Em discurso na França, Biden diz que memória do Dia D convoca EUA a defender democracia na Ucrânia e no mundo
Presidente americano fez novo pronunciamento nesta sexta-feira, em Pointe du Hoc, na Normandia
Por O Globo, com agências internacionais — Cricqueville-En-Bessin, França
Em um novo discurso tendo as praias da Normandia como cenário, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, evocou a memória dos soldados de seu país que tomaram o litoral da região francesa no Dia D em junho de 1944 — no início da ofensiva final contra o totalitarismo nazista no front ocidental — ao afirmar que eles apoiariam a posição americana de lutar contra a agressão russa à Ucrânia e de defender a democracia. Biden usou o momento para pregar a defesa da democracia tanto no contexto interno dos EUA quanto no contexto externo.
— Um ditador temível que tinha conquistado o continente tinha finalmente encontrado um adversário [no Dia D]. Por causa deles [soldados americanos no Dia D ], a guerra virou. Eles lutaram contra a agressão de Hitler. Alguém dúvida de que eles iriam querer que os EUA lutassem contra a agressão de Putin aqui na Europa hoje? — afirmou Biden, referindo-se ao presidente da Rússia, Vladimir Putin, durante o discurso em Pointe du Hoc, o histórico rochedo com fortificações à beira-mar tomado por tropas americanas nas primeiras horas do Dia D.
Em uma narrativa elaborada, o presidente descreveu o esforço dos soldados americanos, mencionando alguns deles pelo nome, para superar os soldados nazistas e tomarem as falésias da Praia de Omaha — entre as cinco praias atacadas durante o Dia D, foi o campo de batalha onde as tropas aliadas mais sofreram baixas. À sombra da memória dos soldados, o presidente traçou o paralelo com os tempos atuais.
— Ao nos reunirmos aqui hoje, não é apenas para homenagear aqueles que demonstraram uma bravura tão notável naquele 6 de junho de 1944. É para ouvir o eco de suas vozes — disse o presidente. — Porque eles estão nos convocando. Eles estão nos perguntando o que faremos. Eles não estão nos pedindo para escalar esses penhascos. Eles estão nos pedindo para permanecermos fiéis ao que a América representa.
A Casa Branca antecipou, antes do embarque de Biden para a França, que o presidente faria uma defesa da democracia em sua passagem pela Europa. Politicamente, analistas apontam que o teor incluído nos discursos faz parte de uma tentativa mais ampla do democrata de mostrar contraste entre ele e seus dois grandes rivais — Donald Trump, no cenário interno americano, e Vladimir Putin, no externo.
Biden não mencionou Trump pelo nome em nenhum de seus pronunciamentos oficiais. Em Pointe du Hoc, veio a primeira citação a Putin — embora, em uma entrevista na quinta-feira, ele já houvesse dito que Putin "não é um homem decente".
Na quinta-feira, em um outro discurso no cemitério americano em Colleville-sur-Mer, menções à guerra na Ucrânia e uma convocação à luta pela democracia já haviam sido apontadas como uma dessas ofensivas retóricas contra o russo.
— Estamos vivendo uma época em que a democracia está mais em risco em todo o mundo do que em qualquer outro momento desde o fim da Segunda Guerra Mundial — disse em um dos momentos do discurso de quinta.
O presidente também criticou o "isolacionismo" como saída para a crise atual, defendendo o papel das alianças dos EUA, como a Otan — que Trump criticou repetidamente quando era presidente — no contexto presente como essenciais para preservar a liberdade. Biden se reuniu em Paris nesta sexta-feira com o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, e anunciou um novo pacote de ajuda militar ao país no valor de US$ 225 milhões (R$ 1,18 bilhão). O americano se desculpou pela demora em aprovar os últimos envios de ajuda a Kiev, que enfrenta dificuldades de reposição de munições e outros equipamentos bélicos no front.
Em uma análise para o programa "Equilíbrio de poder", da Bloomberg Television, na segunda-feira, o pesquisador Frank Luntz apontou como o discurso de Biden durante a viagem solene à França estaria direcionado também ao público interno. Apesar da ausência de menções diretas a Trump, as referências à defesa da democracia têm endereço certo: o ex-presidente responde a processos na Justiça dos EUA por tentar mudar o resultado das eleições na Geórgia e por seu papel no ataque de seus partidários, por ele instigados, ao Capitólio em 6 de janeiro de 2021 na tentativa de impedir a homologação da vitória de Biden.
— O mundo estará assistindo. Mais importante ainda: Pensilvânia, Michigan, Wisconsin estarão de olho — disse o pesquisador, referindo-se a estados-chave que o democrata terá que conquistar se quiser superar Trump nas eleições de novembro.
