'Ninguém tem ideia' do número de reféns ainda vivos em Gaza, diz oficial do Hamas

Osama Hamdan disse que última proposta, elaborada por Israel e divulgada pelo presidente americano, Joe Biden, no mês passado, 'não atendeu às demandas do grupo'

Por O Globo e agências internacionais — Cidade de Gaza


Porta-voz do Hamas, Osama Hamdan afirmou não ter ideia do número de reféns ainda vivos após ofensiva do grupo terrorista no ano passado AFP

O destino dos 120 reféns restantes na Faixa de Gaza, central para determinar o acordo de cessar-fogo no enclave, é incerto. É o que afirmou à CNN Osama Hamdan, alto funcionário do grupo terrorista Hamas, ao anunciar que “ninguém tem ideia” de quantos dos sequestrados estão vivos. Ainda assim, segundo ele, qualquer proposta de acordo para libertá-los deve incluir garantias do fim permanente das ofensivas e a retirada completa das forças de Israel de Gaza.

Hamdan, que faz parte da ala política do grupo e participa das negociações sobre o assunto, disse que a última proposta, elaborada por autoridades israelenses e divulgada no mês passado pelo presidente americano, Joe Biden, “não atendeu às demandas do grupo” para o fim da guerra. Ele afirmou que o Hamas precisava de “uma posição clara de Israel para aceitar o cessar-fogo”, e que demanda que “os palestinos determinem seu próprio futuro”, incluindo a reconstrução do território.

— Estamos prontos para falar sobre um acordo justo sobre a troca de prisioneiros — complementou ele à CNN.

A proposta de cessar-fogo apoiada pelos Estados Unidos – e aprovada pelo Conselho de Segurança da ONU nesta segunda-feira – estabelece uma abordagem em fases. Na primeira delas haveria um cessar-fogo de seis semanas. Alguns dos reféns seriam trocados por prisioneiros palestinos, e o Exército de Israel se retiraria das áreas povoadas no enclave. Já a segunda etapa, que prevê o fim permanente da guerra e a retirada total das tropas israelenses da Faixa de Gaza, só seria implementada após novas negociações entre os dois lados do conflito.

As negociações sobre o acordo apoiado por Washington foram intensificadas nos últimos dias, mas estagnaram nesta quarta, quando o Hamas apresentou sua resposta ao documento. No mesmo dia, o secretário de Estado americano, Antony Blinken, afirmou que o grupo submeteu “numerosas mudanças” à proposta, incluindo algumas que vão “além das posições que [o Hamas] havia assumido anteriormente”. Sem dar mais detalhes, Blinken disse em entrevista coletiva que algumas dessas reivindicações são viáveis, mas outras não.

— A barganha tem que parar — disse Blinken à rede americana NBC nesta quinta-feira, instando Yahya Sinwar, o líder do Hamas em Gaza, a acabar com a guerra. — Ele está relativamente seguro no subsolo, mas as pessoas que ele alega representar estão sofrendo todos os dias.

Crianças em Gaza

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As consequências e impactos dos ataques aéreos israelenses nas crianças palestinas

Hamdan, contudo, disse à CNN que a duração do cessar-fogo era uma questão-chave para o Hamas, que está preocupado de que Israel não tenha intenção de cumprir a segunda fase do acordo. Ele pontuou que, após as seis semanas sem confrontos, o Exército israelense deseja “voltar a lutar” – algo que o grupo terrorista tenta impedir. Hamdan disse acreditar que os EUA precisam convencer Israel a aceitar o cessar-fogo permanente como parte do acordo. A reivindicação também foi feita em março, quando outro alto funcionário do grupo culpou Tel Aviv por “frustrar” os esforços de negociação ao se recusar a encerrar a ofensiva.

