Estudantes de universidade em Paris aderem aos atos pró-Palestina, e instituição na Califórnia cancela formatura por 'medida de segurança'

Entrada da prestigiada Escola Superior de Ciências Políticas de Paris foi bloqueada, e direção do local anunciou que fez um acordo com os alunos mobilizados

Por O Globo com agências internacionais — Washington e Paris


Manifestantes seguram cartazes com os dizeres 'desmantelem fronteiras coloniais' enquanto estudantes ocupam um prédio do Instituto de Estudos Políticos em apoio aos palestinos, em Paris. DIMITAR DILKOFF/AFP

Um grupo de estudantes bloqueou, nesta sexta-feira, o prestigiado Instituto de Estudos Políticos (Sciences Po Paris) para exigir uma “condenação clara das ações de Israel” na Faixa de Gaza. O ato ocorre na sequência dos protestos pró-Palestina nas universidades americanas que, apesar da forte repressão policial e das centenas de detenções registradas desde a semana passada, têm se avolumado. Na Universidade do Sul da Califórnia (USC), em Los Angeles, onde 93 estudantes foram detidos, a sua principal e tradicional cerimônia de formatura foi cancelada devido a "novas medidas de segurança".

Após dias de protesto, a direção da Sciences Po anunciou, nesta sexta-feira, que realizou um acordo com os estudantes mobilizados. Em comunicado, Jean Bassères, administrador provisório da instituição, afirmou que os alunos “se comprometeram a parar de perturbar as aulas, os exames e todas as demais atividades da instituição”, ao passo que a direção concordou em organizar um debate interno e suspender os procedimentos disciplinares contra alguns discentes. A mensagem foi recebida com satisfação pelos manifestantes, que ainda estavam reunidos em frente ao centro às 21h30 locais (16h30 em Brasília).

As manifestações no instituto começaram na quarta-feira, quando ao menos dez tendas foram montadas por cerca de 60 estudantes no pátio de outro edifício do campus. A polícia interveio na madrugada de quinta-feira para desmontar o acampamento e esvaziar o local. Em mensagem encaminhada à AFP, a universidade informou que o ato contribuía "para um forte clima de tensão entre alunos, professores e funcionários" e que os agentes intervieram porque um "pequeno grupo de estudantes recusou" deixar o espaço. Os estudantes, por sua vez, afirmaram em um comunicado que a decisão de envolver policiais foi um "tanto chocante como profundamente preocupante".

Os protestos, porém, continuaram ao longo desta sexta. Manifestantes bloquearam a entrada do edifício histórico com materiais de construção e caixotes do lixo, e os estudantes que pernoitaram podiam ser vistos pelas janelas do centro, com kufiyas (lenço símbolo da luta palestina) na cabeça, bandeiras palestinas penduradas nas grades e slogans de apoio à sua causa. A administração, citada pelo Le Monde, estimou que cerca de 70 pessoas tenham ocupando o prédio principal e condenou "veementemente estas ações estudantis".

A tensão aumentou quando cerca de cinquenta manifestantes pró-Israel, alguns deles com a cabeça coberta e capacetes de moto, participaram de uma contramanifestação gritando "Libertem Gaza do Hamas", obrigando a polícia a intervir. O ataque sem precedentes do grupo terrorista em solo israelense em 7 de outubro e a resposta mortal de Israel no enclave palestino aumentaram a tensão na França, que abriga a maior comunidade judaica da Europa e milhões de muçulmanos.

Assim como suas homólogas americanas, o comitê Palestina do Instituto de Estudos Políticos pede “a condenação clara das ações de Israel” em Gaza e o “fim da colaboração” com todas as “instituições” consideradas cúmplices da “opressão sistémica do povo palestiniano”. O grupo também apela ao fim da “repressão das vozes pró-palestinas no campus”, depois do centro ter sido acusado de permitir o florescimento do antissemitismo. Segundo o Le Monde, a direção do Instituto havia organizado uma reunião com representantes dos estudantes.

O presidente do Conselho Representativo das Instituições Judaicas de França (Crif), Yonathan Arfi, qualificou a mobilização como “perigosa”, embora tenha reconhecido que não é “massiva”, em declarações ao canal LCI, na quarta-feira.

— Não temos nada contra os estudantes judeus, há estudantes judeus que fazem campanha conosco — afirmou o estudante e membro do Comitê Palestino Hubert Launois, de 19 anos, ao Le Monde. — O nosso problema são as políticas coloniais e genocidas do governo israelense de extrema direita.

Evento cancelado

A mobilização na capital francesa ocorre no momento em que os protestos pró-Palestina se multiplicam nas universidades dos Estados Unidos. Apesar da prisão de mais de 400 pessoas desde semana passada e da violência policial, os acampamentos espalhados pelos campi se avolumaram, e mais de 20 instituições de ensino superior aderiram ao movimento que pressiona por um cessar-fogo em Gaza e por medidas efetivas de suas reitorias para cortar laços com empresas que apoiam o conflito. Alguns protestos, porém, têm sido acusados de antissemitismo.

Diante das manifestações, algumas universidades suspenderam as aulas presenciais, enquanto outras sugeriram a professores e alunos utilizarem meios digitais para não prejudicar o andamento do semestre, que deve encerrar nas próximas semanas. Na Universidade do Sul da Califórnia (USC), a cerimônia tradicional, que congrega 65 mil estudantes, familiares e amigos ao mesmo tempo durante 1h30, foi cancelada.

"Compreendemos que isto é decepcionante", escreveu a universidade em um comunicado divulgado na quinta.

Os ritos não deixarão de ocorrer, mas foram fragmentados em pelo menos 23 cerimônias de formatura satélite nas escolas e faculdades segundo a programação, além de recepções menores para cada departamento. Ainda assim, algumas medidas de segurança foram implementadas para evitar possíveis perturbações, como a emissão de bilhetes (cada aluno poderá reservar gratuitamente entradas para até oito convidados) e a revista de bolsas, mochilas e malas.

As administrações dos campi têm tentado caminhar na corda bamba entre a defesa da liberdade de expressão e a manutenção da ordem — e, como os esforços para coibir as manifestações não estão alcançando um efeito dissuasor no movimento, algumas estão apostando nas negociações. Na Universidade de Columbia, Nova York, o prazo de quinta-feira dado para o fim dos acampamentos montados na semana passada foi suspenso. De acordo com a universidade, citada pela BBC, as negociações estão progredindo e continuarão. (Com AFP)

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