'Perseguiremos Israel': Funeral de líder do Hamas morto no Irã é marcado por pedidos de vingança

Caixões de Ismail Haniyeh e de segurança mortos em ataque aéreo foram cobertos com bandeiras da Palestina e carregados em um evento público em Teerã

Por O Globo, com agências internacionais — Teerã


Funeral de líder do Hamas AFP

O funeral do chefe do gabinete político do Hamas, Ismail Haniyeh, reuniu milhares de pessoas nas ruas de Teerã nesta quinta-feira, em meio a clamores de líderes palestinos e iranianos para uma retaliação a Israel, apontado pelos dois aliados como responsável pelo ataque aéreo que matou a autoridade. Israel não se pronunciou sobre o caso, sem confirmar ou negar envolvimento com a morte do líder do grupo terrorista.

O Irã decretou três dias de luto oficial pela morte de Haniyeh, oferecendo uma cerimônia pública e com participação ativa dos líderes espirituais e políticos do regime. O ato fúnebre começou na Universidade de Teerã, onde simpatizantes carregavam fotos do chefe político do Hamas e bandeiras da Palestina.

Funeral na TV iraniana exibe caixões de Haniyeh e de seu segurança cobertos com bandeira palestina

O líder supremo do Irã, aiatolá Ali Khamenei, que acusou Israel pelo ataque véspera e classificou como um "dever" do Irã buscar "vingança" pelo ataque dentro do país, presidiu o ato religioso no campus da universidade. Imagens da TV iraniana mostram os caixões de Haniyeh e de seu guarda-costas, também morto no ataque, envolvidos com bandeiras da Palestina e carregados por um caminhão, acompanhado por uma multidão.

A procissão fúnebre percorreu um trajeto de 5 km, entre a universidade e a Praça Azadi (Praça Liberdade, em português). De acordo com as informações oficiais, o corpo de Haniyeh será transportado para o Catar, e será sepultado em Doha, onde vivia com a família no exílio.

Autoridades iranianas e ligadas ao Hamas discursaram durante o funeral. O recém-empossado presidente do país, Masoud Pezeshkian, prometeu vingança pela morte de Haniyeh — cuja visita ao Irã tinha em vista a participação da cerimônia de posse.

— Ontem, levantei sua mão vitoriosa, e hoje, tenho que enterrá-lo em meus ombros. O vínculo entre as duas nações orgulhosas do Irã e da Palestina será mais forte do que antes — declarou Pezeshkian.

Ismail Haniyeh, fotografado na cerimônia de posse do novo presidente do Irã — Foto: AFP

Logo na abertura da cerimônia, o presidente do parlamento iraniano, Mohammad Bagher Ghalibaf, também enalteceu a figura de Haniyeh — acusado por Israel de ser um dos idealizadores do ataque de 7 de outubro e de envolvimento com outras atividades terroristas — e prometeu resposta.

— O mártir Ismail Haniyeh era a voz do povo palestino em todo o mundo. Ele não era apenas um líder. Ele era o homem sábio — disse Ghalibaf. — Nossa resposta estará lá. Na hora certa e no lugar certo. É difícil para nós ter nosso convidado sendo alvo e assassinado em nosso solo.

Ao mesmo tempo em que representou um baque importante para as operações do Hamas — mas não decisivo, segundo especialistas —, a morte de Haniyeh aumentou os temores de uma regionalização do conflito, uma vez que a violação da soberania iraniana para execução do ataque gerou também um constrangimento para Teerã, que tenta explicar a falha de segurança em um momento em que recebia representantes estrangeiros, incluindo o vice-presidente do Brasil, Geraldo Alckmin.

Geraldo Alckmin aparece perto de líder do Hamas horas antes de Ismail Haniyeh ser morto

O ministro das Relações Exteriores do Hamas, Khalil al-Hayya, um dos cotados para substituir Haniyeh, afirmou durante a cerimônia que "o slogan" Haniyeh, que pregava o não reconhecimento de Israel como Estado soberano, permaneceria vivo após a sua morte.

— Perseguiremos Israel até arrancá-lo da terra da Palestina — afirmou al-Hayya.

Outras autoridades iranianas e do grupo palestino estiveram presentes no funeral, como o comandante da Guarda Revolucionária do Irã, general Hosein Salami. A cada discurso, a multidão reagia, incluindo com gritos de "Morte a Israel, morte à América!".

Funeral do líder do Hamas — Foto: AFP

A comunidade internacional pediu calma e a continuidade dos esforços para alcançar um cessar-fogo em Gaza. O secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, alertou que os ataques em Teerã e Beirute — onde um líder do Hezbollah foi morto um dia antes do ataque em Teerã — representam uma "escalada perigosa em um momento no qual todos os esforços deveriam levar a um cessar-fogo em Gaza".

O chefe da diplomacia dos Estados Unidos, Antony Blinken, pediu nesta quinta-feira a "todas as partes" no Oriente Médio que "dialoguem" e "cessem qualquer ação que contribua para uma escalada".

No terreno, por outro lado, a preparação para uma resposta bélica parece estar em fase de preparação. A agência Reuters noticiou que altos funcionários iranianos devem se reunir com aliados no Líbano, Iraque e Iêmen ainda hoje para analisar possíveis respostas ao assassinato de Haniyeh.

Veja fotos: área da rave atacada pelo Hamas em 7 de outubro vira memorial

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Em paralelo, à rede catari al-Jazeera informou que o ministro das Relações Exteriores em exercício do Irã, Ali Bagheri Kani, enviou cartas ao secretário-geral da ONU, ao chefe do Conselho de Segurança da ONU e ao secretário da Organização de Cooperação Islâmica para expressar condenação pelo assassinato Haniyeh, indicando que tomaria "as medidas necessárias".

"[O Irã está] determinado a tomar todas as medidas necessárias para defender sua segurança nacional e soberania contra quaisquer transgressões (...). "Este ato de terror é apenas mais uma manifestação do padrão de décadas de terrorismo e sabotagem de Israel visando palestinos e outros apoiadores e simpatizantes da causa palestina em toda a região e além", diz um trecho citado pela rede de TV.

Mediação questionada

As mortes no Irã e no Líbano agravam as tensões regionais devido à guerra em Gaza, que intensificou as hostilidades entre Israel e grupos armados alinhados com o Irã na Síria, Líbano, Iraque e Iêmen. Também colocam em risco as negociações indiretas para uma trégua e a libertação de reféns entre o Hamas e Israel, com a mediação do Catar, Egito e Estados Unidos.

O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, prometeu destruir o grupo em represália pelo ataque de 7 de outubro, que iniciou a guerra em Gaza. O ataque matou 1.197 pessoas, a maioria civis, segundo um balanço da AFP baseado em dados oficiais divulgados pelas autoridades de Israel. Os combatentes islamistas também sequestraram 251 pessoas. Segundo o Exército israelense, 111 permanecem em cativeiro em Gaza, mas 39 teriam sido mortas.

A campanha militar israelense em Gaza matou ao menos 39.480 pessoas, segundo o Ministério da Saúde do território governado pelo Hamas. Meses de negociações permitiram apenas uma breve trégua de uma semana em novembro. Após a morte de Haniyeh, o Qatar, crucial na mediação, questionou o futuro das conversações.

"Como a mediação pode ter sucesso quando uma parte assassina o negociador da outra parte?", questionou na rede social X o primeiro-ministro do Catar, Mohammed bin Abdelrahman al-Thani. (Com AFP e NYT)

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