reconheceu ter tido um "relacionamento aparentemente amoroso" com Otárola, garantiu que o áudio em questão foi manipulado e que a conversa ocorreu em janeiro de 2021, quando Otárola não ocupava nenhum cargo público. Ela ainda afirmou que por trás da suposta conspiração estaria Nicanor Boluarte, irmão da presidente, que foi questionado nos últimos meses por favorecer seus associados próximos com contratos estatais. Otárola, no entanto, a inocentou da trama.

— Fiquei surpreso com o fato do senhor Nicanor Boluarte ter sido citado. Tenho certeza de que ele não está envolvido nessa conspiração — disse, talvez como um último gesto de lealdade à presidente.

No dia anterior, o destino de Alberto Otárola foi selado: nove das onze bancadas do Congresso pediram que ele renunciasse.

Mais recente Próxima Entenda como míssil alemão Taurus, citado em áudio vazado pela Rússia, expõe divisões sobre Ucrânia