Líder da extrema direita confirma acordo com conservadores na França antes de eleições legislativas

Apesar de anunciado pelo comando do Reagrupamento Nacional e de Os Republicanos, políticos mais graduados apontam ressalvas à aliança

Por O Globo e agências internacionais — Paris


Líder do Reagrupamento Nacional, Jordan Bardella, em entrevista coletiva Alain JOCARD / AFP

O líder do Reagrupamento Nacional (RN), principal sigla de extrema direita na França, Jordan Bardella, confirmou um acordo com os conservadores do partido Os Republicanos para as eleições legislativas convocadas pelo presidente Emmanuel Macron para o fim de junho, após a derrota do governo na votação para o Parlamento Europeu. No domingo, o RN recebeu 31% dos votos, um resultado que levou Macron a dissolver a Assembleia Nacional, mas o anúncio desta terça-feira não foi exatamente uma unanimidade entre os envolvidos.

— Estou satisfeito que Eric Ciotti [presidente de Os Republicanos] tenha respondido favoravelmente a este apelo e confirmado que haverá, portanto, um acordo nestas eleições legislativas entre o Reagrupamento Nacional, que presido e lidero, e os Republicanos — disse Bardella nesta terça-feira, em entrevista à emissora France 2, apontando que “dezenas” de parlamentares conservadores que disputarão a reeleição defendem a iniciativa.

Horas antes, Ciotti tinha chocado seu partido ao propor a aliança com o RN, uma sigla que, apesar das tentativas de amenizar a imagem ligada a políticas extremistas, ainda suscita críticas na chamada “direita tradicional”. Aparentemente alheio às reações negativas, o líder de Os Republicanos afirmou à imprensa que sua sigla e o RN têm uma visão conjunta dos “valores de direita”, que permitiria ao setor “manter deputados” no Legislativo. Juntos, os dois partidos têm 150 deputados na Assembleia Nacional, e as pesquisas preliminares, associadas aos resultados de domingo, apontam para uma vitória contundente desse campo do espectro político no dia 30 de junho.

— Precisamos de uma aliança com o Reagrupamento Nacional, [mas] sem deixarmos de ser nós mesmos — disse Ciotti à emissora TF1.

Ao contrário do Reagrupamento Nacional, que nasceu do discurso antissistema e que passou boa parte de sua trajetória distante dos centros de discussão do poder, Os Republicanos tem uma trajetória próxima ao Palácio do Eliseu. Com raízes fincadas na centro-direita, a sigla surgiu da hoje extinta União por um Movimento Popular, do ex-presidente Jacques Chirac (1995-2007), e também levou à Presidência Nicolas Sarkozy, posteriormente condenado por financiamento ilegal de campanha.

O passado institucional do partido talvez explique algumas das reações raivosas de alguns de seus membros ao serem comunicados sobre o acordo. Ex-ministro dos governos de Chirac e Sarkozy, o hoje governador de Altos da França, Xavier Bertrand, pediu que Ciotti seja expulso do partido.

— É uma traição. Uma colaboração com a extrema direita. Ele nos traiu em troca de um posto de ministro — disse Bertrand à TF1.

Para o ex-ministro, todos os candidatos à Assembleia Nacional que aceitem ser apoiados pelo RN também devem ser excluídos do partido e substituídos por outros nomes imediatamente.

Lideranças do Reagrupamento Nacional comemoram a vitória nas eleições para o Parlamento Europeu — Foto: Nathan Laine/Bloomberg

Bertrand não foi uma voz isolada. Gérard Larcher, presidente do Senado, e Olivier Marleix, líder da sigla na Assembleia, também defenderam a saída de Ciotti, apontando que não é possível “engolir” um acordo com o RN.

— [Ciotti] mentiu para nós — afirmou à AFP o líder do partido no Senado, Bruno Retailleau. — Isso é deslealdade. É uma falha em ser honesto.

Ciotti disse que não pretende renunciar, e que seu mandato depende dos demais membros do partido. Já Bardella afirmou que o diálogo com Os Republicanos continuará “pelas próximas horas”, mas determinou três pontos prioritários nessa coalizão: o poder de compra, a segurança e a imigração.

Se o acordo entre os conservadores e o Reagrupamento Nacional parece, ao menos em tese, possível, o mesmo não se pode dizer da inclusão da outra sigla de extrema direita na coalizão. Marion Maréchal, vice-líder do Reconquista (e sobrinha de Marine Le Pen, principal nome do RN) e que expressa posições ainda mais radicais do que as do RN, chegou a propor uma aliança, algo prontamente rejeitado.

— Para construir uma aliança e uma maioria, é preciso confiança. No entanto, acredito que as posições de Eric Zemmour [presidente do Reconquista] ao longo da campanha europeia, com os ataques ao RN e as posições por vezes muito excessivas, nos fizeram crer que não há condições para um acordo — disse Bardella à France 2, sem descartar alianças com outras siglas de direita e extrema direita na França .

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