Comemorações do 80º aniversário do "Dia D"
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Militares e pessoas participam de uma cerimônia em homenagem aos setenta e sete pára-quedistas SAS das Forças Francesas Livres que morreram na Bretanha durante a Segunda Guerra Mundial, no memorial La Gree mill SAS (Serviço Aéreo Especial) em Plumelec, oeste da França, em 5 de junho, 2024, como parte das comemorações do "Dia D" que marcam o 80º aniversário do desembarque dos Aliados na Segunda Guerra Mundial na Normandia. — Foto: Benoit Tessier / POOL / AFP 2 de 25
Um paraquedista do Comando da Marinha Francesa guia seu paraquedas vermelho, branco e azul - bandeira da frança - pela igreja de Sainte-Mere-Eglise, como parte das comemorações do "Dia D" que marcam o 80º aniversário do desembarque dos Aliados na Segunda Guerra Mundial na Normandia. — Foto: MIGUEL MEDINA / AFP
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Veteranos dos EUA da Segunda Guerra Mundial se reúnem no centro da cidade de Sainte-Mere-Eglise, noroeste da França, em 5 de junho de 2024, como parte das comemorações do "Dia D" que marcam o 80º aniversário do desembarque dos Aliados da Segunda Guerra Mundial na Normandia. — Foto: MIGUEL MEDINA / AFP 4 de 25
O veterano norte-americano Mel Jenner, operador de rádio do 452º Grupo de Bombardeios do Corpo Aéreo do Exército, aperta a mão de espectadores enquanto veteranos desfilam nas ruas de Sainte-Mere-Eglise, noroeste da França, em 5 de junho de 2024, como parte do "Dia D" comemorações que marcam o 80º aniversário do desembarque dos Aliados na Segunda Guerra Mundial na Normandia. — Foto: Miguel MEDINA / AFP 5 de 25
A equipe acrobática da Força Aérea Real Britânica (RAF), os "Red Arrows", realizam um sobrevoo no evento comemorativo nacional do Reino Unido para marcar as comemorações do 80º aniversário do desembarque anfíbio aliado (desembarques do Dia D) na França em 1944, em Southsea Common , sul da Inglaterra. — Foto: Leon Neal / POOL / AFP 6 de 25
Aeronaves Douglas C-47 sobrevoam enquanto o presidente dos EUA Joe Biden (2º à direita), a primeira-dama dos EUA Jill Biden (direita), o presidente da França Emmanuel Macron (2º à esquerda) e sua esposa Brigitte Macron (esquerda) passam pelos porta-bandeiras durante a cerimônia dos EUA que marca o 80º aniversário do desembarque dos Aliados do "Dia D" da Segunda Guerra Mundial na Normandia, no Cemitério e Memorial Americano da Normandia em Colleville-sur-Mer, com vista para a Praia de Omaha. — Foto: SAUL LOEB / AFP 7 de 25
Joe Biden cumprimenta veterano da Segunda Guerra Mundial em cadeira de rodas — Foto: Saul Loeb/AFP 8 de 25
O presidente da França, Emmanuel Macron (direita) e Achille Muller, de 98 anos, último sobrevivente das Forças Francesas Livres, durante uma cerimônia em homenagem aos paraquedistas SAS e às Forças Francesas Livres que morreram na Bretanha durante a Segunda Guerra Mundial. Evento é parte das comemorações do "Dia D" que marcam o 80º aniversário do desembarque dos Aliados na Segunda Guerra Mundial na Normandia. — Foto: Benoit Tessier / POOL / AFP 9 de 25
O presidente da França, Emmanuel Macron (direita) e Achille Muller, de 98 anos, último sobrevivente das Forças Francesas Livres, durante uma cerimônia em homenagem aos paraquedistas SAS e às Forças Francesas Livres que morreram na Bretanha durante a Segunda Guerra Mundial. Evento é parte das comemorações do "Dia D" que marcam o 80º aniversário do desembarque dos Aliados na Segunda Guerra Mundial na Normandia. — Foto: Benoit Tessier / POOL / AFP 10 de 25
Rei Charles da Grã-Bretanha, a rainha Camilla, o primeiro-ministro Rishi Sunak e sua esposa Akshata Murty, o líder do Partido Nacional Escocês John Swinney e o líder do Partido Trabalhista Keir Starmer participam de um evento comemorativo nacional do Reino Unido para marcar as comemorações do 80º aniversário do Dia D. — Foto: Dylan Martinez / POOL / AFP 11 de 25
Rei Charles, ao lado da rainha Camilla, da Grã-Bretanha, reage ao participar de um evento comemorativo nacional do Reino Unido para marcar as comemorações do 80º aniversário do Dia D — Foto: Dylan Martinez / POOL / AFP 12 de 25
Os convidados assistem a uma banda tocar durante o evento comemorativo nacional do Reino Unido para marcar as comemorações do 80º aniversário do Dia D. Na tela, escrito em inglês, a frase "nós nunca nos rendemos". — Foto: Kin Cheung / POOL / AFP 13 de 25
