Brasil questiona impedimento de inscrição de candidata opositora na Venezuela: 'Expectativa e preocupação'

Inscrição de candidaturas para eleição de 28 de julho terminou nesta segunda-feira

Por — Brasília


Corina Yoris, principal nome da oposição venezuelana, durante coletiva de imprensa nesta segunda Ronald PEÑA / AFP

O governo brasileiro divulgou uma nota nesta terça-feira em que afirma acompanhar com "expectativa e preocupação o desenrolar do processo eleitoral" na Venezuela, citando que Corina Yoris, candidata da oposição pela Plataforma Unitária, "foi impedida de registrar-se" para o pleito, previsto para 28 de julho. É a primeira vez que o país se posiciona de forma crítica sobre o processo eleitoral venezuelano.

"Com base nas informações disponíveis, observa que a candidata indicada pela Plataforma Unitária, força política de oposição, e sobre a qual não pairavam decisões judiciais, foi impedida de registrar-se, o que não é compatível com os acordos de Barbados. O impedimento não foi, até o momento, objeto de qualquer explicação oficial", destacou o Itamaraty.

A impossibilidade de registro de Corina Yoris ocorreu após seu nome ter sido indicado por María Corina Machado, que era a candidata favorita da oposição. María Corina não pôde concorrer por ter sido declarada inelegível por 15 anos. Apesar de Yoris não ter conseguido se inscrever, Miguel Rosales, governador de Zulia e também integrante da Plataforma Unitária, conseguiu se registrar no último minuto e disputará a eleição com Maduro.

Na nota, o Itamaraty pontua que, esgotado o prazo de registro de candidaturas para as eleições presidenciais venezuelanas, além de Rosales, dez outros candidatos ligados a correntes de oposição conseguiram se registrar. Nesta terça, María Corina afirmou que a candidatura de Rosales mostra que só os candidatos que o regime escolheu poderão participar do pleito.

"O Brasil está pronto para, em conjunto com outros membros da comunidade internacional, cooperar para que o pleito anunciado para 28 de julho constitua um passo firme para que a vida política se normalize e a democracia se fortaleça na Venezuela, país vizinho e amigo do Brasil", ressaltou o comunicado.

A nota reforça, ao mesmo tempo. a posição brasileira de considerar ilegais as sanções econômicas aplicadas pelos Estados Unidos à Venezuela.

"O Brasil reitera seu repúdio a quaisquer tipos de sanção que, além de ilegais, apenas contribuem para isolar a Venezuela e aumentar o sofrimento do seu povo".

Diante do risco de descumprimento do Acordo de Barbados, firmado entre governo e oposição para garantir a realização de eleições livres e transparentes, os Estados Unidos voltaram a aplicar algumas penalidades, com ênfase nas restrições aos setores de petróleo e minérios.

Subida de tom

A nota do Itamaraty indica que o nível de preocupação do governo Lula com a Venezuela subiu alguns degraus. Criticada por não ter condenado, na semana passada, as prisões de funcionários de María Corina, como outros países da região fizeram, a diplomacia brasileira, até o fim da semana passada, demonstrava otimismo em relação a uma disputa eleitoral justa no país vizinho.

Na última sexta-feira, em entrevista ao GLOBO, o assessor para assuntos internacionais de Lula, Celso Amorim, afirmou que, se a Venezuela ficar isolada na região, a situação não vai se resolver. Amorim havia conversado, um dia antes, com representantes de Maduro e da oposição e concluiu que há diálogo entre as partes. Por isso, ressaltou, o Brasil continua apostando em eleições livres e transparentes naquele país.

— Continua havendo diálogo e, enquanto há diálogo, há esperança — afirmou.

Perguntado se ainda acredita que as eleições venezuelanas poderão acontecer sem problemas, na terça-feira, Amorim respondeu:

— O diálogo é sempre possível. Vamos torcer.

Nos bastidores, interlocutores do governo brasileiro estão preocupados com os ataques que tiram a credibilidade e a eficácia do Acordo de Barbados, firmado entre representantes do governo e da oposição. Até recentemente, o Brasil avaliava se de fato havia retrocesso substantivo no que foi negociado, no fim do ano passado, com a mediação da Noruega e a colaboração de atores como o Brasil, os Estados Unidos, o Chile, a Colômbia e a União Europeia.

Desde que assumiu, o presidente brasileiro defendeu o líder chavista em várias oportunidades e tem sido bastante criticado por isso. Entre alguns exemplos, Lula já declarou que a acusação de descumprimento de direitos humanos na Venezuela era uma "questão de narrativa". O caso mais recente, no início deste mês, foi quando o mandatário brasileiro, sem mencionar o nome de María Corina, comparou a situação com a vivida por ele em 2018.

— Eu fui impedido de concorrer as eleições de 2018. Ao invés de ficar chorando, eu indiquei um outro candidato e disputou as eleições. Na Venezuela, está marcada as eleições para o dia 28 de julho, é o que eu fiquei sabendo ontem e hoje pela manhã. Agora, a pergunta de vocês é se as eleições vão ser honestas ou não. O que eu posso esperar? Que haja as eleições para a gente saber se foram democráticas ou não — disse o presidente.

Horas depois, María Corina escreveu em uma rede social:

"Eu chorando, presidente Lula? Você está dizendo isso porque sou mulher? Você não me conhece. Estou lutando para fazer valer o direito de milhões de venezuelanos que votaram em mim nas primárias e dos milhões que têm o direito de fazê-lo em eleições presidenciais livres nas quais derrotarei Maduro. Você está validando os abusos de um autocrata que viola a Constituição".

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