— O Hamas está procurando as maiores garantias em troca da libertação [dos reféns], porque quando os libertar, não terá mais como pressionar Israel — disse ao El País Mabel González Bustelo, especialista em mediação internacional e resolução de conflitos do Instituto de Estudos sobre Conflitos e Ação Humanitária (Iceah). — As negociações de cessar-fogo são muito difíceis, quase tanto quanto as do final de uma guerra.

Israel ainda não se comprometeu publicamente com o acordo, e no início deste mês o primeiro-ministro israelense, Benjamin Neatanyahu, afirmou que não aceitará nenhuma proposta para recuperar os reféns se isso envolver um cessar-fogo definitivo em Gaza. Ainda assim, a Casa Branca tem enfatizado repetidamente que a proposta aprovada pela ONU faz parte de um plano israelense. Blinken disse à NBC que o premier “reconfirmou” que Israel apoiava a proposta e estava “pronto para dizer sim”. O americano culpou o Hamas pela paralisação das negociações.

— O Hamas tem que demonstrar que também quer que isso termine. Se o fizer, podemos acabar com isso. Se não, significa que quer que a guerra continue — disse Blinken.

Sofrimento com a guerra

De acordo com a CNN, Hamdan desviou das perguntas sobre o papel do Hamas no sofrimento dos palestinos em Gaza e chamou os ataques terroristas de 7 de outubro – estopim para o início da guerra atual no enclave – de uma “reação contra a ocupação”. A operação, que deixou cerca de 1,2 mil mortos em Israel, sendo a maioria civis, e 250 reféns, teve um impacto devastador em Gaza. Segundo autoridades de saúde do território palestino, mais de 37 mil pessoas foram mortas, a maioria mulheres e crianças, desde o início da represália israelense.

— O responsável por isso é a ocupação [israelense]. Se você resistir à ocupação, eles vão te matar. Se você não resistir, eles também vão te matar e te deportar do seu país. Então, o que devemos fazer, apenas esperar? — disse Hamdan, sugerindo que as mortes de milhares de palestinos eram “sacrifícios necessários”.

Israel acusou repetidamente o Hamas de usar civis em Gaza como escudos humanos, e no início desta semana, o Wall Street Journal publicou o que seriam mensagens vazadas de Sinwar para outros líderes do grupo terrorista. Nelas, o líder teria expressado a determinação de continuar lutando independentemente dos custos humanos. À CNN, contudo, Hamdan disse que as mensagens eram falsas. Sem fornecer provas, ele afirmou que elas foram criadas “por alguém que não é palestino” para provocar a população do enclave contra o líder.

Exército de Israel resgata 4 reféns com vida em Gaza

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As Forças Armadas de Israel anunciaram, neste sábado, o resgate de quatro reféns capturados pelo Hamas

Resgate de reféns

Quando perguntado sobre abusos mental e físico contra vítimas sequestradas, Hamdan culpou Israel, afirmando que os reféns "estavam melhor que antes", citando fotos que mostram antes e depois de oito meses em cativeiro.

— Acredito que se eles têm problemas mentais, isso se deve ao que Israel tem feito em Gaza. Porque [ninguém pode] suportar o que Israel está fazendo, bombardeando todos os dias, matando civis, matando mulheres e crianças […] eles viram isso [com] seus próprios olhos — afirmou Hamdan.

O último resgate de reféns ocorreu no sábado passado, após uma "complexa operação" na cidade de Nuseirat, na região central da Faixa de Gaza. Almog Meir Jan, de 21 anos; Noa Argamani, de 26; Andrey Kozlov, de 27; e Shlomi Ziv, de 41, que foram sequestrados no dia 7 de outubro durante o festival de música eletrônica Nova, foram encontrados com vida e estão "em boas condições médicas", de acordo com fontes militares.

Um policial israelense morreu durante o resgate, enquanto o gabinete de imprensa do Hamas afirma que, no mesmo local onde foi realizada a operação, 210 pessoas foram mortas e mais de 400 ficaram feridas.

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