A equipe de vôo acrobático de elite da Força Aérea Francesa "Patrouille de France" (topo), seguida pela equipe acrobática da Força Aérea Real Britânica (RAF), os "Red Arrows" realizam um sobrevoo acima durante a cerimônia comemorativa internacional na Praia de Omaha marcando o 80º aniversário dos desembarques aliados do "Dia D" da Segunda Guerra Mundial na Normandia — Foto: Ludovic MARIN / AFP 14 de 25
Cruzes brancas que compõem algumas das 9.388 sepulturas no Cemitério Americano de Colleville-sur-Mer - Cemitério e memorial da Segunda Guerra Mundial em Normandia, França, que homenageia as tropas americanas que morreram na Europa durante a Segunda Guerra Mundial. — Foto: MIGUEL MEDINA / AFP 15 de 25
Paraquedistas vestem réplicas de trajes de paraquedistas da Segunda Guerra Mundial, estes que verificam seus equipamentos antes de saltar de uma aeronave Lockheed C-130 Hercules fretada e navegada pela tripulação dos EUA, no aeroporto de Cherbourg, antes das comemorações do "Dia D" marcando o 80º aniversário do Dia D. — Foto: LOIC VENANCE / AFP 16 de 25
As tropas do Comando da Marinha Real Britânica desfilam em Bayeux, em 4 de junho de 2024, antes das comemorações do "Dia D" que marcam o 80º aniversário do desembarque dos Aliados na Segunda Guerra Mundial na Normandia — Foto: LOIC VENANCE / AFP 17 de 25
Veteranos do Reino Unido posam durante uma viagem à França na balsa Brittany Ferries, perto de Porthmouth, sul da Inglaterra, em 4 de junho de 2024, como parte das comemorações do "Dia D". — Foto: Lou BENOIST/AFP 18 de 25
Veteranos britânicos se preparam para lançar uma homenagem floral ao mar do convés de uma balsa durante uma cerimônia na costa em Ouistreham, norte da França, em 4 de junho de 2024, como parte das comemorações do "Dia D" — Foto: Lou Benoist / AFP 19 de 25
Os veteranos do Reino Unido, Stan Ford, Jim Grant (no centro), Alec Penstone e autoridades posam com a Tocha de Comemoração da organização Graves de guerra da Commonwealth na estação Brittany Ferries, em Ouistreham, noroeste da França, em 4 de junho de 2024 — Foto: Lou Benoist / AFP 20 de 25
O ex-oficial da Marinha Real britânica e veterano do Dia D, contra-almirante John Roberts, olha um álbum de fotos contendo fotos de seu serviço durante a Segunda Guerra Mundial, na sala de sua casa em Whitstable, Kent — Foto: Daniel LEAL / AFP 21 de 25
O ex-oficial da Marinha Real britânica e veterano do Dia D, contra-almirante John Roberts, olha um álbum de fotos contendo fotos de seu serviço durante a Segunda Guerra Mundial, na sala de sua casa em Whitstable, Kent — Foto: Daniel LEAL / AFP 22 de 25
Medalhas do ex-oficial da Marinha Real britânica e veterano do Dia D, contra-almirante John Roberts. — Foto: Daniel LEAL/AFP 23 de 25
Veteranos do Dia D posam para uma fotografia na sala de mapas em Southwick House, o centro nevrálgico das operações do Dia D há 80 anos, durante uma reunião de veteranos da Segunda Guerra Mundial perto de Portsmouth, em 3 de junho de 2024. — Foto: Adrian DENNIS / AFP 24 de 25
Bill Becker, de 98 anos, artilheiro da torre esférica durante a 2ª Guerra Mundial e parte de um contingente de veteranos que viajam para a França para as comemorações do Dia D. — Foto: Philip Cheung/The New York Times 25 de 25
Pessoas na costa desfrutam de fogos de artifício lançados na Praia da Espada, como parte do 80º aniversário do Dia D em Luc-sur-Mer, Normandia, noroeste da França — Foto: Lou Benoist / AFP
O dia 6 de junho de 2024 marca o 80º aniversário da "Operação Overlord", desembarque do Dia D dos Aliados nas praias da Normandia, uma das principais operações militares que levaram ao fim da Segunda Guerra Mundial.
O pronunciamento desta sexta-feira não foi uma exceção. Com um forte apelo patriótico e uma série de referências à capacidade americana e à democracia americana, Biden pareceu endereçar mensagens de otimismo e confiança aos seus cidadãos e possíveis eleitores em novembro.
— Quando falamos sobre democracia, democracia americana, muitas vezes falamos sobre os ideais de vida, liberdade, busca pela felicidade. Não falamos sobre o quão difícil é — disse Biden. — A democracia americana exige a coisa mais difícil: acreditar que fazemos parte de algo maior do que nós mesmos.
Em solo francês, o presidente encerrou seu discurso com a frase "Deus abençoe a América", um bordão tradicional com que os líderes americanos terminam seus pronunciamentos para o público de seu país (Com Bloomberg e AFP).